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II SÉRIE-A — NÚMERO 188

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quais o ordenamento jurídico português não prevê um agravamento da pena no caso de serem praticados

com motivação discriminatória, seja por via de um tipo penal qualificado ou de uma agravante específica. Há

que relembrar ainda que é sempre possível o reconhecimento da motivação por via da aplicação do art.º 71.º

do Código Penal (agravante geral), mas que esse caminho raramente é adotado pelo juiz no momento da

aplicação da pena». Nesse sentido, oferece variadas recomendações, particularmente no que respeita à

criação de tipos penais qualificados para os crimes que mais comumente são cometidos por motivo

discriminatório, enumerando, por exemplo, a violação, as ofensas à integridade física simples, a ameaça, a

difamação, a injúria e o dano, ou a transformação da natureza dos crimes de injúria e difamação quando

qualificados por motivação discriminatória (de particulares para semipúblicos), entre outras.

Procedendo uma análise comparada dos ordenamentos jurídicos europeus, é possível concluir-se no

sentido de existir uma clara preferência generalizada pela via da não autonomização dos crimes de ódio na

legislação penal. Pelo contrário, vários ordenamentos jurídicos optam pela agravação de todas as ofensas

criminais motivadas por ódio e discriminação. É o caso do Código Penal da Suécia que, na secção 2 (7) do

capítulo 29 (no capítulo que se relaciona com a determinação das penas) estatui o seguinte: «Na valoração

penal, as seguintes circunstâncias agravantes devem ser especialmente consideradas para além do que é

aplicável para cada tipo de crime (…) se o motivo para o crime for agredir uma pessoa ou um grupo de

pessoas em razão da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, crenças religiosas, orientação sexual,

identidade ou expressão de género ou outras circunstâncias agravantes». Em Itália, o legislador italiano

aprovou, em 1993, o principal diploma que se debruça sobre o combate ao ódio, o Ato n.º 205/1993, alterado

pelo Ato n.º 85/2006 (Mancino Act). O artigo 3.º deste instrumento legislativo considera o ódio como uma

circunstância agravante no cometimento de outros crimes, decretando o aumento da medida da pena do

crime em casa para até metade. Na Áustria, o quinto subparágrafo do primeiro parágrafo da secção 33 do

Código Penal consagra o motivo discriminatório por detrás de qualquer conduta que constitua crime como

uma circunstância agravante da infração, suscetível de aumentar a medida da pena que será aplicável ao

autor do crime no momento da condenação. O mesmo se verifica em relação a Malta que, no artigo 83B do

seu Código Penal, considera o ódio como uma circunstância agravante da moldura penal de todas as

infrações criminais17, Dinamarca (secção 81 n.º 6 do Código Penal), Finlândia (secção 5 do 6.º capítulo do

Código Penal), França (artigo 132-76 do Código Penal) e Espanha (4.º parágrafo do artigo 22 do Código

Penal).

Há também alguns países que optam por um caminho distinto, mas cujo resultado acaba por ser

coincidente. A título ilustrativo, Bélgica, Bulgária, Luxemburgo, Eslováquia e Eslovénia adotam disposições

diversas que consagram agravamentos para tipos de crime específicos que tenham sido praticados com

motivação de ódio ou preconceito18.

Afirmamos, com regularidade, que «racismo não é opinião, é crime», «homofobia não é opinião, é crime»,

«transfobia não é opinião, é crime». Mas estas declarações são apenas parcialmente verdadeiras. Condutas

racistas, homofóbicas ou transfóbicas, por exemplo, serão apenas crimes, na lei penal portuguesa, se se

verificar o cumprimento de apertados requisitos. Se determinado indivíduo difamar ou injuriar pessoa ou

grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo,

orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou psíquica em público, por meio apto à

divulgação, a sua conduta poderá ser reconduzida ao n.º 2 do artigo 240.º do Código Penal. No entanto, se

determinado indivíduo difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem

étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física

ou psíquica num contexto privado, ou, mesmo tendo a interação ocorrido em público, tenha lugar em meio

não apto à divulgação, a vítima apenas poderá fazer-se valer da proteção conferida pelo crime de injúria, que

não prevê qualquer agravação das penas quando cometida com motivação de ódio ou preconceito.

Mais, os crimes de difamação e injúria constituem crimes particulares. Ora, a natureza deste tipo criminal

implica que a legitimidade do Ministério Público quanto à prossecução da investigação penal é

particularmente limitada, pois o/a ofendido/a deverá, por um lado, manifestar, clara e expressamente, que

17 Artigo 83B do Código Penal de Malta: «The punishment established for any offense shall be increased by one to two degrees when the offense is aggravated, wholly or in part, by hatred against a person or a group on the grounds of gender, gender identity, sexual orientation, race, colour, language, national or ethnic origin, citizenship, religion or belief or other opinion (...)». 18 Esta análise comparativa foi extraída de: Hate crime recording and data collection practice across the EU | European Union Agency for Fundamental Rights (europa.eu).