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II SÉRIE-A — NÚMERO 83

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Recorde-se que a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas (APMJ) já defendeu esta proposta, em

parecer datado de 27 de maio de 20192.

Neste parecer, a APMJ considera que, face à natureza do bem jurídico em causa, ou seja, a liberdade

sexual, se impunha, sem qualquer margem para dúvidas ou tibiezas, atribuir natureza pública a todas as

incriminações constantes da Secção I do Capítulo V do Código Penal.

A APMJ, citando a Professora Teresa Pizzaro Beleza, relativamente ao crime de violação em concreto,

defende que este «simboliza a violência, a imposição brutal, o domínio terrorista do homem sobre a mulher» e,

como tal é, no âmbito dos crimes contra a liberdade sexual, aquele que mais gravosamente afeta o bem

jurídico que se pretende proteger e tutelar.

Assim, conclui a APMJ que, face às garantias constitucionais de proteção de liberdade e segurança

individual, se impõe que o Estado assuma verdadeiramente o jus puniendi quanto a estes crimes e,

consequentemente, não remeta para a esfera da liberdade individual a decisão da sua prossecução penal.

De facto, a especial vulnerabilidade das vítimas e o impacto que este tipo de crimes tem pode muitas vezes

fazer com que estas não denunciem a sua prática, até porque, dispondo apenas de seis meses para

apresentar queixa, podem não se sentir capazes de o fazer naquele período. Depois, existem situações em

que, nomeadamente através das redes sociais, outras pessoas tomam conhecimento da prática deste crime,

devendo estas ter, igualmente, a possibilidade de o denunciar, o que retira da vítima o peso de ter de ser ela a

fazê-lo.

Em consequência, atribuir a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação

sexual constitui uma forma adequada de combater o aumento exponencial deste tipo de criminalidade, o qual

é bem visível nos Relatórios Anuais de Segurança Interna.

Importa mencionar ainda que a atribuição de natureza pública aos crimes contra a liberdade sexual

pretende dar cumprimento ao disposto no artigo 27.º da Convenção de Istambul3, ratificada pelo Estado

português, em vigor desde 1 de agosto de 2014, que refere que «As Partes deverão adoptar as medidas que

se revelem necessárias para encorajar qualquer pessoa que testemunhe a prática de actos de violência

abrangidos pelo âmbito de aplicação da presente Convenção, ou que tenha motivos razoáveis para crer que

tal acto possa ser praticado ou que seja de prever a prática de novos actos de violência, a comunicá-los às

organizações ou autoridades competentes».

Por último, recordamos que relativamente ao crime de violência doméstica também, no passado, existiram

resistências em enquadrar este crime como público, pois considerava-se que deveria ser a vítima a ter impulso

processual. No entanto, a experiência veio demonstrar os benefícios da qualificação deste crime como público,

sendo agora consensual que esta foi a melhor opção a tomar.

Face ao exposto, com o presente projeto de lei, propomos uma alteração ao artigo 178.º do Código Penal,

atribuindo natureza pública aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, previstos no Capítulo V.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, que aprova o Código Penal,

com o objetivo de atribuir a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação

sexual, constantes do Capítulo V do Código Penal.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março

É alterado o artigo 178.º do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, que aprova o Código Penal, alterado

pela Lei n.º 90/97, de 30 de julho, Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, Lei n.º 7/2000, de 27 de maio, Lei n.º

77/2001, de 13 de julho, Lei n.º 97/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 98/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 99/2001,

2 Pode ser consultado em doc.pdf (parlamento.pt)

3 Pode ser consultada em Convenção de Istambul entra em vigor dia 1 de agosto de 2014 – CIG