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24 DE MARÇO DE 1988

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No texto do Acordo referem-se objectivos de médio prazo, «nomeadamente os que envolvem a obtenção de um nível de vida mais elevado, com o consequente reforço das formas de solidariedade social» e a «melhoria da distribuição de rendimentos».

Tais objectivos pressupõem e envolvem uma «melhoria efectiva das condições de vida dos Portugueses» e impõem «uma promoção sustentada dos níveis dos rendimentos mínimos».

Neste enquadramento preconiza-se um crescimento dos rendimentos salariais tendo por base a inflação esperada, os ganhos esperados de produtividade e a competitividade das empresas.

Explicita-se, ainda, que «o comportamento da produtividade difere a nível de sectores ou de empresas», donde, «conforme o âmbito das negociações salariais, tal implicará também diferentes comportamentos salariais».

E que faz o Governo com este Acordo?

1 — Em troca da moderação salarial, resultante da recomendação acordada em 1987, a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho é agravada: com efeito, os escalões do imposto profissional são actualizados apenas no valor do referencial da inflação esperada adoptado (6,0%) e, mais grave ainda, os escalões do imposto complementar (que, como se sabe, incide sobre os rendimentos auferidos no ano anterior) não são pura e simplesmente actualizados, quando se sabe que, em 1987, o nível médio de acréscimos salariais foi de cerca de 12,0%. Por outro lado, são eliminadas ou reduzidas isenções até aqui existentes. Trata-se assim da subversão das próprias recomendações por si assinadas, tirando-se por via fiscal o que se havia conseguido em sede de concertação social.

2 — A recomendação acordada no CPCS assenta em referenciais para a inflação e para a produtividade cuja fiabilidade e conhecimento mútuo pelas partes na negociação colectiva são imprescindíveis à transparência dos correspondentes processos e à garantia de boa fé na sua execução.

O Governo, aceitando, tarde e a más horas, pôr em execução a nova matriz de cálculo da inflação (novo índice de preços no consumidor, com base em 1987), escondeu de todos os interessados os resultados do seu cálculo retrospectivo, com base na nova matriz, ao mesmo tempo que impediu a divulgação futura do índice anterior a Janeiro de 1988.

Com este procedimento, contrário à tradição anterior (v. o que se passou em 1980 com o índice de base em 1976), o Governo escamoteia dos parceiros sociais a verdadeira evolução da inflação, porque comparar directamente o índice publicado em Dezembro de 1987 com o de Janeiro de 1988 é «misturar alhos com bugalhos». Com efeito, trata-se de índices distintos, com ponderadores diferentes para as várias classes, sendo também o número destas diferente num e noutro índice.

3 — Mais escandaloso tem sido o comportamento do Governo acerca da produtividade esperada para as empresas dependentes da tutela estatal.

Aí, o pudor foi completamente posto de parte, com a substituição de previsões da produtividade por «tectos salariais clandestinos», destinados a controlar unilateralmente o nível dos salários nas empresas públicas.

A subalternização total dos gestores públicos, a quem é retirada toda a autonomia de gestão no domínio da fixação de salários, é hoje uma prática institucionalizada.

Sabe-se que as orientações tutelares têm sido tão estritas e limitativas que vão ao ponto de condicionar os procedimentos concretos a adoptar pelos representantes dos conselhos de gestão nas mesas de negociações.

O Governo, através da tutela e do GAFEEP estabelece não só orientações globais como condiciona os meios e os objectivos parcelares da negociação, imponto critérios de cálculo da produtividade, que têm como consequência a inutilidade da sua consideração para efeitos negociais, tal o grau de manipulação a que são sujeitos e cuja única finalidade é o controle arbitrário dos resultados da negociação.

4 — O autoritarismo negocial do Governo tem gerado já situações de extrema conflitualidade, com prejuízos notórios para o clima social no Pais. Os casos da PETROGAL, em que o Governo só recuou com o acto de gestão, depois de os trabalhadores imporem pela greve a retoma das negociações, e da Carris, em que o mesmo Governo não hesitou em recorrer à requisição civil para impor um tecto salarial indisfarçado, são exemplos flagrantes de uma postura contrária à concertação e ao diálogo.

A relativa acalmia das negociações salariais no sector privado e os mais altos níveis de acordo aí verificados são a prova disso mesmo. As tabelas salariais com produção de efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1988 rondam a percentagem média de 9%, enquanto no sector público a mesma média não ultrapassa os 797o.

5 — Aliás, o controle governamental da negociação colectiva nas EPs tem mesmo redundado na violação dos princípios gerais do direito de negociação.

Apoiando-se no uso abusivo dos mecanismos da aprovação tutelar, o Governo conseguiu já provocar uma drástica redução dos AEs aplicados, os quais passaram de 92, em 1985, para 49, em 1987, não se vislumbrando qualquer abrandamento em tal política, como se disse, ilegal, inconstitucional e desconforme com as determinações da OIT.

Neste contexto, é imperioso notar que o Governo anterior recusou a publicação de uma resolução arbitral relativa ao AE para os TLP, mesmo sabendo-se que se tratava de uma arbitragem obrigatória, ou seja, determinada por despacho governamental, e onde teve assento um árbitro presidente nomeado pelo Governo, uma vez que não houve acordo das partes quanto à sua designação.

São, mesmo, visíveis algumas das consequências deste comportamento, designadamente um clima próprio ao aumento do arbítrio patronal e de desvalorização da negociação colectiva.

A diminuição do número de convenções colectivas de trabalho publicadas e a concomitante redução do número de trabalhadores abrangidos espelham essa realidade. Com efeito, de 636 IRCTs publicados em 1985 passou-se em 1987 para 527.

6 — O Governo tem vindo a fomentar a injustiça social como falso pretexto da livre negociação.

De facto, o Decreto-Lei n.° 519-C1/79, que regula as relações colectivas de trabalho, prevê a intervenção administrativa do Estado através da emissão de portarias de extensão e de portarias de regulamentação de trabalho.