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II SÉRIE — NÚMERO 95

Assim, recordem-se as palavras de Vital Moreira interpelando José Luís Nunes:

Disse que as reservas aumentam para 70 000 pontos e que há apenas uma alteração de 20%. Mas como pode dizer isso se estes novos pontos ninguém sabe o que são? Se a única coisa que se sabe é que podem ser 2, 3, 4 ou 5 dos pontos actuais e que, portanto, podem ser não 20%, mas 40%, 50% ou 100% ou mesmo 200% dos actuais?

E, mais adiante:

É um alargamento que, tendo em conta o facto de as benfeitorias deixarem de ser contadas para a pontuação e tendo em conta o facto de os critérios de cálculo da pontuação serem revistos, pode alargar-se em termos de duplicar, triplicar ou quadruplicar as áreas de reserva (').

Conclui-se, pois, que a alteração contida no n.° 1 do actual artigo 31.° da Lei n.° 77/77 foi debatida e reflectida, sem que em momento algum da discussão fosse abordada a questão da diferente contagem de pontos, consoante se estivesse perante reservas de regadio (ao abrigo do Decreto-Lei n.° 407-A/75) ou reservas de sequeiro (ao abrigo do Decreto-Lei n.° 406-A/75).

Dir-se-á mesmo que, se fosse intenção da Assembleia da República manter para as reservas de regadio o cadastro actualizado pelas comissões de gestão transitória — como pretende a Procuradoria-Geral da República na sua interpretação restritiva do artigo 67.° da Lei n.° 77/77 —, não se compreenderia que ao longo dos inúmeros debates ninguém tivesse expressado a ideia de que era possível quantificar aquele número de pontos previsto na lei em relação às reservas de regadio, porque relativamente a estas os valores não seriam alterados — valores constantes do cadastro actualizado pelas comissões de gestão transitória. Pelo contrário. A Assembleia da República fala sempre em «pontos novos» e não parece legítimo concluir que as reservas em zonas de regadio estiveram sempre ausentes destes debates, como será necessário concluir se se optar pela interpretação do artigo 67.° da Lei n.° 77/77 proposta pela Procuradoria-Geral da República.

Acresce que se poderá mesmo dizer, em contrário do que a Procuradoria-Geral da República defende, que toda a argumentação desenvolvida na Assembleia da República a propósito destes «pontos novos» só adquire verdadeiro relevo e importância se se referir às reservas de regadio, pois ai, sim, é possível a duplicação, triplicação ou quadruplicação das áreas de reserva se se aplicarem às referidas reservas os valores constantes do cadastro vigente à data da publicação da Lei n.° 77/77. Relativamente às reservas em zona de sequeiro (reservas no âmbito dos terrenos expropriados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 406-A/75), como a própria Procuradoria-Geral da República nota no seu parecer, «um cadastro antigo seria praticamente irrelevante

(') Cf. Diário da Assembleia da República, de 18 de Julho de 1977, p. 1626 (sublinhado nosso]. V. também a intervenção do deputado Lucas Pires, publicada no mesmo Diário, em 21 de Julho do mesmo ano, a p. 4707:

l...] eu queria perguntar-lhe qual é o critério que está subjacente à definição destes 70 000 pontos, porque é evidente que 70 000 pontos não é critério que se pressupõe — eu chamar-lhe-ia mesmo critério nenhum, é apenas um palpite.

para efeitos de pontuação»; daí que a alteração contida no n.° 1 do artigo 31.° da Lei n.° 77/77 não seja para eles muito significativa.

7.10 — Conclui-se, assim, que as intervenções parlamentares, os trabalhos preparatórios e os antecedentes legais da Lei n.° 77/77 vão no sentido de reforçar o elemento literal e o elemento sistemático da interpretação, atrás focados: o artigo 31.°, n.° 1, da Lei n.° 77/77 deve aplicar-se, por força do artigo 67.° da mesma lei, às reservas em zonas de regadio (Decreto-Lei n.° 407-A/75).

Mas não podemos ficar por aqui. E, sem desprezar os elementos de interpretação até agora analisados, temos de descer mais fundo e procurar desvendar o espírito da lei, a sua razão de ser, a vontade do legislador. A isso vamos nos números seguintes.

8 — Não é segredo para ninguém que a lei da Reforma Agrária — também conhecida por lei Barreto — teve uma forte intenção política: enquadrar juridicamente uma reforma agrária democrática e substituí-la à reforma agrária revolucionária de 1975, reparando os excessos mais gritantes cometidos no chamado período «gonçalvista».

Um dos meios mais importantes utilizados pelo legislador para prosseguir tal objectivo foi o alargamento e o reforço do direito de reserva a favor dos ex-proprietários, nomeadamente a passagem do limite máximo normal de cada reserva de 50 000 para 70 000 pontos, e a admissão de majorações tiveram manifestamente em vista aumentar a área das reservas, por se considerar insuficiente aquela que fora estabelecida em 1975.

Sendo assim, não pode ter-se por contrária ao espírito da Lei n.° 77/77, ou à intenção do legislador, uma interpretação literal que considere aplicável aos prédios nacionalizados o sistema de pontuação das reservas fixado no artigo 31.° da mesma lei. Porque este sistema, quando aplicado à delimitação das reservas de regadio nos prédios nacionalizados dos perímetros de rega, pode eventualmente acarretar como cosnequência um certo aumento da área atribuída ou a atribuir para reserva — e facultar o aumento da área das reservas foi uma das principais orientações de base da Lei n.° 77/77.

Pelo contrário, pretender fazer uma interpretação restritiva do artigo 67.°, de modo a excluir dele a remissão para o artigo 31.°, é optar por um entendimento que vai ao arrepio dos objectivos perfilhados pelo legislador em 1977 — ou seja, é excluir uma possibilidade de aumento da área das reservas, com base na interpretação de uma lei que confessadamente visou, além do mais, aumentar a área das reservas!

Temos consciência de que a argumentação que vimos desenvolvendo neste número não é, por si só, decisiva. Mas afigura-se-nos bem mais natural e bem mais lógico que o legislador tenha querido aplicar à delimitação das reservas em prédios nacionalizados o sistema de pontuação de reservas por ele próprio estabelecido do que o sistema concebido em 1975 pelo legislador revolucionário.

Até porque o sistema das comissões de gestão transitória não foi um sistema normal: baseou-se na criação de serviços paralelos, invadiu as atribuições do Instituto Geográfico e Cadastral e actuou, na prática, de uma forma atrabiliária. Ignorar esse sistema e a sua obra, voltando a assentar a determinação do rendimento fundiário das reservas no cadastro oficial, ela-

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