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II SÉRIE-A — NÚMERO 27
Destaca-se, em primeiro lugar, a criação de uma nova forma de processo especial — o processo abreviado (artigos 391.°-A e seguintes).
Limita-se a sua aplicação aos casos de crime punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou de crime punível com pena de multa, da competência do tribunal singular, com o objectivo de uma rápida submissão do caso a julgamento.
Trata-se de um procedimento caracterizado por uma substancial aceleração nas fases preliminares, mas em que se garante o formalismo próprio do julgamento em processo comum com ligeiras alterações de natureza formal justificadas pela pequena gravidade do crime e pelos pressupostos que o fundamentam.
Estabelecem-se, porém, particulares exigências ao nível dos pressupostos. São eles o juízo sobre a existência de prova evidente do crime — como sucederá, por exemplo, nos casos de flagrante delito não julgados em processo sumário, de prova documental ou de outro tipo, que permitam concluir inequivocamente sobre a verificação do crime e sobre quem foi o seu agente — e a frescura da prova — traduzida na proximidade do facto, não superior a 60 dias —, pressupostos que, na sua essência, igualmente enformam o processo sumário, característico do nosso sistema. Tratar-se-á, em síntese, de casos de prova indiciária sólida e inequívoca que fundamenta, face ao auto de notícia ou perante um inquérito rápido, a imediata sujeição dõ facto ao juiz, concentrando-se, desta forma, o essencial do processo na sua fase crucial, que é o julgamento.
O procedimento é, porém, envolvido de particulares cautelas no que se refere às formalidades preliminares, em homenagem ao direito de defesa e ao princípio de igualdade de armas na fase preparatória. Estabelece-se, assim, a possibilidade de o arguido submeter o caso a comprovação judicial e de, em debate instrutório, contrariar a decisão de acusação do Ministério Público. Neste caso, caberá ao juiz de instrução a apreciação da existência de indícios suficientes em ordem a submeter o caso a julgamento, num critério de exigência aferido em função da probabilidade de ao arguido poder ser aplicada uma pena.
Ainda com o objectivo de simplificação, permite-se que o Ministério Público formule o requerimento com remissão parcial em matéria de identificação do arguido e de narração dos factos, para o auto de notícia ou para a denúncia, sem, no entanto, estabelecer concessões no que se refere ao rigor da fixação do objecto do processo, e possibilita-se que o juiz, como no processo sumário, profira verbalmente a sentença, ditando-a para a acta.
Julga-se que, por esta via, se possibilitará uma considerável aceleração do processamento da criminalidade menos grave, que, segundo as estatísticas conhecidas, representa cerca de 85% dos crimes submetidos a julgamento, com resultados que se esperam de grande reforço na credibilidade do sistema de justiça.
9 — Ao nível do processo sumaríssimo (artigos 392." e seguintes) introduzem-se alterações de vulto, que procuram criar condições para dar expressão a uma forma de processo que praticamente não tem tido aplicação e que poderá desempenhar um papel muito importante no controlo das chamadas «bagatelas penais».
Aumenta-se de 6 meses para 3 anos a moldura abstracta da pena de prisão correspondente ao crime objecto do processo c altera-se profundamente o regime processual com reforço do estatuto da defesa.
Elimina-se a audiência — excepto quando o juiz não «homologar o acordo» entre o Ministério Público e o ar-
guido — e, em vez desta, cria-se um procedimento de notificação do requerimento do Ministério Público, sujeito a particulares exigências de regulamentação para efectiva garantia do direito de defesa, de modo a possibilitar um esclarecido exercício do direito de oposição à sanção proposta, a qual será sempre não privativa da liberdade.
Salvaguarda-se, porém, o poder jurisdicional de aplicação da sanção. Mesmo nos casos de consenso entre o Ministério Público e o arguido, o juiz poderá sempre recusar a «homologação do acordo» se discordar da sanção proposta, nomeadamente por a considerar injusta ou desproporcionada, e ordenar o prosseguimento do processo para julgamento em que intervirá sem quebra de imparcialidade, uma vez que não lhe foi solicitada a apreciação da prova indiciária, mas tão-somente a do conteúdo da proposta do Ministério Público, com a sua própria autonomia formal. Neste caso, o aproveitamento racional dos actos processuais e o acordo firmado entre o Ministério Público e o arguido impõem, em benefício da celeridade, que o juiz designe de imediato dia para a audiência de julgamento, mantendo-se a forma sumaríssima do processo.
Devidamente salvaguardado está também o direito que o arguido tem de lhe não ser «roubado o conflito», já que, se este se opuser, o processo segue a forma comum, impondo também aqui o aproveitamento racional dos actos processuais que o requerimento do Ministério Público funcione como acusação.
10 — Introduzem-se ainda alterações que visam fundamentalmente rentabilizar soluções processuais típicas da pequena e média criminalidade, já existentes e devidamente testadas. É disto exemplo o alargamento dos casos de suspensão provisória do processo, que passa a abranger os crimes, puníveis com pena de prisão até 5 anos e a ser aplicável também na fase da instrução (artigos 281.°, n.° 1, e 307.°, n.° 2), a extensão dos efeitos da confissão livre, integral e sem reservas aos crimes puníveis com pena de prisão não superior a 5 anos [artigo 344.°, n.° 3, alínea c)] e as modificações introduzidas no processo sumário.
É de destacar, nesta forma especial de processo, a possibilidade de recurso à faculdade prevista no artigo n.° 3, em caso de concurso de crimes, a eliminação do requisito da idade mínima do arguido, a possibilidade de adiamento da audiência até ao 30." dia posterior à detenção, em total sintonia com o que se dispõe em matéria de continuidade da audiência no artigo 328.°, n.° 6 (artigo 386.°), o esclarecimento dos casos de impossibilidade de audiência imediata (artigo 387°) e a restrição dos casos de reenvio do processo para a forma comum (artigo 390.°).
11 — O regime de conexão de processos, actualmente dotado de algum rigidez, gerador de dificuldades no processamento e julgamento conjunto de infracções cometidas pelo mesmo arguido, é objecto de alterações, que procuram conciliar a protecção do princípio do juiz natural com a economia processual.
Mantêm-se as regras vigentes nesta matéria, tornando mais claras as situações de conexão previstas no artigo 24.°, mas rejeita-se o alargamento irrestrito da conexão subjectiva em moldes idênticos aos previstos no anterior Código de 1929, passíveis de gerar situações de autêntico desaforamento, com graves dificuldades de. desíocação do arguido e dos demais intervenientes processuais.
Assim, procede-se a um alargamento da conexão subjectiva independentemente da verificação dos pressupostos previstos no artigo 24.°, mas contém-se a competência no tribunal sediado na comarca em cuja área fotam prati-