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15 DE FEVEREIRO DE 2023

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ponto de vista ambiental. Por exemplo, um estudo1 desenvolvido pelo ICNF em parceria com o Departamento

de Biologia da Universidade de Aveiro, demonstrou que a reintrodução do lince ibérico no vale do Guadiana

teve efeitos na diminuição da presença da raposa e no equilíbrio do habitat natural. Estimou-se que, ao longo

de cinco anos, a população de raposa decresceu naturalmente cerca de três vezes nas zonas onde foi

reintroduzido o lince. O estudo salienta ainda que a manutenção de uma densidade adequada de raposas

naquelas zonas é importante para o equilíbrio do ecossistema, tendo em conta o papel da raposa enquanto

regulador de populações de roedores.

Sucede, todavia, que em Portugal a legislação prevê que a caça à raposa pode ser exercida «de salto», «à

espera» e «de batida», podendo ainda ser caçada «a corricão». O processo de caça a corricão é aquele em

que o caçador se desloca a pé ou a cavalo para capturar espécies exploradas para fins cinegéticas com o

auxílio de cães de caça, com ou sem pau, no qual podem ser utilizados até 50 cães, a designada matilha.

Os cães, neste caso, funcionam como arma contra a raposa, isto porque se trata de uma luta entre os cães

e a presa que resulta na morte ou quase morte desta, de forma agonizante, podendo também resultar na

morte de cães ou em ferimentos graves.

A caça com pau continua também prevista na legislação portuguesa. Apesar das alegações de que não

existe caça à paulada em Portugal, a verdade é que ela continua a ser promovida. Por exemplo, na Região

Autónoma da Madeira, todos os anos são concedidas autorizações para a caça à paulada, como é o caso do

coelho-bravo pelo processo «corricão», ou seja, com uso de pau, sem arma de fogo e com recurso a matilhas

de cães. É conhecida pelo menos uma autorização em 2019 do Instituto das Florestas e Conservação da

Natureza (IFCN) da Madeira de caça ao coelho-bravo através deste processo na ilha do Porto Santo.

Acresce referir que o Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, no seu artigo 31.º, veio proibir a luta entre

animais. O legislador considerou censurável a promoção de lutas entre animais, designadamente entre cães,

por concluir que a mesma é degradante para o ser humano e pode potenciar o carácter agressivo de

determinados animais. Note-se que a lei proíbe a luta entre animais e não somente a luta entre cães.

Recordamos que os cães e a raposa fazem parte da mesma família (canidae), pelo que é legítimo questionar o

que será que os difere tanto para que uns mereçam proteção e outros não?

Segundo o relatório de atividade cinegética 2021-2022, publicado pelo ICNF, foram abatidas 6770 raposas

neste período, mas o relatório não disponibiliza mais informação, como as áreas onde o abate foi efetuado ou

o número de cães utilizados ou o número de cães que morreram ou ficaram feridos nestas ações de abate.

Vários países proíbem a caça à raposa, sendo Inglaterra o caso mais conhecido e onde as batidas à

raposa com uso de cães estava fortemente enraizada em alguns estratos sociais. O Parlamento britânico

aboliu a caça à raposa em 2005 sem que isso tenha resultado numa explosão demográfica desta espécie,

como alegam os defensores da prática.

Por outro lado, o saca-rabos (Herpestes ichneumon)é um mamífero carnívoro que vive de norte a sul de

Portugal. É um mesopredador e serve de alimento a predadores de maiores dimensões, como o lince-ibérico e

encontra-se, igualmente, incluído na lista de espécies cinegéticas.

Acontece, porém, que, segundo a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da International Union for the

Conservation of Nature (IUCN), divulgada a 18 de julho de 2019, Portugal estava no 4.º lugar entre os países

europeus com mais espécies em risco de extinção, atrás da Itália, Grécia e Espanha (que ocupava o 1.º lugar).

Em Portugal, das 3000 espécies avaliadas pela Lista Vermelha da IUCN, cerca de 300 eram consideradas

ameaçadas ou criticamente ameaçadas e mais de 200 eram consideradas vulneráveis, sendo que última

avaliação sobre os estatutos de ameaça dos mamíferos de Portugal continental data de 2005, ano em que foi

publicado o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. Das 74 espécies de mamíferos do continente

avaliadas, 24 % estão ameaçadas.

Atendendo à necessidade de uma atualização destes dados, o ICNF lançou um projeto para a edição do

novo Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental, cuja concretização estava prevista até 2021, com

apoio de diversas entidades e financiado pelo POSEUR e pelo Fundo Ambiental.

No referido projeto o saca-rabos é elencado como espécie a constar do novo livro vermelho2. Ora, se esta

informação já deveria, tal como supramencionado, ter sido efetivada, não faz sentido manter esta espécie no

elenco de espécies cinegéticas, devendo, em prol de um desenvolvimento mais sustentável ser a sua caça

1 Https://www.icnf.pt/imprensa/reintroducaodolinceibericoeocomportamentodasraposas. 2 Espécies do livro vermelho: Curiosidades sobre o saca-rabos – Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental.