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25 BE JULHO DE 1986

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Na vigência da Constituição, a entrada em vigor da Lei n.° 77/77 reacende o problema da compatibilidade constitucional, fundamentalmente centrado no alcance a dar ao princípio da irreversibilidade das nacionalizações, princípio que, no entanto, a Comissão Constitucional não julgou ter sido ofendido.

14 — Sem querer discutir a fundo esta problemática, porque não precisamos disso, recordaremos as razões que fundamentaram o parecer da Comissão Constitucional: total falta de referência a nacionalizações no título da Constituição sobre Reforma Agrária e separação clara entre a alínea g) do artigo 81.° —que prevê a eliminação de monopólios privados através de nacionalizações— e a alínea h) do mesmo artigo, que fala em «realizar a Reforma Agrária».

Por outro lado, atendendo ao carácter preceptivo do artigo 83.° da Constituição, e admitindo sem conceder a «nacionalização» dos prédios rústicos, a Comissão Constitucional apelou à natureza pluralista do «socialismo» acolhido na Constituição, a qual reconhece a propriedade e a iniciativa privadas (artigos 62.° e 85.°), concluindo que «só se se visasse uma colecti-vização total da agricultura seria lógica a irreversibilidade de qualquer nacionalização de fundos».

Acrescenta a irrazoabilidade da recepção material pelo artigo 83.° de certos actos administrativos (os que expropriam prédios em obediência ao Decreto-Lei n.° 406-A/75) e a violação do princípio da igualdade que resultaria das nacionalizações posteriores a 25 de Abril de 1976 e decorrentes do acto expropriativo no âmbito do já referido Decreto-Lei n.° 406-A/75.

Finaliza com um argumento retirado da distinção que deve fazer-se entre a nacionalização e direito de reserva:

Ao cabo e ao resto, a correlação entre expropriação e reserva pode bem ser (ou deve mesmo entender-se) variável. A expropriação e a consequente nacionalização em causa são, certamente, a expropriação e a nacionalização concretas que se tenham verificado. Mas a reserva, fundada no princípio concorrencial da propriedade privada da terra, essa terá uma extensão que será função dos «limites máximos das unidades de exploração agrícola privada» a que alude o artigo 99.°, n.° 2, da Constituição. Estes limites são fixados pela Assembleia da República, que não está vinculada a manter ad aeternum os limites de pontuação do Decreto-Lei n.° 406-A/75, que não tem força de lei constitucional, repita-se (').

A distinção referida é, aliás, reforçada na declaração de voto da Prof." Doutora Magalhães Collaço:

Não pode de resto esquecer-se a independência formal e temporal das duas operações — o acto concreto de expropriação ou a medida de nacionalização global e a posterior atribuição do direito de reserva (cf. os artigos 3.0S do Decreto-Lei n.° 406-A/75 e do Decreto-Lei n.° 407-A/75).

E acrescenta:

O carácter não definitivo da nacionalização dos solos decorrente da publicação do acto de expropriação praticado à sombra do Decreto-Lei n.° 406-A/75 ou resultante da medida genérica

0) ¡0 itálico é nosso.)

decretada no artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 407-A/75 vem, por outro lado, a ser praticamente reafirmado através de sucessivas alterações legais...

Conclui, afinal, «que o artigo 83.° da Constituição, ao declarar irreversíveis as nacionalizações operadas a partir de 25 de Abril de 1974, não pode ter pretendido abarcar no seu âmbito as nacionalizações dos solos, resultantes da aplicação dos Decretos-Leis n.os 406-A/75 e 407-A/75» (')•

Utilizando argumentos idênticos aos usados na Comissão Constitucional, a Procuradoria-Geral da República já se pronunciou a favor da reversão dos prédios rústicos expropriados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 406-A/75 e pertença das pessoas colectivas referidas no n.° 3 do artigo 23.° da Lei n.° 77/77, que passaram a ser encaradas como titulares do direito de propriedade sobre prédios rústicos inexpropriáveis, isto é, não nacionalizáveis (2), e, portanto, sobre sobre a inadmissibilidade de apelo para este efeito ou, neste contexto, ao princípio da irreversibilidade das nacionalizações.

15 — Em conclusão, poderemos dizer que a interpretação conjugada dos artigos 67.° e 31.°, n.° 1, da Lei n.° 77/77, que defendemos, podendo implicar a reversão de partes significativas de prédios nacionalizados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 407-A/75 — reversão que, aliás, também se opera com a aplicação dos artigos 23.°, 65.° e 67.° da Lei n.° 77/77, entre outros, aplicação que ninguém contesta —, não pode considerar-se inconstitucional, à luz do princípio da irreversibilidade das nacionalizações.

16 — Todos os elementos de interpretação, formais e substanciais, apontam assim — inequivocamente — no sentido de um entendimento contrário ao preconizado pela Procuradoria-Geral da República, entendimento que, já se viu, não deve considerar-se inconstitucional, tendo em conta o princípio da irreversibilidade das nacionalizações.

17 — Do que antecede resultam, em nossa opinião, as conclusões seguintes:

a) O artigo 67.° da Lei n.° 77/77, de 29 de Setembro, estendeu o disposto nesta lei sobre o direito de reserva aos prédios nacionalizados no âmbito do Decreto-Lei n.° 407-A/75, de 30 de Julho;

b) Os elementos literal e sistemático de interpretação vão no sentido de aplicar ao direito de reserva, resultante da nacionalização de prédios rústicos, e por força do artigo 67.° da Lei n.° 77/77, o cadastro vigente à data da publicação desta lei, conforme dispõe o n.° 1 do artigo 31.° da mesma Lei n.° 77/77;

c) A linha evolutiva dos regimes jurídicos do direito de reserva nos prédios nacionalizados, em virude do Decreto-Lei n.° 407-A/75, e do direito de reserva nos prédios expropriados, em virtude do Decreto-Lei n.° 406-A/75, mostra uma aproximação entre eles e um tratamento preferencial das reservas nos prédios nacionalizados em confronto com as dos prédios expropriados;

(') Pareceres da Comissão Constitucional, vol. iii, pp. 116 e 117. [O itálico é nosso.]

(J) BMJ, parecer n.° 111/80, p. 100.