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19 DE MARÇO DE 2021

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duração do trabalho é fundamental. Curiosamente, o Código do Trabalho parece estabelecer uma sobreposição

– do nosso ponto de vista equívoca e perigosa – entre a figura da «isenção de horário», regulada pelo artigo

218.º, e o teletrabalho, ao referir que aquela se aplica a quem esteja a prestar atividade neste regime.

No ordenamento jurídico português, o teletrabalho é já regulado e disciplinado pelo Código do Trabalho. O

Acordo Europeu sobre o Teletrabalho, que data de 2002, estabelece múltiplas disposições, transpostas para a

lei portuguesa a partir de 2003. Entre essas disposições europeias destacam-se: a atribuição aos

teletrabalhadores de proteção semelhante à dos trabalhadores que exercem a sua atividade nas instalações do

empregador; a regulamentação das suas condições de trabalho, saúde e segurança, formação e direitos

coletivos; o carácter voluntário do teletrabalho (que deve ser uma escolha não apenas do empregador mas,

principalmente, do trabalhador); e o princípio da reversibilidade (que significa que a opção pela prestação em

teletrabalho deve poder ser reavaliada, permitindo-se ao trabalhador recuar e voltar a trabalhar nas instalações

da empresa).

Atualmente, o regime jurídico do contrato de trabalho subordinado à distância encontra-se regulado pelos

artigos 165.º e seguintes do Código do Trabalho. Na nossa lei, o teletrabalho implica a combinação de um

elemento geográfico (o trabalho é realizado à distância) e de um elemento tecnológico (o recurso a tecnologias

de informação e de comunicação). Assim, distingue-se o teletrabalho do mero trabalho no domicílio. De resto, o

teletrabalho pode desenvolver-se no domicílio do teletrabalhador, mas também em centros satélite,

comunitários, numa modalidade móvel ou «nómada», não tendo necessariamente de ser executado em casa.

O que o distingue é ser feito fora das instalações da empresa e mediante o recurso a tecnologias de informação

e de comunicação.

No plano das relações individuais de trabalho, a legislação portuguesa prevê que o «trabalhador em regime

de teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores» (formação e promoção ou carreira

profissional, limites do período normal de trabalho, segurança e saúde no trabalho, reparação de danos

emergentes de acidente ou doença profissional, etc.). Além disso, para evitar o seu isolamento, prevêem-se

contactos regulares do teletrabalhador com a empresa e com os demais trabalhadores. A lei estabelece, ainda,

que cabe ao empregador facultar os instrumentos de trabalho e assumir as despesas relacionadas com a sua

manutenção, cabendo ao trabalhador o dever de acautelar a sua conservação.

Todavia, têm surgido muitos problemas quer na aplicação efetiva das normas existentes, quer na

interpretação sobre o alcance de algumas delas. Numa fase inicial da pandemia, foram suscitadas dúvidas sobre

o pagamento do subsídio de alimentação quando o trabalhador se encontra a trabalhar em casa, o que motivou

um esclarecimento do Governo, e continua ainda hoje a não ser garantido o pagamento, pelo empregador, dos

custos fixos decorrentes do teletrabalho. Têm sido discutidas múltiplas interpretações sobre o que deve

entender-se por «instrumentos de trabalho» (um computador, seguramente é-o; mas uma secretária e uma

cadeira, por exemplo, não devem também ser incluídos neste conceito?). Surgiram casos flagrantes de violação

dos direitos dos trabalhadores através da instalação, nos instrumentos de trabalho (computadores e telemóveis),

de programas informáticos que permitem a reprodução total do que o trabalhador executou no terminal ou a

gravação de reuniões com o ambiente do seu domicílio, o que aliás motivou pronunciamentos da Comissão

Nacional de Proteção de Dados. Está muito longe de se encontrar resolvido o problema suscitado pelo abuso

nos horários de trabalho, proporcionado pela «teledisponibilidade» permanente que, sendo até contrária às

disposições gerais da lei relativas ao tempo de descanso, acaba por ser uma realidade na prática, sem que

tenha surgido um sinal suficientemente inequívoco do legislador para reprimir a conexão abusiva por parte das

empresas. Têm surgido também problemas ao nível do regime de acidentes de trabalho, com casos em que as

companhias de seguros rejeitam a extensão do seguro aos acidentes ocorridos no espaço doméstico, mesmo

em horário de trabalho.

Por outro lado, o Estado português terá de transpor, até agosto de 2022, a Diretiva (EU) 2019/1158 do

Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, que se refere a regimes de trabalho a distância,

incluindo o teletrabalho, estabelecendo que «os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para

garantir que os trabalhadores, com filhos até uma determinada idade, de pelo menos oito anos, e os cuidadores

tenham o direito de solicitar regimes de trabalho flexíveis» e que «os empregadores devem tomar em

consideração e atender esses pedidos de regimes de trabalho flexíveis num prazo razoável» e que «o

trabalhador deve também ter o direito de solicitar o regresso ao ritmo de trabalho original antes do termo do

período acordado, sempre que uma alteração das circunstâncias o justificar».

O Bloco de Esquerda entende que, neste contexto, é preciso dar um impulso legislativo capaz de proteger