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II SÉRIE-A — NÚMERO 120

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III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), ao abrigo e

nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da

República16 (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por

força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento,

bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição

e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.

A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do

Regimento. Encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu

objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no

n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

A iniciativa suscita, porém, algumas dúvidas sobre o cumprimento do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo

120.º do Regimento, que estabelece que «não são admitidos projetos e propostas de lei ou propostas de

alteração que infrinjam a Constituição ou os princípios nela consignados».

Assinala-se, a este respeito, o artigo 2.º da iniciativa, que determina que «no prazo de 30 dias, o Governo

inicia negociação com as estruturas sindicais para a revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal

docente dos ensinos básico e secundário (…)». Tal disposição, parece consubstanciar uma injunção dirigida ao

Governo, de caráter juridicamente vinculativo e poderá suscitar dúvidas relativamente ao respeito pelo princípio

da separação de poderes, subjacente ao princípio do Estado de direito democrático e previsto nos artigos 2.º e

111.º da Constituição.

Com efeito, o início de um processo negocial com as estruturas sindicais parece ser um ato de natureza

administrativa que envolve uma margem de discricionariedade ou um juízo de oportunidade por parte do órgão

de soberania que o pratica. A fixação de um prazo vinculativo para aquele efeito poderá, assim, ser suscetível

de interferir com a autonomia do Governo no exercício da sua competência administrativa (artigo 199.º da

Constituição).

Neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira17 escrevem que «as relações do Governo com a Assembleia

da República são relações de autonomia e de prestação de contas e de responsabilidade; não são relações de

subordinação hierárquica ou de superintendência, pelo que não pode o Governo ser vinculado a exercer o seu

poder regulamentar (ou legislativo) por instruções ou injunções da Assembleia da República».

Sobre questão semelhante à colocada pela presente iniciativa incidiu o Acórdão do Tribunal Constitucional

n.º 214/201118, onde se refere que «o início de um procedimento negocial é matéria de natureza administrativa

uma vez que envolve juízos de mérito e de oportunidade. Admitir-se-ia, em tese, a previsão legislativa de um

prazo para a aprovação do quadro regulamentar. Já mais duvidosa é a imposição de um prazo para dar início e

concluir os mecanismos negociais sobre os quais só à Administração cabe decidir» e que «a decisão sobre o

se e o quando da iniciativa de desencadear negociações com vista à alteração do ordenamento – com as

associações sindicais ou com outros portadores de interesses que devam participar – é uma opção política que

um órgão de soberania não pode impor ao outro, mesmo nos espaços onde ambos concorram no poder de

regulação emergente, seja este equiordenado (lei-decreto-lei) seja escalonado (acto legislativo-acto

regulamentar).»

Naturalmente, a análise do cumprimento das normas constitucionais em causa caberá, em concreto, à

comissão competente.

Assim, apesar de as normas acima referidas poderem suscitar tais dúvidas, como ficou também referido na

nota de admissibilidade, as mesmas são suscetíveis de serem eliminadas ou modificadas em sede de

apreciação na especialidade, pelo que não inviabilizam, como tal, a discussão da iniciativa.

Por outro lado, relativamente ao cumprimento do limite à apresentação de iniciativas previsto no n.º 2 do

artigo 167.º da Constituição e no n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, designado habitualmente como «lei-travão»,

assinalamos que, ao prever a revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos

16 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 17 CANOTILHO, J.J Gomes e MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, II vol., 4.ª ed., Coimbra Editora, p. 415 18 Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 214/2011