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30 DE MARÇO DE 1990

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ou a, por outras formas, ver tutelados direitos ou interesses legalmente protegidos, o acesso aos documentos públicos revela-se também um poderoso instrumento de participação política, viabilizador do exercício eficaz dos direitos de representação, petição ou queixa perante os órgãos de soberania ou qualquer autoridade (artigo 52." da Constituição) e um dos mais relevantes meios de esclarecimento sobre a gestão dos assuntos públicos (direito político basilar expressamente consignado no artigo 48.° da lei fundamental).

Por isso mesmo, antes da própria revisão constitucional de 1989, constituía entendimento generalizado que a entrada em vigor do texto constitucional iria acarretar a revogação das normas de direito ordinário contrárias ao modelo de administração não secretista e ao direito fundamental à informação (cf., por todos, Afonso Rodrigues Queiró, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 114.°, n.° 3691, de 1 de Fevereiro de 1982, p. 308).

Por outro lado, não se afigurava difícil apreender a multiplicidade de dimensões da transparência administrativa constitucionalmente configurada:

a) Dimensão organizativa, implicando uma peculiar forma de estruturação (máxime de criação e gestão de arquivos) propícia à cognoscibilidade dos documentos e hostil ao segredo como regra;

b) Dever geral dos órgãos da Administração de informação pública (por uma pluralidade de meios) sobre as estruturas administrativas, as responsabilidades de decisão, as regras de funcionamento, os actos (programados, em execução ou praticados), os fundamentos das políticas aplicadas;

c) Dever de criação legal de mecanismos de participação cívica na formação de decisões ou deliberações;

d) Direito especial dos interessados de obter informação sobre o andamento e desfecho de procedimentos administrativos.

Dúvidas se suscitavam, tão-só, em alguns quadrantes, quanto a saber se das disposições constitucionais fluía, além do direito à informação dos cidadãos com interesse directo nos processos administrativos (artigo 268.°, n.° 1), um direito geral à transparência abrangendo não só interessados no processo e terceiros com interesse legítimo nele mas quaisquer cidadãos — um direito geral de. informação relativamente aos arquivos administrativos.

Em parecer aprovado em 10 de Dezembro de 1987 sobre o projecto de lei n.° 33/V, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, não se pronunciando deliberadamente sobre a existência ou não de um direito constitucional ao arquivo aberto, reconheceu a possibilidade da sua instituição por via de lei ordinária.

Na esteira de um influente sector doutrinário, sublinhava-se que na redacção então vigente o artigo 268.°, n.° 1, da Constituição correspondia a um «minimum rule, inspirado na ideia de protecção no processo [...]. Quanto ao mais a decisão constituinte devolve a resolução do problema ao legislador ordinário, confiando no seu melhor e mais avisado conhecimento das variáveis relevantes para uma opção justa e acertada.» (Barbosa de Melo, «As garantias administrativas na Dina-

marca e o princípio de arquivo aberto», Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, vol. lvu, 1981, pp. 290-291.) O estudo citado acrescentava, porém: «O poder constituinte não deverá ir mais longe, até porque qualquer que seja a solução adoptada um dia nesta matéria ela ficará em breve sujeita à necessidade dos reajustamentos ditados pela experiência. E é necessária a maleabilidade do processo legislativo ordinário para lograr esse desejável objectivo de um direito formal permanentemente ajustado às realidades. O que significa, no fim de contas, que o texto constitucional não deve ser revisto neste ponto.» (P. 291.)

Tal juízo, que prevaleceu na revisão constitucional de 1982, não impedia o avanço do legislador ordinário. Não se revelou, contudo, possível reunir então as condições institucionais e políticas necessárias para esse efeito, como pretendiam os deputados signatários do projecto de lei n.° 33/V.

3 — A abertura do segundo processo de revisão constitucional veio permitir recolocar a questão.

3.1 —A apresentação de propostas.

No seu projecto de revisão constitucional (n.° 2/V), o PCP propôs o aditamento ao artigo 267.°, «Estrutura da Administração», de um novo n.° 5, do seguinte teor:

A lei garante a todos o acesso aos documentos e arquivos da Administração Pública e assegura a informação regular e objectiva dos cidadãos sobre os actos da Administração.

O projecto de lei n.° 3/V (PS) propôs a inclusão entre os direitos e garantias dos administrados (artigo 268.°) de uma nova norma, com a seguinte redacção:

1 — Os cidadãos têm o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, salvo em matérias relativas à segurança e defesa do Estado, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, nos termos da lei.

No projecto de lei n.° 9/V (PRD) aventava-se o aditamento ao artigo 268.°, n.° 1, do direito de os cidadãos «conhecerem, nos termos e modos fixados na lei, o andamento e decisão de quaisquer processos que por lei não sejam absoluta ou relativamente rejeitados».

Quanto aos demais projectos de revisão constitucional, é de assinalar que:

á) O PSD não propunha qualquer alteração deste aspecto do quadro constitucional (projecto de lei n.° 4/V);

b) O CDS (projecto de lei n.° l/V) pronunciava--se pela obrigatoriedade de a futura lei sobre processamento da actividade administrativa incluir normas sobre a publicidade das iniciativas da administração (artigo 267.°, n.° 4) e preconizava que o direito de informação dos cidadãos directamente interessados fosse limitado «aos casos expressamente previstos na lei» (artigo 268.°, n.° 1);

c) O Partido Os Verdes (projecto de lei n.° 8/V) pretendia uma menção específica à problemática ambiental, mediante alusão à obrigação legal de prever «formas jurídicas adequadas» para assegurar a «participação dos cidadãos na