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II SÉRIE-A — NÚMERO 4

Uma comunicação social livre e pluralista constitui a única garantia contra as tentações totalitárias, as repressões sociais e a própria ambivalência do progresso, em que frequentemente os mitos desenvolvimentistas encobrem concepções orwelianas de vida.

Por seu lado, a existência de tribunais independentes é a única forma até hoje encontrada de defender as liberdades individuais, de realizar a justiça e de garantir a paz social.

O projecto de lei em apreço preocupa-se em encontrar esse difícil ponto de equilíbrio no segredo de justiça, como trincheira de defesa dos direitos e liberdades individuais, e a liberdade de imprensa, como um esteio de democracia comunicacional, na designação sugestiva do pensador alemão Habermas. Para o conseguir propõe a alteração dos artigos 53°, 86.° e 132° do Código de Processo Penal, bem como do artigo 63.° da Lei Orgânica do Ministério Público e do artigo 81 ° do Estatuto da Ordem dos Advogados.

Tal iniciativa segue-se passado algum tempo ao debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS--PP sobre o conceito, finalidades e regime jurídico do segredo de justiça em Portugal e que foi levado a efeito, em Plenário da Assembleia da República, em 20 de Dezembro de 1996.

• Há informação de que será apresentada brevemente nesta Assembleia uma proposta de lei de revisão do Código de Processo Penal, em que serão alteradas, segundo propósitos já divulgados pelo Sr. Ministro da Justiça, algumas disposições referentes ao regime de segredo de justiça.

II — Apreciação jurídica do projecto de lei n." 292/VII

A) Artigo 53." —Este artigo do actual Código de Processo Penal atribui exclusivamente ao Ministério Público a titularidade da acção penal, pelo que nenhuma outra entidade, nomeadamente a magistratura judicial, pode promover e dar andamento ao processo penal na sua fase de inquérito.

Dentro desta perspectiva, a Lei Orgânica do Ministério Público — Lei n.° 47/86, de 15 de Outubro — estabelece, no artigo 3.°, n.° l, alínea b), que compete ao Ministério Público exercer a acção penal na alínea f), que lhe compete dirigir a investigação criminal (ainda que realizada por outras entidades) e, na alínea c), que lhe compete fiscalizar os órgãos de polícia criminal.

O presente projecto de lei n.° 292/VII, ao acrescentar na alínea c) que compete ao Ministério Público o dever especial de «promover, em resposta a requerimentos dos particulares interessados, as diligências necessárias à reintegração do bom nome e reputação de pessoas investigadas e à garantia de presunção de inocência dos arguidos até ao trânsito em julgado de decisões condenatórias», está a reforçar as competências daquela magistratura, de molde a não se pôr em causa o princípio de presunção de inocência do arguido, garantindo, por outro lado, o bom nome e a reputação das pessoas objecto de investigação.

Como o dever de obediência ao segredo de justiça desaparece numa fase muito anterior ao trânsito em julgado da sentença, por respeito à liberdade de informação, há que tutelar devidamente a qualidade de investigação, sob pena de se violar, de forma às vezes irreparável, o bom nome e a intimidade da vida privada.

A disposição que se pretende acrescentar ao corpo do artigo 53." do Código de Processo Penal insere-se, exactamente, nesia óptica. Se não se tutelar a qualidade de

investigação, corre-se sérios riscos de se violar o segredo de justiça e, consequentemente, os direitos dos cidadãos, nomeadamente o direito ao bom nome e à defesa da sua vida privada.

B) Artigo 86."— Este artigo, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 78/87, de 17 de Fevereiro, inverteu a posição tradicional em matéria de segredo de justiça, pois preceitua como regra, e sob cominação de nulidade, a publicidade do processo a partir da decisão instrutiva (a instrução e a audiência instrutória são sigilosas) ou, não havendo instrução, a partir da altura em que esta já não pode ser requerida. Até qualquer destas situações impera o segredo de justiça.

Com o seu projecto de lei o Grupo Parlamentar do CDS-PP pretende antecipar o momento em que termina o segredo de justiça.

O processo penal constitui como regra a publicidade. E a publicidade um princípio constitucional do direito hodierno e prática universal dos países livres e democráticos, constituindo um dos pilares das declarações dos direitos humanos". O segredo de justiça é a excepção, terminando logo a partir da acusação, e não com o término da fase instrutória, que pode pôr em causa a acusação.

O segredo de justiça passará a vigorar, segundo as alterações pretendidas, durante todo o inquérito, terminando de imediato com a acusação, independentemente do pedido de abertura de instrução, sustentada no artigo 287.° do Código de Processo Penal.

Na esteira do princípio ínsito no artigo 53.° do Código de Processo Penal, e porque se pretende que o segredo de justiça termine com a acusação, o0piojecto de lei sub Júdice preceitua, nas alterações que formula nos n.~" 4, 6 e 7 do artigo 86.°, que deverá caber exclusivamente ao Ministério Público a titularidade da acção penal, pelo que ao mesmo cabe, exclusivamente, «dar ou ordenar ou pet-mitir que seja dado conhecimento a determinadas pessoas do conteúdo de actos ou do documento em segredo de justiça, se tal se afigurar consciente ao relacionamento da verdade» (n.° 4) e «pode autorizar a passagem de certidão em que seja dado conhecimento do conteúdo do acto ou do documento em segredo de justiça na medida estritamente necessária à dedução em separado do pedido de indemnização civil» (n.° 6)».

Acrescenta-se, no n.° 7, que o Ministério Público pode, por força de requerimento fundamentado no estatuído na alínea a) do n.° I do artigo 72.°, autorizar «a passagem de certidão em que seja dado conhecimento do acto ou do documento em segredo de justiça sempre que o processo respeite a acidente causado por veículo de circulação terrestre».

O Artigo 132.°—As testemunhas, segundo o artigo 132.° do Código de Processo Penal, estão sujeitas aos deveres de apresentação, de prestação de juramento, de depoimento e de respondei" com verdade às perguntas que lhe forem dirigidas.

Mas é a presente lei omissa quanto aos direitos de as testemunhas se fazerem acompanhar de advogado, direito que assiste ao arguido (artigos 62.° e 64.° do Código de. Processo Penal).

Ao aditar tal direito, pretende o legislador proteger a testemunha, sobretudo em processos de natureza complexa, em que nem sempre são respeitadas pela autoridade judiciária as regras de inquirição consubstanciadas no artigo 138.° do Código de Processo Penal.

Assim, a testemunha passa a ter o direito, em qualquer fase do processo, de se lazer acompanhar por um advogado.