2748 | II Série A - Número 067 | 24 de Junho de 2004
objectivamente para os efeitos pretendido e na exacta medida necessária aos exames médico-legais, não podendo haver um acesso sem limite e sem reserva, atento o direito à intimidade privada do examinado e, em especial, à sua informação genética. Aliás, mais correcta seria a epígrafe de "direito de acesso à informação".
Assim, nos casos em que existam elementos que levem a presumir poder a informação clínica conter matéria de natureza particularmente íntima, em especial em processos psiquiátricos e psicológicos, deve o pedido da mesma, sempre que possível, ser acompanhado por um formulário de consentimento esclarecido assinado pelo examinando, no qual este declara ter sido informado dos objectivos pretendidos e autoriza a instituição e os terapeutas a facultarem a referida informação clínica.
Do mesmo modo, carece de esclarecimento o artigo 11.º, que vem permitir o livre trânsito e direito acesso de funcionários envolvidos em investigações periciais às instalações públicas ou privadas onde decorra a investigação, quando devidamente identificados e em missão de serviço.
O artigo aplica-se apenas às "situações de vítimas mortais de crime doloso ou em que exista a suspeita de tal", mas não especifica a que "funcionários" se refere, de que "missão de serviço" se trata ou em que consiste a "investigação pericial" que menciona, e muito menos apresenta razão que justifique o livre trânsito e direito de acesso.
Trata-se de "funcionários" do INML? Estão identificados para todas e quaisquer "investigações periciais" ou apenas para cada caso concreto? O que justifica o livre trânsito e direito de acesso a todas e quaisquer "instalações públicas ou privadas"? E porquê só às situações de vítimas mortais de crime doloso ou em que exista a suspeita de tal?
Também o disposto no artigo 12.º exige clarificação. De acordo com o previsto neste artigo, deve prescindir-se, por princípio, da presença do perito na prestação de esclarecimentos complementares, devendo a autoridade judicial que a solicita usar os meios técnicos processualmente previstos.
O disposto neste artigo tem de ser lido à luz das alterações introduzidas no Código de Processo Civil, nomeadamente, quanto à possibilidade de audição de peritos através de teleconferência, a partir do seu local de trabalho, desonerando-os da deslocação aos tribunais de outra circunscrição judicial.
Não se pretende, como é óbvio, dispensar a presença do perito, mas tão-só a sua presença física sempre que possível, isto é, sempre que os meios técnicos o permitam.
Assim, sugere-se que a redacção do artigo acentue menos a possibilidade de prescindir da presença do perito e mais o modo como deve ser realizada a prestação dos esclarecimentos.
No artigo 13.º, a proposta de lei aponta para uma definição legal de actos urgentes, o que se reconhece como positivo. No entanto, deve ser clarificado o disposto no n.º 6 deste artigo, uma vez que parece apontar para uma situação de mera impossibilidade de contacto do perito médico do serviço de escala, o que não se afigura justificável, atenta a disponibilidade permanente a que está obrigado quem se encontra escalado. Questão diversa é, obviamente, a das situações anómalas, que podem sempre ocorrer, como é o caso de doença ou morte súbita do perito.
De assinalar que a proposta de lei vem suprimir o pagamento de acréscimo salarial, previsto na lei actual, dispondo o n.º 7 deste artigo que o instituto e os médicos contratados "podem cobrar, por cada perícia médico-legal urgente efectuada, os preços previsto em tabela aprovada por portaria do Ministro da Justiça".
Relativamente ao óbito verificado em instituições de saúde (artigo 15.º), a proposta de lei introduz a situação "de suspeita de morte violenta", o que já não surge no óbito verificado fora de instituições de saúde (artigo 16.º), nem é prevista na lei vigente.
É de realçar que a proposta de lei prevê neste artigo, relativo ao óbito verificado em instituições de saúde, que é a autoridade judiciária a enviar "cópia" do boletim de informação clínica, juntamente com o despacho que ordena a realização da autópsia (artigo 15.º, n.º 3), o que também não acontece no caso de óbito verificado fora de instituições de saúde.
As alterações introduzidas nas situações de óbito verificado fora de instituições de saúde (artigo 16.º) são mais profundas, uma vez que a autoridade policial passa apenas a ter o dever de providenciar a comparência do perito médico nos "casos de crime doloso ou em que haja suspeita de tal", o qual procede à verificação do óbito, "se nenhum outro médico tiver comparecido previamente".
A redacção é pouco clara, não permitindo perceber qual a situação em que deve ser chamado o médico perito e o que este verifica. De facto, a leitura da disposição permite também defender que o perito médico apenas é solicitado a comparecer para verificar o óbito, mesmo em caso de crime doloso ou em que haja suspeita de tal, se outro médico não tiver comparecido previamente. Do mesmo modo, não se esclarece que médico é este, e se é perito médico, nem como comparece no local.
Por outro lado, a proposta de lei prevê igualmente que o perito médico proceda ao exame do local e elabore uma informação a enviar à autoridade judiciária. Importa, no entanto, esclarecer que tipo de exame ao local se exige e saber se o perito médico dispõe de conhecimentos técnico-científicos que lhe permitam emitir uma opinião avalizada sobre o assunto. Aliás, afigura-se que a avaliação das características e condições do local devem ser da competência de peritos com conhecimentos técnico-científicos específicos.
Não parece que seja possível exigir ao perito médico que detecte "a presença de vestígios que possam fazer suspeitar de crime". Ao perito médico compete determinar a causa da morte e registar os vestígios encontrados. A valoração destes vestígios terá, obviamente, de pertencer às autoridades policiais ou judiciárias e não ao médico perito.
Ainda quanto aos exames e perícias no âmbito da tanatologia forense, há a salientar a proposta de que a autópsia médico-legal deixe de ser dispensada em situações de morte violenta atribuível a acidentes de trabalho ou acidente de viação dos quais tenha resultado morte imediata (artigo 18.º, n.º 2).
Em sentido contrário, há a realçar a possibilidade de dispensa da autópsia nos casos em que a realização pressupõe o contacto com factores de risco particularmente significativo de comprometer de forma grave as condições de salubridade ou afectar a saúde pública (artigo 18.º, n.º 3), competindo ao presidente do conselho directivo do INML autorizar da dispensa, a qual é comunicada por escrito, e no mais curto prazo, à entidade judiciária competente (n.º 4).