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II SÉRIE-A — NÚMERO 135 10

PROJETO DE LEI N.º 962/XII (4.ª)

REFORÇA AS OBRIGAÇÕES DE SUPERVISÃO PELO BANCO DE PORTUGAL E A TRANSPARÊNCIA

NA REALIZAÇÃO DE AUDITORIAS A INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS

(TRIGÉSIMA SEXTA ALTERAÇÃO AO REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E

SOCIEDADES FINANCEIRAS)

Exposição de motivos

O papel das empresas de auditoria externa tem sido questionado, particularmente após o colapso de grandes

gigantes bancários e sociedades financeiras. Em praticamente todos os casos de destruição de bancos de

grandes dimensões há um elemento comum: a avalização das contas por parte dos Revisores Oficiais de Contas

– empresas de auditoria externa – com poucos ou mesmo sem ênfases e reservas. O caso do BES e do GES é

paradigmático e ilustra perfeitamente qual foi o papel destas empresas ao longo dos tempos.

Tal como o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português denunciou ao longo dos trabalhos da

Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do GES, os problemas internos do Banco e do Grupo,

bem como a promiscuidade entre a empresa holding de topo e a ES Resources (empresa do ramo não financeiro

que viria depois a originar a Rio Forte), o BES e suas sucursais estrangeiras estavam desde há muito tempo

identificados por intervenções de auditores externos. Essa informação, contudo, não foi disponibilizada ao Banco

de Portugal, nem à CMVM, ao longo de mais de uma década.

Quando o PCP requereu o relatório de auditoria ao BES realizado pela Price-Waterhouse-Coopers no ano

de 2001, junto da Comissão de Inquérito, fê-lo por saber que esse relatório referia boa parte dos problemas que

vieram a desenvolver-se e a agravar-se até que o BES fosse consumido pelos seus próprios métodos, exaurido

pela especulação e pela atribuição de crédito sem avaliação de risco a empresas do próprio Grupo.

Há dois factos que relevam para a justificação de motivos deste Projeto de Lei apresentado agora pelo Grupo

Parlamentar do PCP: i) a PWC não disponibilizou tal relatório, depois alegando desconhecer a sua existência;

ii) a PWC nunca comunicou, apesar de estar obrigada por lei, ao Banco de Portugal, as irregularidades

processuais na concessão de crédito verificadas no BES.

Só quando a existência do relatório foi divulgada na comunicação social, apesar de o PCP ter invocado o

seu conteúdo vezes sem conta, a PWC se lembrou de que talvez existisse guardado em formato papel nos seus

arquivos. Só nessa altura, a PWC disponibiliza à comissão de inquérito o referido relatório.

Importa ainda acrescentar que, apesar de identificados pela PWC vários aspetos que mereceram reparo no

relatório de 2001 – reparos apenas relatados à administração do BES e nunca comunicados ao Banco de

Portugal e mais tarde retirados da versão final do Relatório – tais ou semelhantes problemas nunca vieram

depois, ao longo de 13 anos, a ser detetados ou apontados pela KPMG. Resumindo: a PWC detetou os

problemas e comunicou ao BES mas não ao supervisor, depois passou a auditora do ramo não financeiro do

GES, cujos problemas conhecia por saber que o BES atribuía crédito a essas empresas sem avaliação de risco

e sem garantias. Contudo, aprovou sempre os relatórios e contas dos exercícios auditados. Ao mesmo tempo,

a KPMG assume a auditoria do ramo financeiro e diz não ter sido alertada para problemas pela PWC. Ao longo

de 13 anos nunca deteta os problemas – pelo menos não os aponta – apesar de a PWC ser a auditora do ramo

não financeiro, cujas contas vieram a impor o default por acumulação de dívida, rendas e juros, principalmente

junto precisamente do BES. É uma teia urdida com mestria para fazer parecer credível o que na verdade é uma

gigantesca máquina de apropriação de recursos e de agiotagem sobre o trabalho e a produção.

Há outros elementos que devem convocar uma séria reflexão sobre o papel e as normas que regem o

funcionamento das auditoras externas: i) as auditoras estão obrigadas a passar a informação a outras que

venham a desempenhar o papel de revisor oficial de contas, findo o serviço das primeiras (a PWC diz que

informou a KPMG, a KPMG diz que nada lhe foi dito e que o BES até foi recomendado como cliente); ii) as

auditoras devem ser agentes de fiscalização externa dos exercícios e das práticas das instituições financeiras,

contudo, aquilo que se verifica na realidade é que essas empresas funcionam como agências de formação e

reservatórios de quadros para a própria banca, além de funcionarem, não como fiscais externos, mas como

consultores dos bancos.