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II SÉRIE-A — NÚMERO 29

Projecto de lei n.° 451/VII, do PS, sobre exclusão de ilicitude de casos de interrupção voluntária da gravidez;

Projecto de lei n.° 453/VII, subscrito pelos Deputados António Braga e Eurico de Figueiredo, do PS, sobre interrupção voluntária da gravidez.

A 1." Comissão, tendo em conta os prazos disponíveis para emissão" de relatório e parecer, deliberou:

Remeter para o processo de votação na especialidade a realização de consultas a especialistas de direito penal, cuja audição não se revelou possível na sessão legislativa anterior e é considerada desejável;

Circunscrever o presente relatório a uma sintética apreciação dos projectos pendentes, antecedida da resenha do quadro social que as suscita.

A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias reafirma as considerações de enquadramento gera) e constitucional constantes do seu relatório referente aos projectos de lei n.os 177/VTI, 235/VJJ e 236/VD. (publicado no Diário da Assembleia da República, 2.a série-A, n.° 23, de 22 de Fevereiro de 1997). Nele se procedeu, designadamente, a um circunstanciado balanço da aplicação da legislação sobre maternidade, planeamento familiar e aborto à avaliação da evolução da lei penal portuguesa e europeia em matéria de interrupção voluntária da gravidez, bem como à descrição dos indicadores disponíveis sobre a situação de Portugal em matéria de saúde pública e aborto clandestino (cf. anexo i) .

No contexto que então se verificava a Comissão afirmou:

Há que buscar, o mais possível, denominadores comuns, solidariedades e esforços conjuntos, aí onde estes relevem para defesa de interesses sociais importantes, desde logo os suscitados pelos perigos que ameaçam a saúde das mulheres [...]

Não faz sentido — nem é, em rigor, possível — . reeditar o tom e o conteúdo dos debates que conduziram à aprovação, promulgação e publicação da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio. Não se trata só da natural e muito evidente diferença de protagonistas e de contextos. A verdade é que hoje em dia:

Ninguém propõe a revogação do quadro legal gerado em 1984 e o regresso ao proibicio-nismo típico do Código Penal de 1886;

Ninguém propõe a proscrição do planeamento familiar e da educação sexual e o regresso aos tempos distantes em que, num Portugal amordaçado, a lei proibia a divulgação de contraceptivos;

Ninguém sustenta a aplicação em Portugal de políticas de Estado coercivas tendentes a impor à mulher e aos casais seja a limitação seja o aumento do número de filhos (que seriam inteiramente inconstitucionais e contrárias aos compromissos internacionais assumidos pela República Portuguesa);

As soluções legais aprovadas em 1984 viram alteradas as fronteiras da sua aceitação e rejeição social. Ampliou-se muito a primeira, diminuiu a segunda.

Nos últimos meses a Assembleia da República reviu, por maioria, o regime de despenalização do aborto, aprovou por unanimidade legislação com vista a reforçar os mecanismos tendentes a facilitar a adopção de crianças (no âmbito do programa Adopção 2000) e tem em debate os projectos de lei n.os 296/VH, do PSD, e 349/VU, do PS, tendentes ao alargamento da protecção à maternidade e paternidade (visando a alteração à Lei n.° 4/84, de 5 de Abril, na redacção decorrente da Lei n.° 17/95, de 9 de Junho).

Não sofreu alteração a opção estratégica fundamental aprovada em 1984, que não assenta numa consideração isolada das questões relativas à interrupção voluntária da gravidez, antes inserindo as normas que a esta dizem directamente respeito num vasto conjunto de instrumentos legais tendentes a assegurar uma maternidade livre, consciente e voluntária.

Em 1998 o que está em causa em matéria de aborto não é um «regresso ao ponto zero» (que ninguém preconiza), mas tão-só saber se ao quadro jurídico entretanto aperfeiçoado pela Lei n.° 90/97, de 30 de Julho, devem ser aditadas certas novas situações de exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez, o que exige ponderação dos seus termos e consequências.

E nesse processo de ponderação que o presente relatório se insere.

II — Aborto clandestino — Problema em aberto

1 — Em 1997 o relator dirigiu a diversas entidades pedidos de informação tendentes a apurar a evolução dos principais indicadores em matéria de saúde materna, a situação do País em matéria de planeamento familiar, educação sexual e aborto. Por outro lado, em cooperação com as Comissões de Saúde e para a Paridade, Igualdade de Oportunidades e Família, a Comissão de Assuntos Consütucionais, Direitos, Liberdades e Garantias organizou um importante ciclo de audições públicas.

Os dados assim obtidos e divulgados são relevantes, embora não tenham permitido obter indicadores rigorosos sobre alguns aspectos essenciais da saúde pública, nem podido suprir a falta de estudos de sociologia legal e de criminologia capazes de fornecer à opinião púbYica c ao legislador respostas mais esclarecedoras, que em outros países se encontram desde há muito disponíveis.

A data da elaboração do presente relatório não estão ainda tratados os dados estatísticos referentes ao ano de 1997. Em documento remeüdo à 1Comissão (com o título «Situação do aborto em Portugal após a publicação da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio»), a Direcção-Geral da Saúde veio agora reafirmar o quadro que traçara nas audições em que participou na anterior sessão legislativa, sintetizando nos termos seguidamente transcritos a evolução dos indicadores existentes:

Em 1976 a taxa de mortalidade infantil em Portugal era de 38,9 %a nados-vivos, a taxa de mortalidade perinatal era de 31,9%o nados-vivos, e a taxa de mortalidade materna era de 44,5/100 000 nados-vivos, números que figuravam entre os mais altos da Europa. Acresce que o número de abortos era calculado entre 100 000 e 200 000, constituindo a terceira causa de óbitos matemos. A sua não legalização levava à prática clandestina, na maioria dos casos em condições inaceitáveis.

Em 1982, com a integração da D/recção-Getal de Saúde e dos Serviços Médicos-Sociais na Direcção-