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2749 | II Série A - Número 067 | 24 de Junho de 2004

 

No que diz respeito à realização das autópsias, a proposta de lei vem estabelecer que as mesmas sejam executar por um médico perito coadjuvado por um auxiliar de perícias tanatológicas. No entanto, caso haja fundadas suspeitas de crime doloso, as autópsias que sejam realizadas em comarca não compreendida na área de actuação de delegação do INML ou de gabinete médico-legal em funcionamento, são obrigatoriamente efectuadas por dois médicos peritos, coadjuvados por um auxiliar de perícias tanatológicas (artigo 19.º).
Já quanto à clínica médico-legal, a proposta de lei estabelece que os exames e perícias sejam efectuados por um único médico perito. A primazia dada aos exames singulares decorre do grau de especialização dos médicos peritos e a organização das delegações e gabinetes médico-legais do INML.
Contudo, os exames singulares não se aplicam em casos de agressão sexual, em que os exames "podem ser" realizados, sempre que necessário, por dois médicos peritos ou por um médico perito auxiliado por um profissional de enfermagem, nem "aos exames em que outros normativos legais determinem disposição diferente" (artigo 21.º).
No que respeita ao destino dos objectos e produtos examinados (artigo 25.º), verificam-se também alterações profundas ao regime actual de depósito e destruição das amostras. Com efeito, a proposta de lei vem estabelecer que as amostras ficam em depósito durante o período de dois anos, após o qual o serviço médico-legal pode proceder à sua destruição, salvo se, entretanto, o tribunal tiver comunicado em contrário.
Na lei vigente, a amostra fica depositada até à decisão final do processo (artigo 48.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 11/98) e é o tribunal que ordena a destruição da amostra (artigo 48.º, n.º 3).
A alteração proposta suscita algumas questões. A primeira prende-se com a inversão da entidade que determina a destruição das amostras; a segunda, com o prazo.
Quanto à primeira questão, parece desadequado que seja uma entidade exterior ao processo - portanto, sem conhecimento da relevância das amostras para a questão sub judice - a decidir sobre o seu destino.
Por outro lado, não se especifica o teor da comunicação do tribunal. Isto é, pode o tribunal determinar que as amostras se mantenham em depósito até à decisão final do processo ou pode apenas determinar esse depósito por um outro período, livremente fixado, ou por um novo período de dois anos, sucessivamente renovado de dois em dois anos?
Nada sendo fixado, é manifesto que os tribunais, à cautela, irão determinar que as amostras se mantenham em depósito até à decisão final do processo.
De qualquer maneira, o prazo de dois anos parece notoriamente curto, atento os prazos de duração dos processos judiciais.
A proposta de lei vem também, neste artigo, eliminar a obrigatoriedade de ser lavrado auto, a enviar no prazo de cinco dias tribunal competente, que relate as operações de recolha, acondicionamento e selagem das amostras e de destruição do remanescente.
Por último, refira-se que a proposta de lei vem permitir ao Laboratório de Polícia Científica proceder ao transporte e conservação das amostras relativas aos crimes da competência reservada de investigação da Polícia Judiciária (artigo 25.º, n.º 3).
Esta norma vem, contudo, levantar a questão de saber se não se está a abrir a porta para se criar uma base de dados, nomeadamente genéticos, no Laboratório de Polícia Científica.
Por fim, é de referir que a delicadeza e a importância da matéria tratada na proposta de lei aconselham a que a mesma venha a ser objecto de um amplo debate e a beneficiar de audições com todas as partes envolvidas, a realizar no decurso da discussão em sede de especialidade.
A proposta de lei menciona já a necessidade de audição do Conselho Nacional de Medicina Legal, da Ordem dos Médicos e das associações sindicais representativas do sector. Contudo, a matéria justifica também a audição do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Finalmente, afigura-se que as alterações pretendidas pela aprovação da proposta de lei não se compadecem com uma entrada em vigor no dia seguinte ao da publicação, antes exigindo um período de vacatio legis. Por outro lado, deve ser prevista e acautelada a situação das perícias médico-legais em curso.

IV. Conclusões
1 - O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 127/IX - Estabelece o regime jurídico das perícias médico-legais e forenses.
2 - A apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição e do artigo 131.º do Regimento, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento;
3 - A proposta de lei visa introduzir alterações e aperfeiçoamentos ao regime das perícias médico-legais e forenses, susceptíveis de proporcionarem uma maior operacionalidade e flexibilidade ao sistema, aproveitando-se, simultaneamente, para corrigir as fragilidades entretanto constatadas no regime em vigor e para melhor explicitar as regras que orientam algumas delas, nomeadamente na sequência de progressiva instalação de gabinetes médico-legais entretanto verificada;
4 - A proposta de lei agora apresentada pelo Governo vem, essencialmente, autonomizar e densificar o regime jurídico das perícias médico-legais em diploma próprio;
5 - Devem ser ouvidos o Conselho Nacional de Medicina Legal, a Ordem dos Médicos, o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e a Comissão Nacional de Protecção de Dados, para além das associações sindicais representativas do sector.

V. Parecer
Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte parecer:

Que a proposta de lei n.º 127/IX em análise encontra-se em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.

Assembleia da República, 23 de Junho de 2004. - A Deputada Relatora, Maria de Belém Roseira - O Vice-Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.

Nota: O relatório foi aprovado por unanimidade, estando ausente o CDS-PP e o BE.