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29 DE FEVEREIRO DE 1996

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Recurso da admissibilidade do projecto de lei n.fl 107/VII apresentado pelo PSD

Ao abrigo do disposto no artigo 139.° do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata abaixo assinados vêm recorrer da decisão de admissão, de S. Ex." o Presidente da Assembleia da República, proferida sobre o projecto de lei n.° 107/VT1, da iniciativa do Deputado Jorge Lacão e outros Srs. Deputados do Partido Socialista, nos termos e com os fundamentos seguintes:

0 projecto de lei n.° 107/VTJ, «Amnistia às infracções de motivação política cometidas entre 27 de Julho de 1976 e 21 de Junho de 1991», quer pela simples leitura da sua justificação quer pelo seu articulado, dirige-se a um grupo de pessoas determinado — membros das FP-25 de Abril — ao amnistiar crimes concretamente cometidos por aqueles elementos.

Este projecto de lei, ao visar apenas os crimes de organização terrorista e de terrorismo, viola o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa a dois níveis:

1 — Amnistia apenas crimes praticados num determinado espaço de tempo, quando praticados exclusivamente no âmbito de uma organização terrorista, crimes estes que visam prejudicar, nomeadamente, a independência nacional, intimidar pessoas ou a população em geral.

E, assim, segundo o projecto, alguém que cometeu um roubo ou furtou um veículo com intuito terrorista é amnistiado; quem cometeu os mesmos crimes mas sem finalidades terroristas, isto é, sem tanta gravidade, tem de cumprir a pena respectiva.

Significa isto que o projecto de lei privilegia nitidamente — entre dois cidadãos que, porventura, tenham praticado crimes do mesmo tipo — os criminosos terroristas, mesmo que estes tenham, por exemplo, visado prejudicar a independência nacional ou o funcionamento das instituições do Estado.

A leviandade do objectivo do presente projecto de amnistia não resiste a uma confrontação com a opinião de Gomes CanOtilho e Vital Moreira (Constituição Anotada, p. 650).

O problema é o de saber se certas categorias de crimes, como são os crimes contra a Humanidade e os crimes de responsabilidade, são ou não susceptíveis de amnistia.

E manifestamente aqueles tipos de crimes que envolvem assaltos a bancos, rebentamento de bombas furtos de veículos, raptos e sequestros e mesmo crimes de sangue gue aterrorizam a população em geral não o poderão ser sem se consumar uma ofensa grave ao próprio escopo teleológico da Constituição da República Portuguesa e à sua matriz.

Em todo o caso, a consequência discriminatória, acima referida, do projecto de lei, «casa» mal com o princípio de que «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei», mesmo considerando, como os autores citados, que, «como acto essencialmente político —ainda que sob a forma de lei —, a amnistia é essencialmente insindicável quanto à sua oportunidade e quanto à sua extensão, bem como à determinação dos seus efeitos». É que mesmo um acto político sob forma legislativa tem de se conformar obrigatoriamente, num Estado de direito, com o princípio constitucional da igualdade.

Admitindo, por mera hipótese, como conforme à Constituição a discriminação em causa — a amnistia, em abstracto, de certos tipos de crime desde que praticados

em certas circunstâncias, ainda que mais graves do ponto de vista da sua valoração jurídico-penal —, há, no entanto, que atentar no fundamento último da referida discriminação. E eis-nos perante o segundo nível em que esta questão não pode deixar de ser colocada.

2 — Trata-se de uma-lei que tem como única destinatária uma organização terrorista ligada às FP-25 de Abril, tal como a «Nota justificativa» o refere. Aliás, perde-se qualquer fio condutor quando se alude «a actos controversos de natureza política», expressão incompreensível e tecnicamente inadmissível.

A conclusão, insofismável, a tirar é a de que os crimes a amnistiar o são em razão das convicções políticas dos seus autores. Será isso que distinguirá na prática a amnistia, por um lado, de um assalto ou de um rapto praticada por um membro das FP-25 e, por outro lado, a não amnistia de um mesmo tipo de crime ou até uma das chamadas «bagatelas penais» praticada por um qualquer' outro cidadão, embora sem motivação política.

Resulta daqui que os membros das FP-25 seriam privilegiados por esta lei da amnistia em razão das convicções políticas ou .ideológicas que perfilharam.

Assim sendo e em conclusão, esta amnistia não se conforma, pois, com o disposto no n.° 2 do artigo 13." da Constituição da República Portuguesa, a saber: «Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça,, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.»

Aliás, mesmo que assim se não considerasse restaria sempre salientar que a amnistia, tal como está redigida no projecto de léi, se aplica ainda a crimes de sangue, o que contradiz a «Nota justificativa».

Não se esclarece o problema da autoria moral nem se afastam, porque não excepcionados, vários crimes de sangue não contidos nas prescrições do n.° 2 do artigo 1.° do projecto.

Termos em que entendemos dever ser recusada,.de acordo com o disposto na alínea q) do n.° 1 do artigo 132." do Regimento, a admissibilidade do presente projecto de lei, em função, designadamente, da violação do princípio da igualdade consignado na Constituição.

Lisboa, 28 de Fevereiro de 1996. — Os Deputados do PSD: Carlos Encarnação — Guilherme Silva (e mais duas assinaturas).

PROJECTO DE LEI N.9 108/VII

ALTERA 0 REGIME JURÍDICO DE PROTECÇÃO ÀS VÍTIMAS DE CRIMES VIOLENTOS

Nota justificativa

No momento em que foram cometidos os crimes atribuídos às Forças Populares 25 de Abril não estava em vigor o Decreto-Lei n.° 423/91, dé 30 de Outubro, que introduziu na ordem jurídica portuguesa um regime de indemnização as vítimas de crimes violentos.

Assim, vigoravam à altura e sobre esta matéria apenas as disposições do Código Penal relativas às indemnizações civis a decretar nas sentenças. As vicissitudes judiciais dos processos relativos aos crimes atribuídos às Forças Populares 25 de Abril, conjugadas com as normas aplicáveis,