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16 DE MARÇO DE 1990

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modo, a possibilidade de restrições que a Constituição abre em relação ao exercício do direito de petição colectiva por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo.

2 — Tratar-se-á, como já foi entendido, de um direito menor, residual ou de escassa importância?

Longe disso. Mas só será, dentro do que tem capacidade para ser, o que os cidadãos quiserem que ele seja.

Trata-se, antes de mais, de um dos mais antigos expedientes de defesa individual contra abusos do poder. Radica no BUI of Rights do recuado ano de 1689.

No século xviii assume o carácter de petição pública a partir do reconhecimento aos cidadãos do atributo de uma verdadeira consciência política e cívica. Assim, vai perdendo as suas originárias conotações com o direito natural, ainda predominantes na Constituição Francesa de 1791, e assume gradativamente a natureza de direito público subjectivo, ou seja, de direito político. O último toque neste sentido é-lhe dado pela feição marcadamente participativa das modernas democracias.

É este facto que faz sair o direito de petição do relativo apagamento em que o fizeram cair os novos expedientes de defesa de direitos e de salvaguarda de interesses legítimos postos ao dispor dos cidadãos pelo Estado de direito democrático. Isto depois de durante séculos ter sido o instrumento privilegiado de demanda de justiça do súbdito em face do rei.

O que justifica entre nós esta revalidação do direito de petição? A mesma insatisfação em face dos mecanismos da democracia representativa e a mesma nostalgia da democracia directa, que está na base da retoma do referendo, da acção popular e da enfática afirmação do reforço atípico da participação democrática dos cidadãos.

E não será decerto por lhe não corresponder o direito a uma decisão ou deliberação formal, como acontece com o contencioso judicial ou administrativo, que lhe há-de faltar eficácia relevante. Se do seu exercício crescente nascer um novo empenhamento cívico e uma nova consciência colectiva; se da sua prática surgir um reforço significativo da informação dos cidadãos quanto à titularidade e ao exercício dos seus direitos; se, por outra via, a sua institucionalização permitir a recolha e a canalização da denúncia de erros e injustiças e de sugestões úteis para a sua correcção e para a defesa do interesse geral, teremos encontrado a chave que abre portas e promove diálogos interditos.

É bem certo que, muitas vezes, faltam ao cidadão comum a sofisticação do profissional de imprensa, a força determinante do partido político ou sequer a capacidade de manobra do grupo de pressão. Mas debalde se recusará que no dia em que o exercício do direito de petição for assumido colectivamente como um dever cívico inscrito na moldura de um direito político contribuirá decisivamente para corrigir os distanciamentos no tempo e na acção que são próprios dos expedientes representativos tipificados no exercício do sufrágio.

O direito de petição pode transformar-se, quando devidamente assumido, na mais pacífica e eficiente forma de resistência à opressão, lepra a que não são imunes as mais perfeitas democracias.

3 — É um dado de experiência que governos e parlamentos não perfilham, em regra, idêntico entusiasmo em face deste direito e da promoção do seu generalizado exercício.

Bom era que entre nós nem o Parlamento visse nele uma arma contra o Executivo, nem este visse nele uma arma apontada contra os seus poderes.

Bom era que um e outro o encarassem como forma de expressão da vontade individual ou colectiva, a mesma vontade de que emergem as suas prerrogativas de soberania.

Propõem-se formas de exercício e de tramitação, além de modelos de eficácia, que o definem como uma magistratura cívica. Crê-se que é essa a fisionomia que mais se adequa à sua natureza política e jurídica.

De qualquer modo, estamos ainda e apenas em face de um projecto. O produto acabado já contará com o contributo de todos. Esse, sim, se antevê perfeito.

Nestes termos e nos do n.° 1 do artigo 170.° da Constituição, os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

CAPÍTULO I Princípios gerais

Artigo 1.° Âmbito da presente lei

A presente lei regula o direito de petição e as condições do seu exercício, bem como as condições em que as petições apresentadas colectivamente à Assembleia da República são apreciadas pelo respectivo Plenário.

Artigo 2.°

Definição

O direito de petição consiste no direito de apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa da Constituição, das leis, do interesse geral ou de um interesse próprio.

Artigo 3.° Natureza do direito de petição

O direito de petição é um direito fundamental de participação política democrática, sujeito à tutela específica dos direitos, liberdades e garantias.

Artigo 4.° Regime especial

São regulados pela legislação especial aplicável:

a) O exercício do direito de queixa perante o Provedor de Justiça;

b) O exercício do direito de petição pelas organizações de moradores perante as autarquias locais, relativamente aos assuntos administrativos de interesse dos moradores;