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14 DE JULHO DE 1990

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tria, sobretudo nos medicamentos, não deixará de exercer sobre prescritores e utentes para orientarem a sua procura em relação aos bens de mais elevada comparticipação, gerando-se um consumo adicional para além dos limites da eficiência.

5 — Devido aos fracassos dos métodos atrás descritos, têm vindo a ser ensaiados na Europa comunitária sistemas de orçamentos-alvo, através da selecção criteriosa dos destinatários em mais aguda necessidade, por métodos de discriminação positiva, sem efeitos estigmatizantes. Coloca-se, porém, em tais métodos o problema de saber como fazer a selecção dos beneficiados. Os métodos administrativos correm o risco de serem não só dispendiosos, como ainda passíveis de abusos, necessitando de uma pesada máquina de inspecção, o que lhes limita a eficiência.

6 — Tem vindo a generalizar-se a ideia de que ninguém melhor que os clínicos que estão em contacto directo com o utente, os seus médicos de família ou clínicos gerais, poderá decidir quem deve e quem não deve ser beneficiado por maiores comparticipações. Dois argumentos militam a favor desta solução:

a) Os clínicos gerais são agentes essenciais nos sistemas de saúde — há até quem lhes chame os guarda-portão do sistema — e o seu comportamento económico molda os desperdícios ou eficiências; logo, sobre eles deve recair a decisão de seleccionar os beneficiários das medidas de discriminação positiva;

b) Os clínicos gerais, passando a conhecer os preços dos bens e serviços que receitam, poderiam tornar-se prescritores mais sóbrios e melhores gestores, desde que lhes seja atribuído o poder de distribuir um orçamento adicional para benefícios extra entre os seus clientes. Daqui nasceu o conceito de orçamentos clínicos, que em certos países visa até cobrir os encargos com os internamentos hospitalares.

7 — O presente diploma pretende fixar uma metodologia que permita dotar os clínicos gerais, em base facultativa, de um orçamento clínico que eles usarão para os seus doentes que carecem de cuidados mais dispendiosos e continuados. Uma vez ensaiado o método, ele poderia ser cuidadosamente avaliado e depois generalizado a outros serviços ou bens de saúde, como os meios complementares de diagnóstico ou os tratamentos de fisioterapia, em função dos resultados que fossem sendo registados.

8 — A presente lei visa lançar uma metodologia nova na gestão financeira da saúde. Não reduz a acção do Governo, a quem compete sempre a definição dos montantes a administrar por esta via, bem como a fixação das condições de acesso a estes benefícios suplementares seleccionados. Não se retiram direitos aos cidadãos, não se desperdiçam recursos, antes eles são orientados para os que deles mais carecem. As decisões administrativas, normalmente indiscriminadas e depredadoras de recursos, tantas vezes com efeitos adversos, são aqui substituídas por decisões racionais de quem melhor conhece a situação individual do utente. Reforça-se a relação privilegiada médico-utente, personalizam-se os contactos e facultam-se condições para que a anamnese clínica seja completada pelo conhecimento dos factores familiares, sociais e económicos que tantas vezes estão na origem da patologia ou disfunção.

9 — A forma legislativa adoptada — lei da Assembleia — torna-se essencial devido à indefinição ainda

existente sobre a Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde. O conceito de discriminação positiva aqui introduzido deverá também constar da lei de bases ainda pendente de apreciação. Por outro lado, a colaboração necessária dos principais executantes — os médicos de clínica geral — necessita de ser amplamente discutida em nível nacional. Nenhum fórum parece para tal mais adequado para a assembleia dos representantes do povo, a sede do poder legislativo.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Objecto

1 — A presente lei destina-se a criar mecanismos de apoio selectivo aos cidadãos que, por razões de saúde, se encontram em risco de consumo acrescido de bens e serviços de saúde.

2 — Para os efeitos da presente lei consideram-se em risco de consumo acrescido de bens e serviços de saúde todos os cidadãos que, por razões designadamente de ordem etária, de ocupação, de doença crónica, de incapacidade funcional, de rendimentos ou de acessibilidade aos cuidados necessitam de utilizar uma quantidade superior à média de certos serviços ou bens de saúde.

Artigo 2.° Situações de risco de consumo acrescido

1 — As situações de risco de consumo acrescido constituem matéria de julgamento e decisão do médico, mediante o apoio da equipa de saúde, com base em características de natureza etária, epidemiológica, ocupacional, social e residencial previamente definidas por decreto-lei.

2 — Serão igualmente definidos por decreto-lei, em função da evolução da morbilidade da população portuguesa e dos recursos que o Estado disponibilize para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), os serviços e bens de saúde objecto do apoio previsto no presente diploma.

3 — 0 orçamento do SNS disporá em cada ano de uma dotação específica, em percentagem da dotação ordinária, destinada à cobertura dos encargos com as situações a que se refere a presente lei.

4 — Para efeitos do orçamento relativo ao ano de 1991, tendo em conta o seu carácter inovador e a necessidade de avaliação e eventual revisão das medidas adoptadas, será limitada a 2,5% a percentagem a que se refere o número anterior.

Artigo 3.° Apolo financeiro

1 — O apoio a prestar será de natureza financeira, sob a forma de título de crédito de montante variável, emitido pela administração regional de saúde do domicílio do utente, subscrito pelo seu médico de família e destinado a comparticipar nos encargos não reembolsáveis com serviços e bens de saúde abrangidos pela presente lei e demais legislação aplicável, a adquirir ao sector privado prestador.