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1036 | II Série A - Número 034 | 17 de Outubro de 2002

 

privado, circunscrevendo o âmbito do diploma à definição do regime de direito público da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas.
Considera-se, na verdade, que não são qualitativamente idênticas e, por isso, indiferenciáveis as condutas que as entidades públicas desenvolvem como se fossem entidades privadas e aquelas que elas adoptam no exercício de poderes públicos de autoridade ou, em todo o caso, ao abrigo de disposições e princípios de direito público, institutivos de deveres ou restrições especiais, de natureza especificamente administrativa, que não se aplicam à actuação das entidades privadas. E que, dentro dessa perspectiva, ainda permanecem válidas as razões que, historicamente, levaram a associar a esta distinção uma diferenciação de regimes, admitindo que, quando está em causa o exercício de funções públicas, a responsabilidade directa do titular de órgão, funcionário ou agente e o direito de regresso sobre ele apenas devem existir quando tenha havido dolo ou culpa grave da sua parte.
Trata-se, na verdade, de reconhecer que as obrigações funcionais dos agentes públicos podem ser vastas e complexas, o que os pode levar a cometer um maior número de faltas sem culpa grave, e de admitir que a exposição do agente, nestes casos, ao pagamento de indemnizações de montante muito superior aos proventos que a função lhe proporciona pode fazer com que o receio de ser responsabilizado por culpa leve o iniba nos seus juízos e iniciativas, prejudicando a serenidade e a independência dos seus juízos.
Opta-se, assim, por delimitar o âmbito material das actuações abrangidas pelo regime de responsabilidade segundo o critério do regime jurídico substantivo ao abrigo do qual elas foram adoptadas.
Num momento histórico de reconhecida e crescente indefinição no que diz respeito à delimitação de conceitos como o de "Administração Pública" ou mesmo de "entidades públicas", não faltam, e com razão, quem neles inclua as pessoas colectivas que, tendo sido criadas segundo formas de instituição regidas pelo direito privado e funcionando fundamentalmente ao abrigo de regras de direito privado, são, no entanto, detidas por entidades públicas, gerem recursos públicos e prosseguem finalidades de interesse público. Nesta linha, regista-se o propósito de estabelecer o universo das situações que garanta aos cidadãos um efectivo direito de igualdade de tratamento.
5 - Ainda no que se refere à responsabilidade civil da Administração, as principais alterações propostas consistem no já referido alargamento da regra da solidariedade, em conformidade com a Constituição, ao domínio das condutas praticadas com culpa grave; a consagração legal da responsabilidade objectiva da Administração pelo funcionamento anormal dos seus serviços; e a introdução de um regime de presunção de culpa, nos casos em que os danos são causados por actos jurídicos, o que compreende actos administrativos e actos de conteúdo normativo.
Com a introdução desta presunção de culpa aproxima-se, finalmente, o quadro normativo da prática dos nossos tribunais administrativos, que - em sintonia com a tradição firmada nos países do sul da Europa, com particular destaque para a França, e, por influência desta, no direito comunitário -, já de há muito vinham entendendo que a culpa é inerente à prática de actos jurídicos ilegais por parte da Administração. Do mesmo passo, dá-se, assim, satisfação às exigências impostas pela Directiva n.º 89/665/CEE, de 21 de Dezembro, a que se veio juntar a Directiva 92/13/CEE, de 25 de Fevereiro, que, embora no domínio específico das consequências da anulação de actos relativos à formação de certo tipo de contratos, se fazem eco da orientação, de matriz francesa, que tem inspirado o Tribunal de Justiça das Comunidades no domínio da responsabilidade por actos administrativos ilegais e que precisamente assenta no entendimento de que a culpa se encontra ínsita na ilegalidade cometida, sem carecer, por isso, de demonstração.

2 - Responsabilidade pelo exercício da função jurisdicional

6 - Avança-se, por outro lado, no sentido do alargamento da responsabilidade civil do Estado por danos resultantes do exercício da função jurisdicional, fazendo, para o efeito, uma opção arrojada: a de estender ao domínio do funcionamento da administração da justiça o regime da responsabilidade da Administração, com as ressalvas que decorrem do regime próprio do erro judiciário e com a restrição que resulta do facto de não se admitir que os magistrados respondam directamente pelos ilícitos que cometam com dolo ou culpa grave, pelo que não se lhes aplica o regime de responsabilidade solidária que vale para os titulares de órgãos, funcionários e agentes administrativos, incluindo os que prestam serviço na administração da justiça.
No que se refere ao regime do erro judiciário, para além da delimitação genérica do instituto, assente num critério de evidência do erro de direito ou na apreciação dos pressupostos de facto, entendeu-se dever limitar a possibilidade de os tribunais administrativos, numa acção de responsabilidade, se pronunciarem sobre a bondade intrínseca das decisões jurisdicionais, exigindo que o pedido de indemnização seja fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.

3 - Responsabilidade pelo exercício da função política e legislativa

7 - De especial alcance é a opção de avançar para a consagração de um regime geral de responsabilidade do Estado e das regiões autónomas por acções ou omissões ilícitas cometidas no exercício da função política e legislativa.
Pese embora a delicadeza da matéria e a incipiência da prática jurisprudencial, entendeu-se não dever o legislador manter silêncio sobre os elementos constitutivos da responsabilidade que, neste domínio, se revestem de alguma especificidade e cuja definição, por isso mesmo, se torna mais difícil.
Neste sentido se identificam as situações de ilicitude por referência à ofensa de direitos fundamentais, quando esteja em causa a violação evidente do dever de protecção, bem como a lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos, quando resulte da violação de normas constitucionais, de direito internacional ou comunitário, ou de normas de valor reforçado - todas reconduzíveis ao âmbito da fiscalização da constitucionalidade e da legalidade das leis.
Reconhecendo, com a doutrina, que o conceito civilístico de culpa se coaduna mal com a liberdade de conformação inerente à função política e com o contraditório inerente ao pluralismo parlamentar, mas que ao mesmo tempo se impõe alguma exigência na determinação dos critérios a adoptar neste domínio, opta-se por evitar o apelo, neste contexto, a um conceito de culpa, para se reconhecer a necessidade de apreciar o contexto que rodeou a conduta lesiva, determinando se a actuação do legislador abstracto correspondeu aos padrões objectivamente exigíveis em função das circunstancias do caso.