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41 | II Série A - Número: 013 | 9 de Outubro de 2010

A comparação desta parte do projecto em apreço com as leis sobre declarações antecipadas de vontade de Países como a Espanha, a Inglaterra e País de Gales, a Hungria, a Bélgica, a Holanda, a Finlândia e a Áustria, demonstra que o disposto nos artigos 14.º e 15.º é extremamente insuficiente para dar satisfação às grandes questões éticas subjacentes a tais declarações.
Atente-se por exemplo, ao n.º 5 sobre a eficácia vinculativa da declaração, cuja formulação é de tal forma imprecisa que trai irremediavelmente o objectivo que se propõe. É para nós incompreensível que se omita neste processo o papel da família. Vale a pena chamar a atenção para o facto de que o projecto ignora que, como observa Peter Singer, as pessoas cujos direitos se pretendem salvaguardar, estão integradas numa comunidade moral, o que contribui para a construção da sua identidade, das suas convicções e dos seus juízos de valor.
Importa igualmente realçar que a declaração antecipada não se refere exclusivamente à negação dos cuidados a serem prestados, mas também, como é aliás referido, diz respeito a cuidados que desejam que lhes sejam administrados. Quanto a estes, haverá certamente situações em que a vontade expressa pelo doente pode não fazer qualquer sentido, não só no contexto puramente técnico, mas igualmente numa perspectiva social ou até moral.
Os comentários que este projecto e o tema em si têm suscitado, parecem sugerir que a necessidade de legislar sobre esta matéria decorre da necessidade de conter aquilo que uma designação desgraçada chama de encarniçamento terapêutico‖. A relevància real desta prática ç difícil de determinar, mas a observação de clínicos experimentados é que, se existe é, certamente, vestigial. O que existe, na realidade, é controvérsia em relação ao uso de meios terapêuticos cujo benefício parece desproporcionado em relação à qualidade antecipável de vida ou à expectativa de sobrevivência e esta é matéria que, mais do que com a regulação jurídica, se prende com a avaliação rigorosa da evidência científica temperada pela consideração dos valores superiores ou pelo bem pessoal dos doentes. Nunca a boa prática médica foi modelada pelo normativo legal, mas sim pela educação, pelo rigor na avaliação científica e pela reflexão moral, que são os ingredientes próprios da medicina na sua vertente de epistemologia moral — epistemologia porque baseada no conhecimento, moral porque baseada em valores.
Nesse sentido, os ―limites da eficácia da declaração antecipada‖ consignados no artigo 15.º, introduzindo o conceito juridicamente complexo como o de ordem pública e cuja difícil concretização não pode nem deve ser exigível a um médico, não ajudam a esclarecer situações dilemáticas que estão no cerne de decisões moralmente tão difíceis.
Não sendo possível, em tempo tão limitado, propor os vários Artigos que teriam de ser acrescentados ao texto para que ficasse rigoroso e coerente tudo o que deve ser estabelecido no articulado, a proposta mais prudente e construtiva é a de retirar a Secção IV deste projecto e elaborar, no futuro, uma boa lei tratando exclusivamente das decisões antecipadas, cuja importância e necessidade não é de mais encarecer e salientar.
Este foi o caminho seguido na Alemanha, onde a lei, recentemente aprovada, foi precedida de demorados debates públicos e parlamentares e de intervenções de múltiplas organizações da Sociedade Civil. E, mesmo assim, as maiorias obtidas no Parlamento alemão foram sempre escassas, o que mostra a dificuldade de gerar consensos e o cuidado que deve ser tido para que uma maioria, sempre transitória, não violente os fundamentos éticos das posições minoritárias.

Como se referiu, e sem prejuízo de ulteriores considerações, a expender em sede de ‗opinião do relator‘, as considerações oportunamente produzidas pelo CNECV, designadamente as transcritas supra, sobre a pretérita iniciativa legislativa do Grupo Parlamentar do Partido Socialista continuam a afigurar-se de elevada oportunidade, já que aquela iniciativa redundou, de um modo geral, plasmada no Projecto de Lei n.º 413/XI (2.ª), ora em apreciação.

ii) Projecto de Lei n.º 414/XI (BE) Através do Projecto de Lei n.º 414/XI (2.ª), pretende o Bloco de Esquerda regular ―o direito dos cidadãos a decidirem sobre a prestação futura de cuidados de saúde, em caso de incapacidade de exprimirem a sua