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11 DE DEZEMBRO DE 2019

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Nesse sentido, e em cumprimento do disposto na Constituição da República Portuguesa, na Convenção

sobre os Direitos da Criança e na Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência

contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de Istambul), o projeto propõe incluir na categoria de

«vítima especialmente vulnerável» as crianças que vivam nesse contexto de violência doméstica ou o

testemunhem1, contribuindo dessa forma para a proteção das crianças e para que todas as vítimas tenham uma

resposta adequada2.

A par do reconhecimento legal expresso das crianças enquanto vítimas nessas situações de violência,

propõe-se a alteração do tipo legal contido no artigo 152.º do Código Penal3, prevendo no tipo objetivo do crime

de violência doméstica as condutas que impliquem as crianças que vivenciam esse contexto no seio da família

que integram ou quando sejam testemunhas presenciais dessa mesma realidade, elevando a proteção do menor

exposto a essas situações mediante a autonomização do valor jurídico que deve ser atribuído ao seu

desenvolvimento saudável.

Em suma, e nas palavras do proponente, «o caráter inovador deste projeto de lei é a garantia de que as

crianças são sempre consideradas vítimas, mesmo quando não são o alvo direto da violência doméstica».

A iniciativa legislativa compõe-se de quatro artigos preambulares: o primeiro definidor do respetivo objeto; o

segundo e terceiro prevendo respetivamente a alteração do artigo 2.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro,

e do artigo 152.º do Código Penal; e o quarto determinando que o início de vigência das normas a aprovar

ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação.

 Enquadramento jurídico nacional

O artigo 69.º da Constituição prevê o direito das crianças «à proteção da sociedade e do Estado, com vista

ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de

opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições.».

Consagra-se nesteartigo «um direito das crianças à proteção, impondo-se os correlativos deveres de

prestação ou de atividade ao Estado e à sociedade (i. é, aos cidadãos e às instituições sociais). Trata-se de um

típico «direito social», que envolve deveres de legislação e de ação administrativa para a sua realização e

concretização, mas que supõe, naturalmente, um direito negativo das crianças a não serem abandonadas,

discriminadas ou oprimidas (…).»4.

A Convenção sobre os Direitos da Criança5 prevê que «os Estados parte tomam todas as medidas

legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à proteção da criança contra todas as formas de

violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração,

incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos

representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada.».

Partindo do reconhecimento de que «as crianças são vítimas de violência doméstica, designadamente como

testemunhas de violência na família», a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à

Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de Istambul)6 foca em vários pontos a questão

da proteção destas crianças. Prevê, designadamente, que os Estados Parte adotem medidas legislativas ou

outras necessárias para assegurar que, ao oferecer serviços de proteção e apoio às vítimas, os direitos e as

necessidades das crianças testemunhas de todas as formas de violência cobertas pelo âmbito de aplicação da

1 Já no Projeto de Lei n.º 1183/XIII/4.ª, apresentado na anterior legislatura (e que foi rejeitado), o BE propunha a alteração, nos mesmos termos, do artigo 2.º da Lei n.º 112/2009, entre outros. 2 Cumpre-se assim, igualmente, a Recomendação n.º 219 do GREVIO, quando insta as autoridades portuguesas a «tomarem medidas, incluindo alterações legislativas, por forma a garantir a disponibilidade e a eficaz aplicação das ordens de restrição e/ou de proteção relativas a todas as formas de violência» e ainda que «deve ser possível a inclusão das crianças na mesma ordem de proteção das suas mães, sejam as crianças vítimas diretas ou indiretas, já que elas mesmas experienciam a violência na própria pele ou a testemunham». 3 Aceitando o contributo da Procuradoria-Geral da República, que, no seu parecer ao Projeto de Lei n.º 1183/XIII/4.ª (BE), sugeriu a alteração ao artigo 152.º, explicitando que «nos termos em que o crime de violência doméstica está atualmente construído, o conteúdo da alínea a) do n.º 2 é, claramente, um sinal contrário ao reconhecimento e consagração da criança como vítima autónoma, diferenciada (...).». 4 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 2007, p. 869. 5 Assinada em Nova Iorque a 26 de janeiro de 1990, foi aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/90 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 49/90, ambos de 12 de setembro; retificada pela Retificação n.º 1/91, de 14 de janeiro, e pela Retificação n.º 8/91, de 20 de março, e alterada pela Resolução n.º 50/155 da Assembleia Geral das Nações Unidas (altera o n.º 2 do artigo 43.º da convenção), de 21 de dezembro de 1995, aprovada através da Resolução da Assembleia da República n.º 12/98, de 22 de janeiro. 6 Adotada em Istambul, a 11 de maio de 2011, foi aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 13/2013, de 21 de janeiro.