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2941 | II Série A - Número 065 | 01 de Fevereiro de 2003

 

Usando uma linguagem simplista, mas extremamente elucidativa, Januário Lourenço (In "Branqueamento de capitais - Estudo efectuado na qualidade de auditor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Verbo Jurídico, Abril 2002) refere que "(…) o branqueamento tem essa designação porquanto ela descreve com perfeição o circuito da lavagem do dinheiro, desde a passagem por um ciclo de transacções, até cair do outro lado legalizado. Pelo meio, existe uma sucessão de transferências e negócios de modo a que esses fundos possam aparecer no final como legítimos".
A questão do branqueamento dos capitais é seguramente um dos temas mais debatidos na actualidade ao nível da opinião pública e em plúrimas instâncias internacionais e nacionais.
A crescente abertura dos diversos sistemas económicos proporciona que, através do mais variados métodos, sejam convertidos, transferidos ou dissimulados bens ou produtos gerados por actividades criminosas, permitindo com que os mesmos sejam impunemente utilizados pelos seus autores.
Trata-se de uma nova criminalidade fruto da globalização, da livre circulação de capitais, pessoas e bens, e da permeabilização das diversas economias, que opera à escala supranacional, ao procurar as "oportunidades de negócio" nos mais diversos pontos do mundo, particularmente no que se refere ao tráfico de substâncias estupefacientes e psicotrópicas.
Conforme afirma o Prof. José de Faria Costa [In "O Branqueamento de Capitais (algumas reflexões à luz do Direito Penal e da política criminal), p. 59 a 86], "é claro que o fenómeno do branqueamento de dinheiro está conexionado, primacialmente, com o tráfico de droga, porquanto esta actividade ilícita é uma das que mais lucros proporcionam, como é aquela que, por razões de desgaste e perturbações sociais, mais impacto traz ou provoca na opinião pública", mas "(…) a necessidade de branqueamento liga-se também ao dinheiro proveniente de outras fontes igualmente rendosas, nomeadamente o que advém da prática organizada da prostituição, do jogo clandestino, venda de armas, ou até da extorsão".
O fenómeno do branqueamento de capitais está, de resto, associado ao crime organizado, conforme, aliás, reconhece o Prof. Faria e Costa ao referir que "está-se defronte de uma estrutura poderosamente organizada que se infiltra aos mais diversos níveis da realidade social e que age, em qualquer circunstância, dentro dos pressupostos de uma forte cadeia hierárquica cujo fito é sempre o de conseguir uma maior acumulação de capital para, desse jeito, directa ou indirectamente, aumentar também o poder da organização".
Januário Lourenço adianta que "maioritariamente, o branqueamento é uma prática usada pelo organized crime. Normalmente, praticada por indivíduos com ligações às próprias organizações criminosas, quando não fazem delas, directamente, parte".
Aliás, Rodrigo Santiago (In Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 4, 4.º, Outubro-Dezembro de 1994, p. 497 e segs.) refere que "foi, justamente, com o fenómeno do crime internacionalmente organizado que se sentiu necessidade de passar a punir o branqueamento de capitais e outros produtos do crime".
Segundo o Relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) de 1999, o rendimento bruto das associações criminosas está estimado em cerca de 1,5 milhões de dólares americanos por ano, o que é profundamente revelador.
Aliás, de um modo geral, as cifras envolvidas no fenómeno do branqueamento de capitais são verdadeiramente impressionantes.
Refira-se que o Observatório Geopolítico das Drogas (OGD), no relatório anual divulgado em Paris, em 20 de Abril de 1999, estima entre 73,8 e 84,4 mil milhões de contos as somas provenientes do tráfico de droga reintegrados na economia mundial.
Por sua vez, no X Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime, realizado em Viena, em 2000, Pino Arlachi - Director Executivo do Gabinete das Nações Unidas para o Controlo das Drogas e Prevenção do Crime - adiantou que "o FMI calcula que o branqueamento de dinheiro implica já entre dois a cinco por cento do PIB mundial, ou seja, 600 mil milhões de dólares por ano". Segundo ele, "o sistema SWFT (responsável pelas transacções interbancárias), opera já mil milhões de mensagens interbancárias por ano", sendo que "o volume diário da transferência de fundos representa actualmente cinco triliões de dólares, ou seja, o número cinco seguido de doze zeros".
Já em finais de 1997, aquele responsável das Nações Unida afirmava, numa comunicação apresentada no Congresso "La justice Entrave", realizado em Bruxelas, que se "estima que, diariamente, um bilião de dólares, provenientes de lucros do crime seja electronicamente introduzido/transferido, através dos mercados financeiros mundiais".
De acordo com dados fornecidos pela Polícia Judiciária, no nosso país, no ano de 1999, foram apreendidos valores provenientes de ilícitos de branqueamento de capitais na ordem dos 8 978 348 euros, registo que decresceu nos anos de 2000 e 2001, passando para 1 598 145 euros e 158 822 euros, respectivamente.
Refira-se, a este propósito, que a Polícia Judiciária registou, no ano de 2000, o seguinte movimento de inquéritos relativos ao crime de branqueamento de capitais: investigados - 67; acusados - 11.
Para fazer face a esta realidade avassaladora, têm aumentado os apelos das instâncias internacionais e comunitárias à solidariedade dos legisladores no sentido da adopção de medidas adequadas à prevenção e repressão de tais actos, sendo, pois, missão de cada Estado controlar e prevenir o fenómeno do branqueamento de capitais.

Conclusões

1 - O projecto de lei sub judice visa proceder à sistematização da legislação dispersa sobre branqueamento de capitais e à transposição, quer da Directiva 2001/97/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Dezembro, quer da Decisão-Quadro n.º 2001/500/JAI do Conselho, de 26 de Junho.
2 -Tendo em atenção a síntese histórica e o enquadramento legal desta matéria, em especial ao nível da legislação comunitária, justifica-se inteiramente uma iniciativa legislativa neste âmbito, ainda mais quando a Directiva 2001/97/CE, fixa até 15 de Junho de 2003 o prazo para a sua transposição.