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II SÉRIE-A — NÚMERO 36

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PROJETO DE LEI N.º 940/XV/2.ª (1)

(INTRODUZ UM CÍRCULO DE COMPENSAÇÃO NACIONAL NAS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS)

Exposição de motivos

O sistema eleitoral português precisa de mudar. Desde 1974, o panorama político-partidário, a demografia

e a organização administrativa portuguesas sofreram profundas alterações que não se traduziram num

ajustamento correspondente no sistema eleitoral. Esta incapacidade de adaptação do sistema político, de

forma a garantir uma representação o mais proporcional possível entre o País e o Parlamento, produziu

fenómenos como um fosso representativo entre o interior e o litoral, incentivos ao voto tático e um elevado

número de votos que ou não expressam as primeiras preferências dos portugueses ou não elegem qualquer

Deputado. Não começarmos a encarar já este problema só levará a adiar as soluções que, mais tarde ou mais

cedo, terão de ser implementadas em Portugal.

O sistema eleitoral português sustenta-se no princípio da representação proporcional na atribuição de

lugares na Assembleia da República. Ao contrário de alguns países que instauraram um único círculo nacional

para o qual todos votam, optou-se, em Portugal, por criar vários círculos plurinominais correspondentes aos

distritos do País. Pretendeu-se com esta escolha, assente também na história política do País, que os círculos

se traduzissem numa ligação mais estreita entre eleitos e eleitores, gerando campanhas mais localizadas nas

eleições legislativas, dirigidas aos problemas das diferentes comunidades do País, sem prejuízo da unidade do

colégio eleitoral nacional. A distribuição do número de Deputados pelos diferentes círculos é feita segundo o

método D'Hondt, seguindo um critério de censo eleitoral. Os méritos deste sistema, que cria condições para

que os Deputados se possam especializar nos problemas dos seus círculos, escondem, no entanto, uma

realidade que prejudica os círculos mais pequenos, os quais, em teoria, seriam um dos seus primeiros

beneficiários. É justamente nestes círculos que o leque de opções que contribuem para a eleição de um

deputado é consideravelmente mais reduzido.

Este problema foi-se agravando nas últimas décadas. Por um lado, a tendência de deslocação de

população do interior para o litoral transferiu mais deputados para os círculos maiores, reduzindo a

representatividade dos eleitos destes mesmos círculos, ainda que o critério populacional fosse respeitado. De

facto, tendo em conta a distribuição de Deputados a partir de 1991, ano em que o número de Deputados

estabilizou em 230, os círculos mais pequenos no território nacional, como Portalegre, Guarda, e Bragança,

elegiam, no seu conjunto, mais três Deputados. Por outro lado, o sistema partidário foi-se fragmentando: nas

primeiras décadas do regime, com algumas exceções, a composição parlamentar havia-se estabilizado em

torno de quatro grandes partidos com representatividade nacional; hoje, existem muito mais partidos. Um

português nos círculos referidos tem menos possibilidade de eleger representantes de um partido que o

represente a nível nacional, contrariamente a um português no litoral.

As mais recentes eleições para a Assembleia da República, no dia 30 de janeiro de 2022, foram mais um

caso flagrante de injustiça no nosso sistema eleitoral. Calculou-se que 730 mil votos nas eleições legislativas

de 2022 não elegeram qualquer Deputado1, apesar das preferências expressas dos eleitores, o que constitui

cerca de 13 % do universo de 5 563 497 votos depositados nessas mesmas eleições. Esta iniquidade é

especialmente grave num parlamento assente num sistema de representação proporcional, que se pretende

que conduza a legislaturas plurais e representativas do espectro de preferências da população.

Ao não se respeitar plenamente a necessidade de proporcionalidade do sistema eleitoral, gera-se a

impressão de que uns votos são mais úteis do que outros: onde em Lisboa um voto na primeira escolha tem,

por regra, um impacto significativo, em Portalegre ou Bragança é-se incentivado a votar no mal menor entre as

maiores forças partidárias, sob pena de não se eleger qualquer Deputado. O fenómeno do chamado «voto

tático», característico dos sistemas uninominais sem círculos de compensação, como se verifica no Reino

Unido ou nos Estados Unidos, acaba por ter expressão em Portugal, incentivando muitos eleitores a não votar

nas suas primeiras escolhas, contrariamente aos princípios que subjazem à representação proporcional.

Tudo isto conduz a um viés pró-maioritário nos círculos mais pequenos, seja do ponto de vista dos

incentivos ao voto, seja da matemática eleitoral do país em função do declínio demográfico dos círculos mais

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