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25 DE JANEIRO DE 2020

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PROJETO DE LEI N.º 183/XIV/1.ª

REFORÇA O REGIME SANCIONATÓRIO APLICÁVEL AOS ANIMAIS DE COMPANHIA E ALARGA A

PROTEÇÃO AOS ANIMAIS SENCIENTES VERTEBRADOS (ALTERA O CÓDIGO PENAL)

Exposição de motivos

I – Enquadramento prévio

«O verdadeiro teste moral da humanidade – o mais radical, num nível tão profundo que escapa ao nosso

olhar – são as relações com aqueles que estão à nossa mercê: os animais. É aí que se produz o maior desvio

do homem, derrota fundamental da qual decorrem todas as outras.» – Milan Kundera1.

Volvidos mais de cincos anos desde a entrada em vigor da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, que criminalizou

os maus tratos e o abandono dos animais de companhia, e com respaldo na doutrina e jurisprudência que se

tem vindo a consolidar sobre esta matéria, ainda que esta última, em menor escala, urge revisitar este regime

com vista ao reforço da proteção dos animais de companhia, o que passa pela necessária clarificação do tipo

penal ou conceitos aí estabelecidos.

Apesar do elevado número de denúncias que ao longo destes anos foram apresentadas – enfatizamos a

progressiva subida do número de participações relativas a este tipo crimes, sendo que segundo os dados do

RASI 2018 foram efetivadas 1276 denúncias por maus tratos a animais de companhia e 701 por abandono de

animais de companhia, num total de 1977 participações.

A par dos crimes contra animais, foram ainda efetuadas 23 020 ações de fiscalização, que resultaram na

elaboração de 14 276 autos de notícia por contraordenação.

Do supraexposto, ilaciona-se que, muito por força das lacunas que resultam do presente regime penal (e

também do regime contraordenacional) ou da dificuldade de interpretação de conceitos, a maioria dos inquéritos

tem merecido o mero arquivamento, situação que até aqui não foi possível ultrapassar por força da rejeição dos

projetos de lei apresentados na passada Legislatura – destacamos, a título de exemplo, o Projeto de Lei n.º

173/XIII/1.ª, o qual pretendia reforçar o regime sancionatório aplicável aos animais por via de alterações ao

Código Penal (doravante denominado CP) e o Projeto de Lei n.º 724/XIII/3.ª, o qual almejava alterar o Código

Penal e de Processo Penal (tratado como CPP) no que diz respeito ao crime de maus-tratos a animais e artigos

conexos.

Não menos despiciente é a necessidade de alterar o direito adjetivo em função do direito substantivo já

existente nesta sede, conforme referiu anteriormente o Conselho Superior do Ministério Público, porquanto, as

omissões adjetivas que persistem na redação atual dos crimes contra animais de companhia têm dificultado a

tarefa das autoridades fiscalizadoras e bem assim como dos aplicadores do direito na identificação dos atos

processuais legalmente previstos com aqueles que se mostram efetivamente necessários para a intervenção no

âmbito dos crimes contra animais e a própria aplicação da justiça nos casos concretos da prática destes crimes.

Tal conjuntura tem gerado ampla incompreensão social, porquanto a letra da lei não se encontra ajustada ao

sentimento de injustiça de uma sociedade mais mobilizada e desperta para combater os numerosos crimes

cometidos contra animais.

Veja-se o crime de abandono e a solução adotada pelo legislador que, dada a natureza de perigo concreto

que o mesmo assume, tem levado a uma aplicação meramente residual e que não se coaduna com um dos

princípios basilares do direito penal: o da prevenção.

Os casos de extrema crueldade profusamente difundidos na comunicação social têm gerado elevada

consternação social, como é o caso da cadela Roxi, que foi morta e esquartejada pelo ex-companheiro da sua

detentora, e sublinham a importância de não se menosprezar a violência exercida contra animais, sendo

evidente a ligação desta com a violência exercida contra pessoas.

Ora, como demonstram diferentes estudos realizados por sociólogos, psicólogos e criminologistas nos

últimos 25 anos, os agressores no âmbito da crueldade animal, cometem amiúde violência contra humanos –

traz-se à colação o estudo realizado pela Northeastern University e Massachusetts SPCA, em 1997, o qual

demonstrou que quase 40% dos perpetradores de crimes contra animais, cometeu concomitante ou

1 Passagem do aclamado livro «A Sustentável Leveza do Ser».