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2173 | II Série A - Número 048 | 27 de Março de 2004

 

aplicável e dotar a realização de ensaios clínicos de procedimentos mais céleres, nomeadamente no que diz respeito à sua aprovação.
A proposta de lei enuncia na exposição de motivos algumas das soluções adoptadas, todas elas centradas na protecção, directa ou indirecta, do sujeito dos ensaios.
De entre estas, a proposta de lei começa por destacar o primado dos direitos à saúde e à integridade moral e física do participante nos ensaios clínicos e a especial protecção que lhe é dispensada.
O segundo destaque vai para a opção, no que respeita ao parecer de carácter ético e científico obrigatório para a realização de ensaios, por "uma solução-regra que considera competente, em primeira linha, a comissão de ética para a saúde com a qual o investigador tenha uma conexão objectiva e, em segunda linha, uma comissão de ética para a investigação clínica que, para além da coordenação e definição dos requisitos a que as comissões de ética para a saúde devem obedecer, pode ainda emitir o parecer prévio, quando estas não existam ou não reúnam as condições necessárias".
Por último, realça-se a adopção de um adequado regime de responsabilidade civil do promotor e do investigador, com a inversão do ónus da prova até ao termo do terceiro ano seguinte à conclusão do ensaio, e o estabelecimento de um seguro obrigatório de responsabilidade civil.

III - A Directiva 2001/20/CE, do Parlamento e do Conselho, de 4 de Abril de 2001

A exposição de motivos da proposta de lei dá conta, de modo conciso, da preocupação da comunidade internacional, nomeadamente a científica e a médica, sobretudo desde meados do século XX, em testar os medicamentos antes da sua comercialização.
Essa preocupação adquiriu forma quando a Associação Médica Mundial, em 1964, aprovou a Declaração de Helsínquia, o que constitui o primeiro documento no qual as normas de boas práticas clínicas surgem como princípios éticos fundamentais a ter em conta na execução de ensaios clínicos que envolvam a participação de seres humanos. Este documento veio mais tarde a inspirar as normas de boas práticas clínicas adoptadas no quadro da Conferência Internacional de Harmonização.
Com a publicação da Directiva 2001/20/CE, a União Europeia veio dar concretização a estes princípios ao adoptar normas tendentes à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-membros respeitantes à aplicação de boas práticas clínicas na realização dos ensaios clínicos de medicamentos de uso humano, incluindo os ensaios multicêntricos.
Os objectivos declarados da directiva são, pois, a harmonização e a simplificação das disposições administrativas relativas aos ensaios, através do estabelecimento de procedimentos claros e transparentes e da criação de condições propícias à coordenação eficaz dos ensaios clínicos por parte das instâncias nacionais e comunitárias envolvidas.
Esta directiva tem subjacente a salvaguarda dos direitos dos participantes nos ensaios clínicos ao afirmar que os princípios de base reconhecidos para a execução de ensaios clínicos no ser humano assentam na protecção dos direitos do homem e na dignidade do ser humano, no que respeita à aplicação da biologia e da medicina, tal como resultam, designadamente, da versão de 1996 da Declaração de Helsínquia.
Nos termos do seu artigo 22.º, a directiva estabelece que os Estados-membros deveriam aprovar e publicar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à directiva até 1 de Maio de 2003, dando do facto conhecimento à Comissão. Os Estados-membros deveriam aplicar essas disposições, o mais tardar, a partir de 1 de Maio de 2004.

IV - Enquadramento legal vigente e análise sumária da iniciativa do Governo

A realização de ensaios clínicos em seres humanos é regulada em Portugal pelo Decreto-Lei n.º 97/94, de 9 de Abril, pelo que, neste sentido, a proposta de lei não versa matéria inédita.
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 97/94 contém já as linhas gerais a que devem obedecer a realização desses ensaios. Isto é, a garantia da integridade física e psíquica dos participantes (artigo 1.º), a prevalência do bem individual sobre os interesses da ciência e da comunidade (artigo 2.º), a exigência da qualificação científica adequada (artigo 3.º), a realização dos ensaios em instituições autorizadas (artigo 5.º), de acordo com os objectivos, condições de efectivação e faseamento estabelecidos no respectivo protocolo (artigo 6.º), sujeita a autorização prévia (artigo 7.º), bem como a parecer da comissão de ética competente (artigo 8.º), a informação simples, inteligível e leal ao sujeito do ensaio dos riscos, das consequências e dos benefícios previsíveis, bem como dos métodos e objectivos prosseguidos (artigo 9.º), o consentimento livre, esclarecido, expresso e dado por escrito do sujeito do ensaio (artigo 10.º) e a confidencialidade (artigo 11.º).
Do mesmo modo, o Decreto-Lei n.º 97/94 identifica já os vários participantes nos ensaios clínicos, como sejam o promotor (artigo 15.º), o investigador (artigo 16.º), o monitor (artigo 17.º), para além do sujeito do ensaio, das instituições autorizadas e das comissões de ética.
O Decreto-Lei n.º 97/94 prevê ainda um regime contra-ordenacional pela violação das normas, sem prejuízo da responsabilidade civil, penal ou disciplinar (artigo 19.º), assim como estabelece a obrigatoriedade de seguro para a eventualidade da indemnização pelos danos sofridos, independentemente da culpa, pelo sujeito do ensaio clínico (artigo 14.º).
A proposta de lei vem, essencialmente, densificar o regime jurídico vigente, aproximando-o das disposições legislativas, regulamentares e administrativas que terão que vigorar em todos os Estados-membros, por força da transposição da directiva.
Neste contexto, é de realçar o esforço de densificação dos direitos e deveres das partes nos ensaios, expresso no Capítulo II da proposta de lei, com o reforço da cautela na avaliação de riscos e benefícios (artigo 5.º) e nas condições mínimas de protecção dos participantes (artigo 6.º), nomeadamente no caso de se tratar de participantes menores (artigo 7.º) ou de maiores incapazes de darem o seu consentimento livre e esclarecido (artigo 8.º).
O consentimento é obrigatoriamente reduzido a escrito, datado e assinado pelo próprio ou, pelo seu representante legal, se for o caso. Excepcionalmente, se o declarante não estiver em condições de dar o seu consentimento por escrito, este pode ser dado oralmente, na presença de duas testemunhas (alínea n) do artigo 2.º).