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II SÉRIE-A — NÚMERO 23

Artigo 3.°

Entrada cm vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de três meses a contar da data da publicação.

Os Deputados do PS: Elisa Damião — Osório Gomes — António Guterres — João Rui de Almeida — José Reis — Carlos Candal — Miranda Calha — Julieta Sampaio — Helena Torres Marques — Mota Torres.

PROJECTO DE LEI N.° 362/V

GARANTE PROTECÇÃO ADEQUADA AS MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

Com inquietante frequência, os órgãos de comunicação social relatam-nos casos de violência de que são vítimas as mulheres.

E as páginas dos jornais ainda não nos comunicam todas as explosões de violência.

Porque as mulheres, colocadas numa sociedade que continua a negar-lhes o estatuto que a Constituição lhes reconhece, porque vítimas de opressão, muitas vezes continuam a calar e a suportar em silêncio o produto violento de uma sociedade que ainda não deixou de rever-se em estruturas que colocavam as mulheres num dos últimos lugares da hierarquia.

Mesmo assim, alguns números conhecidos são inquietantes. .

Em Julho de 1985, Pinto da Costa, o director do Instituto de Medicina Legal do Porto, escrevia que a maior parte das vítimas dos crimes sexuais no Norte tinha entre 10 anos e 19 anos.

Aliás, as associações de mulheres têm vindo a alertar para a gravidade da situação e para a necessidade de medidas que garantam uma protecção adequada às mulheres. E que nem a legislação penal nem a processual-penal se debruçaram suficientemente sobre a problemática da violência sobre as mulheres. Impõem-se alterações do Código Penal no âmbito dos crimes sexuais, ponderando-se devidamente a questão em sede de revisão do Código.

Por outro lado, o Código de Processo Penal desconhece que nesta matéria, dada a tendência para o silenciamento da mulher, se impõem medidas especiais que a levem a ultrapassar a barreira dos preconceitos.

Para além disto, continuam a minguar mecanismos de prevenção e apoio à mulher.

Tendo em conta esta realidade, o Grupo Parlamentar do PCP entendeu propor algumas medidas que visam responder às principais questões colocadas. Não se desconhece, no entanto, que este fenómeno negativo — o fenómeno da violência contra as mulheres — só poderá ser debelado quando houver uma mudança de mentalidades.

E não se desconhece que essa mudança só será possível quando às mulheres se ofereçam as necessárias condições para o amplo desenvolvimento das suas capacidades.

Com efeito, a violência que atinge a mulher resulta da degradação das condições de vida.

As elevadas taxas de desemprego das mulheres, o trabalho precário, a enorme carência de infra-estruturas de apoio à família, a degradação do sistema escolar, a quase completa ausência de infra-estruturas de apoio aos idosos, a degradação dos cuidados de saúde, determinam que um enorme fardo recaia sobre as mulheres.

Elas são olhadas como as que se encarregam de colmatar todas as insuficiências da vida familiar, aquelas que cuidam dos filhos, dos idosos, dos doentes, aquelas que se encarregam de todas as tarefas caseiras, que não descansam. Aquelas que, como diz Maria Velho da Costa, «calcorreiam a cidade a pé, ao vento e à chuva, porque naquele bairro os macacos são caros».

Esta é a imagem da escada de serviço. Da mulher que não acede à formação profissional, da que é despedida antes do homem. Desta imagem, da imagem de subalternização, é fácil passar-se para comportamentos violentos perante a mulher, precisamente porque é alguém a quem ainda se não reconhece, de facto, o direito à igualdade.

Violência, aliás, fomentada, veladamente, pela utilização afrontosa do corpo da mulher na publicidade.

Esta é, de facto, a situação que contende frontalmente com o que a Constituição e as leis dispõem.

Assistimos mesmo a mais ameaças aos direitos da mulher.

Com efeito, não bastará deixar inalterados ou mesmo melhorados direitos específicos constitucionalmente previstos. Importa não esquecer que retrocessos do sistema económico e político da Constituição não deixariam de afectar negativamente as mulheres portuguesas.

O presente projecto de lei institui medidas de prevenção e apoio às mulheres vítimas de violência.

Neste aspecto, o projecto de lei prevê campanhas de sensibilização da opinião pública, a edição de um guia destinado às mulheres vítimas de crimes, o apoio a centros de estudos e investigação sobre a mulher e a actividades editoriais que tenham por objectivo os direitos das mulheres.

Prevê-se a criação de casas de apoio às mulheres maltratadas. Ainda na área do apoio, prevê-se a criação do gabinete SOS para atendimento telefónico, junto da Procuradoria-Geràl da República, e de secções especiais para atendimento das mulheres.

No capítulo IH regulam-se direitos especiais das associações de mulheres que prossigam fins de defesa e protecção das mulheres vítimas de crimes. Enuncia-se ainda o sistema de adiantamento pelo Estado da indemnização, a regular em lei especial.

Por último, explicita-se uma medida de injunção a aplicar em caso de suspensão provisória do processo — o afastamento do arguido da residência, nos casos de crimes cometidos contra a mulher por pessoa que com ela coabite.

Salienta-se que esta medida tem em vista viabilizar, com o consentimento da ofendida, a solução do conflito e a possibilidade de harmonizar a vida da família.

Prevê-se ainda, nos casos em que não seja aplicada a medida de prisão preventiva, a imposição da medida de coacção de afastamento do arguido da residência.

Este é, em súmula, o conteúdo do projecto de lei, que poderá ser o ponto de partida para que a Assembleia da República se debruce sobre a problemática da violência que atinge a mulher.