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26 DE ABRIL DÉ 1997

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IV — Questões suscitadas pela aplicação prática

1 — O Acórdão n." 979/96 do Tribunal Constitucional

0 recente Acórdão do Tribunal Constitucional de 25 de Julho último veio proceder, pela primeira vez, ao julgamento das contas dos partidos, no caso relativas ao ano de 1994, pelo que constitui um precioso elemento a ter em conla nesta apreciação, enquanto se aguarda o acórdão relativo às contas de 1995.

Com efeito, o acórdão revela um conjunto de oito questões que, pela sua importância e pela forma geral que se manifestaram em diferentes contas apresentadas, devem ser ponderadas a fim de se aferir da necessidade de introduzir no texto da lei algumas aclarações ou, mesmo, alterações.

Assim, e desde logo, a sujeição a fiscalização das contas de todos os partidos registados, independentemente da sua representação em qualquer órgão de soberania, regional ou autárquico.

Por outro lado, a necessidade de consolidação das contas, de modo a abrangerem as contas das estruturas descentralizadas e autónomas.

Em terceiro lugar, a clarificação da relação das contas anuais com as contas de campanhas eleitorais.

Duas outras questões abordadas prendem-se com o grau de adequação das contas ao Plano Oficial de Contabilidade, por um lado, e as exigências quanto ao âmbito do inventário anual, por outro.

O acórdão revela ainda que não foi claro que os partidos têm de exigir (e, pressupõe-se, apresentar) os documentos de deliberação das pessoas colectivas que lhes concederam donativos.

A falta de utilização sistemática dos instrumentos bancários do depósito e do cheque e de preparação de elementos que permitam uma conciliação bancária é ainda abordada no acórdão, que conclui que «sem observância dessas práticas não é viável um controlo perfeito e rigoroso (seja interno, seja externo) da contabilidade dos partidos políticos».

Por fim, o Tribuna) Constitucional identificou nas diversas contas algumas questões específicas que se prendem com o desdobramento de cheques entre conta geral e conta de campanha; documentação de angariação de fundos e de justificação de despesas; e discriminação dos donativos anónimos.

2 — Outras questões

A análise da Lei n.° 72/93 suscita ainda outras questões que merecem ponderação.

A conjugação de um limite total anual de donativos que os partidos podem receber de pessoas colectivas (1000 sm), com um limite máximo de donativos por pessoa colectiva (100 sm) induz o efeito perverso de uma concentração dos doadores que aumenta a dependência do partido relativamente a cada um deles, em sacrifício da independência que uma maior dispersão permitiria (artigo 4.°, n.os 1 e 2).

A disciplina deste artigo 4.° é ainda marcada por três outras incongruências na lógica do sistema: fixa um limite máximo de donativos de «natureza pecuniária», deixando ilimitados e sem sujeição a controlo os donativos em espécie; impõe um limite a partir do qual os donativos das pessoas singulares têm de ser titulados por cheque, mas nada dispõe quanto aos donativos das pessoas

colectivas; esclarece que o limite para as pessoas

colectivas é um limite anual, mas o das pessoas singulares parece ser um limite por donativo, que se pode repetir ao longo do ano.

Por outro lado, não se percebe porque a isenção de contribuição autárquica se restringe aos prédios urbanos ou suas fracções, não abrangendo os rústicos [artigo 8.°, n.° 1, alínea d)].

Do mesmo passo importaria clarificar, no artigo 9.°,

n.° 1, a expressão «às eleições gerais», que é equívoca. Assim, como se deveria clarificar que a lista prevista na alínea a) do n.°5 do artigo 10.° devem conter a identificação dos doadores.

O artigo 14.° só prevê sanções para os partidos políticos, nada prevendo quanto a terceiros que violem o disposto anteriormente, o que se repete, aliás, no regime sancionatório das finanças de campanha (artigos 22.° e seguintes).

As condições de comunicabilidade das contas dos partidos com as de campanha têm de ser clarificadas [artigo 15.°, n.os 2, alínea b), e 3 e artigo 16.°, n.°l].

O que ficou dito sobre o artigo 4.° é válido para o artigo 16.°, sobre os donativos para campanhas eleitorais.

V — Opção de base

Coloca-se, antes de mais, a necessidade de proceder a uma opção de base quanto à manutenção do modelo de financiamento misto e, em particular, sobre a possibilidade de as pessoas colectivas concederem donativos aos partidos políticos.

E certo que nos anteriores debates parlamentares o PCP ficou isolado, tendo todos os restantes partidos defendido claramente a solução vigente.

O argumento essencial contra o financiamento privado centra-se no entendimento de que esta forma de financiamento estabelece laços de dependência dos partidos relativamente aos seus financiadores, assim limitando a sua liberdade de prossecução do interesse público, que o desempenho da função representativa exige. Em particular no que respeita às sociedades comerciais, é referido que o seu escopo lucrativo é antitético do financiamento benévolo e desinteressado.

Ora, desde logo quanto às pessoas singulares, não se vê como se possa proibir esta forma de participação política, ou mesmo condicionar o seu exercício ao ónus da filiação partidária. Como recentemente referiu o Tribunal Constitucional Alemão, o financiamento público separa os.partidos da sociedade, enquanto o financiamento privado estimula a participação dos cidadãos na vida democrática e, podemos acrescentar, a necessidade de se financiar contribui para que o partido se abra à sociedade.

Por outro lado, o argumento relativo às sociedades é insustentável no quadro de um ordenamento jurídico em que não só se permite como se valoriza do ponto de vista fiscal (artigos 39.° e 40° do CIRC) os donativos benévolos, seja para fins culturais ou de beneficência seja ao Estado, regiões ou autarquias.

Só um inaceitável preconceito de suspeição geral relativamente aos partidos pode fundar uma pretensão deste tipo. Mas sempre se dirá que as formas adequadas de prevenir que o financiamento privado conduza a comportamentos ilícitos não está na sua proibição, mas no reforço da transparência do processo de decisão da administração e no sancionamento de eventuais comportamentos desviantes.