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II SÉRIE-A — NÚMERO 25

A presente proposta respeita o dispositivo constitucional, interpretando-o e integrando-o de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, tal como se prevê no artigo 16.° da Constituição, sem deixar de ter em conta o sentido das alterações introduzidas no artigo 35.°, na última revisão.

O desenvolvimento fulgurante da informática descentralizada e a utilização generalizada de pequenos sistemas e de microprocessadores dotados de notável capacidade de memorização tornaram, na verdade, inadequados e inoperantes os mecanismos de controlo previstos ainda há menos de 10 anos.

Daí que se tenham adoptado no presente diploma as soluções, chamadas de 3.a geração, recomendadas pela experiência dos nossos parceiros no Concelho da Europa e na OCDE: simples comunicação à autoridade de protecção de dados de constituição de ficheiros de dados pessoais — ainda que acompanhada de toda a informação pertinente a um controlo eficaz quando em tais ficheiros se não contenham dados sensíveis, como tal previstos na presente proposta, e, verificando-se este caso, necessidade de prévia autorização, em diploma legal ou por acto da autoridade de protecção de dados, conforme se trate de ficheiros a constituir por serviços públicos ou pelo sector privado.

Do mesmo modo se consagra a mais moderna orientação no sentido de que a legislação de protecção de dados não tem aplicação aos ficheiros de dados pessoais que, pela sua própria natureza, se destinam exclusivamente a uso pessoal ou doméstico ou ao estrito desenvolvimento dos tratamentos de mera gestão corrente.

É criada a Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais, autoridade pública independente, cuja actividade se desenrola de acordo com a Constituição e as leis da Assembleia da República e que tem a atribuição genérica de controlar o processamento automático de dados pessoais em rigoroso respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituição e na presente lei.

Como seria de esperar de instrumento tão poderoso como é a informática, a sua utilização com fins criminosos tem vindo a registar escalada preocupante, particularmente nos países mais industrializados, e que necessariamente registam os índices mais elevados de recurso aos tratamentos automatizados de informação.

Tem-se por isso vindo a assistir não só ao uso ilegítimo e em proveito próprio de computadores e de redes de dados e à penetração abusiva em bases de dados de carácter altamente reservado, como, sobretudo, à utilização de processos de tratamento informático com o propósito de enriquecimento ilegítimo, próprio ou de terceiros.

No entanto, a presente proposta de lei, tendo por objecto específico a protecção de dados pessoais face à informática e, nesse sentido, acolhendo a definição consagrada na referida Convenção europeia, exclui deliberadamente do seu âmbito as referidas formas de criminalidade, que serão objecto de diploma próprio.

A isso conduz, por um lado, a necessidade de extremar rigorosamente as matérias que não devem ser confundidas e tratadas num mesmo diploma, vicio de que enfermaram as sucessivas propostas de lei até agora ensaiadas sem sucesso, por motivos conhecidos. Do que se trata aqui é de conferir eficácia prática à injunção do artigo 35.° da Constituição, relativa aos dados pessoais.

Por outro lado, é nesse sentido que são conhecidas experiências legislativas em direito comparado, como a francesa e a alemã federal.

Entre as ofensas à vida privada e as ofensas a interesses económicos e patrimoniais não existem, de facto, analogias que reclamem um tratamento unitário e sistemático, até porque, quanto às segundas, a realidade se tem encarrgado de revelar o seu carácter mutável, produto da incessante inventiva dos agentes, normalmente pessoas altamente especializadas no funcionamento dos computadores e na gestão dos sistemas informáticos.

A presente proposta inclui diversas disposições incriminadoras de actos ou comportamentos que lesam ou põem em perigo interesses individuais dignos de tutela penal e ligados à problemática da protecção dos dados pessoais nela definidos.

Em documentos emanados de um comité de peritos do Conselho da Europa recomenda-se que se deve recorrer ao direito penal apenas em última rácio, reservando-se as sanções repressivas para as infracções mais graves, relativamente às quais se mostrem ineficazes ou insuficientes as regulamentações administrativas ou do direito civil.

As disposições penais devem descrever os actos proibidos de forma precisa, evitando-se, na medida do possível, formulações vagas e cláusulas gerais.

Dada a diferenciação dos atentados informáticos à vida privada, não devem os mesmos ser sancionados através de uma disposição global. O princípio da culpa exige uma diferenciação segundo a especificidade dos interesses ofendidos, os actos praticados, a qualidade do agente e a intenção que o determina.

As formas menos graves dos atentados informáticos devem, a este propósito, ser perseguidas mediante queixa da vítima potencial.

Enfim, a criminalização da negligência deve ser consagrada a título excepcional.

Na modelação dos tipos incriminadores e das sanções utiliza-se, tanto quanto a especificidade da matéria o permite, a técnica de formulação do Código Penal, e, quanto às últimas, a bem da coerência do sistema, pondera-se a relativa proximidade material com alguns tipos legais incluídos no mesmo Código.

Tendo em conta a previsível evolução daquele diploma, presentemente em fase de revisão, no sentido de desenvolver o princípio da preferência pelas penas precuniárias, como o aconselha a moderna política criminal, em todas as disposições incriminadoras a prisão e a multa são estabelecidas em alternativa.

Assim se colocam à disposição do julgador critérios punitivos dotados de razoável maleabilidade, que lhe permitam adequar a sanção à gravidade do facto e das suas consequências, bem como à intensidade do dolo ou da negligência e às demais circunstâncias que influem, nos termos gerais, na determinação da medida da pena no caso concreto.

De salientar a previsão da pena acessória de publicidade da condenação, cujo efeito no plano da prevenção criminal supera, para certas infracções, como as de que trata a presente proposta, normalmente obra de agentes altamente especializados no domínio de técnicas sofisticadas e de elevado estatuto social, a simples ameaça abstrata da prisão e da multa.