O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

17 DE OUTUBRO DE 1997

21

didas necessárias para proporcionar às mulheres a concretização do seu direito a uma maternidade feliz, que verdadeiramente protegem o embrião e o feto.

VI — O aborto como último recurso

O debate veio recordar que o direito a uma maternidade e paternidade felizes e conscientes exigem a concretização do direito à educação sexual e do direito ao planeamento familiar.

De facto, são esses os meios preventivos do aborto.

Por isso, em 1982, ao mesmo tempo que apresentava o primeiro projecto de lei sobre o aborto, o PCP inseriu, no debate um projecto de lei sobre educação sexual e planeamento familiar, um projecto sobre protecção da maternidade. Todos os projectos confluíam no objectivo de efectivar o direito à maternidade e paternidade conscientes.

Mas a educação sexual é praticamente inexistente no nosso país.

E o debate sobre o projecto de lei do PCP, na anterior sessão legislativa, demonstrou como é ainda insuficiente a concretização do direito ao planeamento familiar, apesar dos progressos verificados desde 1984.

Acresce que os métodos contraceptivos não são infalíveis, pelo que o aborto é sempre o último recurso para quem entende que a maternidade e a paternidade devem ser livres e conscientes, e que, sob pena de grave violação dos direitos fundamentais da mulher, nenhum Estado pode impedir o direito à tomada de decisão.

VII — Os apelos das conferências internacionais

O aborto clandestino é um problema grave, que, preocupando diversos países, levou à alteração das leis crimi-nalizadoras, aí onde se entendeu que se tratava de um problema social, de um problema de saúde pública, de um problema de direitos humanos.

As últimas conferências internacionais sobre a situação da população (Cairo, 1994) e sobre a situação da mulher (Beijing, 1995) apelaram aos Estados para que abordassem a questão do impacte na saúde do aborto praticado em condições de risco, tendo a.Plataforma de Acção de Beijing apelado aos países para que considerassem a possibilidade de rever leis que contêm medidas punitivas contra as mulheres que praticarem abortos ilegais.

A Organização Mundial de Saúde, na conferência realizada em 1994 sobre a situação da saúde das mulheres, indicou como índices daquela situação a mortalidade materna, a anemia e o aborto inseguro.

O relatório do FNUAP (Fundo das Nações Unidas para a População), publicado já no corrente ano, revela estatísticas mundiais que dispensam comentários: de 75 milhões de gravidezes por ano não desejadas resultam 45 milhões de abortos; 70 000 mulheres morrem por ano em consequência de aborto praticado em condições de risco e um número desconhecido sofre de infecções e de outras consequências para a saúde.

Sabendo-se, como se sabe, que a maior parte dos abortos clandestinos tem origem nas condições económicas, sociais e profissionais, pudemos concluir que as parcas alterações introduzidas na lei na última sessão legislativa não respondem aos apelos das conferências internacionais.

Vfll — A reapresentação da iniciativa legislativa

O movimento de opinião favorável à abolição da criminalização do aborto, demonstrando a crescente conde-

nação do aborto clandestino gerado pela própria lei, a continuação dos graves problemas sociais e de saúde pública das mulheres portuguesas, a privação do seu direito a uma maternidade consciente e feliz, justificam a reapresentação da iniciativa legislativa.

Os abortos continuam a fazer-se aos milhares, num número que não se sabe exactamente porque não há estatísticas da clandestinidade. E por cálculos meramente matemáticos, a partir da taxa de fertilidade das mulheres e do número de gravidezes que não chegaram ao fim, que se chega a um número que peca por defeito: 26 000 abortos por ano.

O aborto inseguro representa uma barbárie que se abate sobre o sexo feminino. Há que pôr fim à mesma.

Na reapresentação da iniciativa legislativa levámos em devida conta o resultado dos debates.

Mas se consideramos importante, e assim alguns o destacaram, como forma preventiva de futuros abortos que a mulher que interrompa uma gravidez tenha acesso no prazo de sete dias a consulta de planeamento familiar, como nós o propusemos e propomos, já a passagem prévia da mulher que deseja abortar por qualquer centro de aconselhamento nos parece não ser de admitir, porque não representa, de facto, qualquer protecção da vida intra-uterina.

A experiência de algumas leis que tal introduziram tem demonstrado que essa exigência faz aumentar a taxa de abortos realizados no 2° trimestre, e faz aumentar a taxa de abortos realizados em Estados limítrofes que não colocam essa exigência. Foi o que aconteceu, por exemplo, no Estado do Mississipi, a partir do momento da exigência de passagem prévia por centros de aconselhamento: o número de abortos realizados no 2° trimestre passou, no primeiro ano de execução da lei, de 10,4% para 14,5% (com o agravamento dos riscos para a saúde das mulheres) e aumentou a taxa de abortos realizados no Estado vizinho.

Assim, o projecto de lei que apresentamos corresponde ao projecto de lei n.° 177/VII, da anterior sessão legislativa, contendo apenas as alterações resultantes da aprovação da Lei n.° 90/97, de 30 de Julho.

Propomos:

A exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez quando realizada nas primeiras 12 semanas a pedido da mulher;

Nos casos de mãe toxicodependente o alargamento do período atrás referido para as 16 semanas;

A especificação de que, havendo risco de o nascituro vir a ser afectado pelo síndroma de imunodeficiência adquirida, o aborto (eugénico) poderá ser feito até às 24 semanas (situação que já está compreendida na actual lei, mas que convirá explicitar dadas algumas resistências ainda existentes relativamente à aplicação da lei);

O alargamento de 12 para 16 semanas do prazo dentro do qual a IVG pode ser praticada sem punição, nos casos em que a mesma se mostre indicada para evitar perigo de morte ou de grave lesão para o corpo ou saúde física ou psíquica da mulher grávida. Na verdade, a vida demonstrou, nomeadamente nas doentes submetidas a tratamentos antidepressivos, a necessidade de alargamento do prazo;

O alargamento para 24 semanas no caso de vítimas de crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual quando menores de 16 anos ou incapazes por anomalia psíquica;