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0013 | II Série A - Número 005 | 06 de Outubro de 2006

 

PROJECTO DE LEI N.º 317/X
DESPENALIZAÇÃO DA INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ

Exposição de motivos

As condicionantes legais e formais

A interrupção voluntária da gravidez tem sido objecto de diversos debates nos últimos anos, quase sempre suscitados em torno dos diversos julgamentos de mulheres acusadas da prática de crimes de aborto. Maia, Aveiro, Setúbal e Lisboa são algumas das cidades que assistiram nos últimos anos àquilo que os movimentos antiescolha diziam em 1998 ser impossível - mulheres em tribunal acusadas da prática de aborto.
A decisão do Tribunal da Relação sobre a sentença do julgamento de Aveiro, dando provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e condenando três mulheres que tinham sido absolvidas, é mais uma confirmação dos efeitos da actual lei, que apenas tem um efeito - penalizar as mulheres que realizam um aborto. O reabrir deste processo, cujos factos reportam há 10 anos, é um exemplo eloquente do conservadorismo de uma lei que isola Portugal em relação aos países democráticos e civilizados.

As razões substanciais para alterar a actual legislação portuguesa

Na opinião dos proponentes deste projecto de lei é preciso alterar a lei actual. A correcção da violência que constitui o actual quadro legal é um imperativo de democracia: o aborto clandestino e inseguro constitui uma violência sobre as mulheres, e essa situação é agravada pela ameaça ou pela efectiva penalização criminal das mulheres que abortam, como ficou patente no julgamento da Maia, em que 17 mulheres foram submetidas a um julgamento pela acusação de terem praticado aborto clandestino e nos julgamentos que se seguiram em Aveiro (sete mulheres), em Setúbal (três mulheres) e em Lisboa (uma mulher).
O estudo dos investigadores Henrique Barros, do Serviço de Higiene e Epidemiologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, e Teresa Correia, da Escola de Enfermagem do Instituto Politécnico de Bragança, realizado nas escolas secundárias das capitais de distrito (excepto Leiria e Guarda) e que envolveu perto de 7000 adolescentes, demonstra uma realidade chocante. De acordo com esse estudo, uma em cada 200 jovens portuguesas entre os 15 e os 19 anos já abortou, e esse número torna-se ainda mais significativo no caso das jovens com 19 anos, em que uma em cada 50 admite já ter realizado um aborto.
Segundo as conclusões do fórum organizado pela Plataforma Direito de Optar, realizado em 28 de Junho de 1999, estima-se que apenas 1 a 2% dos abortos realizados em Portugal são feitos ao abrigo da actual legislação, pelo que a margem de insegurança e ilegalidade em que se enquadram 98% dos casos de aborto não pode deixar de pesar sobre a premência de alterar a Lei n.º 4/84. No mesmo fórum foi constatada a situação de cerca de 9000 mulheres portuguesas terem abortado em clínicas espanholas nos últimos seis anos. Outros estudos posteriores indicam que a incidência de aborto clandestino entre as mulheres portuguesas, e particularmente entre as adolescentes, é extremamente alargada e constitui, portanto, um problema de primeira grandeza.
Constata-se igualmente que muitas mulheres portuguesas viajam até ao país mais próximo, cuja legislação tem algumas semelhanças com a nossa, mas onde há uma interpretação tolerante e aberta que permite efectivamente à mulher proceder à interrupção voluntária da gravidez. Em Espanha, de acordo com o Ministério da Saúde espanhol, as interrupções voluntárias da gravidez legais passaram de 45 503 em 1993 para 77 125, em 2002. A 13 de Janeiro de 2002 publicava o Diário de Notícias um artigo que fazia um levantamento da situação do aborto clandestino realizado em Espanha por portuguesas:

"O número é astronómico e excede todas as expectativas. O Diário de Notícias pode garantir que são milhares as portuguesas que anualmente vão abortar a Espanha. Em contacto telefónico com apenas 19 das cerca de 60 clínicas privadas que praticam a interrupção voluntária da gravidez (IVG) contabilizámos 3200 mulheres que se deslocam todos os anos ao país vizinho, fugindo à rigidez da nossa lei. Se fosse possível obter dados de todos os centros privados que fazem 98% dos abortos no país vizinho, o valor subiria muitíssimo. Até porque, admite ao Diário de Notícias Eva Rodriguez, presidente da ACAI, associação que engloba metade destas clínicas privadas, os números fornecidos são todos abaixo do real, pela grande competitividade económica."

Confessa que se a lei portuguesa mudasse "seria desastroso". Os abortos mais baratos custam 300 e os mais caros 1500 euros (60 a 300 contos), o que dá a ideia da rentabilidade do negócio. A "migração" ibérica começou a sério há uns cinco anos, mas desde 1999 triplicou o número de portuguesas atendidas por nuestros hermanos (…). Basta ir à Internet para obter informações em português, com preços e hotéis, ou consultar os poucos jornais portugueses que aceitam esta publicidade. (…) Abortar em Espanha? Os políticos portugueses preferem adoptar a táctica da avestruz (…). A resposta para estes números podemos encontrá-la no mesmo jornal: "Abortar em Portugal não é fácil. Até mesmo pela via legal. Se há hospitais que resolvem o problema em duas ou três semanas, outros levam um mês e mais. As razões são várias: poucas reuniões das