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3 DE MAIO DE 2024

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assilvestrados ou silvestres, constituiria até uma lesão ao seu bem-estar.

Acontece que a Portaria n.º 146/2017 se limitou a regular os programas CED exclusivamente destinados a

gatos inseridos em colónias.

Ora, o certo é que muitas vezes acontece gatos em estado de errância estarem habituados à existência

solitária (que é, aliás, própria da sua natureza) e integrados, de forma estável e benéfica, em comunidades de

moradores, que os cuidam, não manifestando aptidão para a inserção numa colónia de gatos situada em local

diferente e sujeita a uma estrutura gregária.

A própria portaria citada reconhece expressamente essa eventualidade ao dispor que os gatos capturados

no âmbito dos programas CED deverão, antes de integrarem a colónia, ser entregues nos centros de recolha

oficial (CRO) para verificação da sua aptidão para o efeito [cf. alínea d) do n.º 4 do artigo 9.º], caso contrário

terão de ser acolhidos nos CRO e encaminhados para adoção.

Veja-se que a Convenção Europeia para a Proteção dos Animais de Companhia (doravante designada por

Convenção), aprovada pelo Decreto n.º 13/93, reconhece que «o homem tem uma obrigação moral de respeitar

todas as criaturas vivas» e «os laços particulares existentes entre o homem e os animais de companhia».

Estabelece ainda a Convenção, que os Estados Parte devem assegurar a proteção dos animais de

companhia, onde se incluem aqueles que se encontrem em situação de abandono ou errância.

Assim como a Convenção prevê, igualmente, que um animal não deve ser detido como animal de companhia

se, embora essas condições de alojamento e bem-estar se encontrem preenchidas, o animal não possa adaptar-

se ao cativeiro [alínea b) do n.º 3 do artigo 4.º da Convenção] e que os Estados Parte devem encorajar a

esterilização de animais de companhia (12.º).

No plano nacional, a própria lei dispõe como princípio básico para o bem-estar dos animais que nenhum

animal deve ser detido como animal de companhia se não se adaptar ao cativeiro (cf. n.º 2 do artigo 7.º do

Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro).

E o mesmo se diga, aliás, de cães em estado de errância, muitas vezes vítimas de abandono, que encontram

acolhimento responsável numa comunidade de moradores e se habituam, de forma benigna, integrada e

controlada, a coabitar o espaço público, contribuindo também para a socialização, qualidade de vida das

pessoas, sentimento de pertença à comunidade e partilha de responsabilidades.

Encaminhar esses animais inseridos estavelmente em comunidades que por estes se responsabilizam,

comummente designados por «animais comunitários», para o cativeiro nos CRO e condená-los a um futuro

incerto, com provável confinamento permanente nesses alojamentos municipais, é cruel e desnecessário.

Por outro lado, é um facto preocupante que, mercê da inoperância de décadas por parte dos poderes públicos

focados na prática continuada do abate como pretenso remédio para o controlo da população de cães e de gatos

e ausência de campanhas de esterilização animais expressivas e eficazes por todo o território nacional, ainda

enfrentamos um grave problema de sobrepopulação destes animais relativamente ao número de lares que se

disponibilizam ou que reúnem condições para os acolher.

O fenómeno dos animais comunitários representa uma realidade sociológica relevante, que se pratica

informalmente há décadas, e que, como tal, é justo que se reconheça juridicamente e regule, tanto mais que

alguns regulamentos municipais sobre o bem-estar animal, designadamente o de Sintra, preveem já essa figura.

Ademais, existem hoje evidências científicas de que o reconhecimento e a regulação dos animais

comunitários promovem a responsabilidade social e o espírito de comunidade.

Designadamente, a prestigiada organização International Companion Animal Management Coalition (ICAM)

elaborou, em 2007, um manual de procedimentos operacionais que, para além de incluir estratégias de cuidados

dos animais comunitários, versa sobre a sustentabilidade dos programas de maneio desses animais através do

desenvolvimento da responsabilidade social local, do monitoramento e da avaliação constantes.

No mesmo sentido, segundo o relatório técnico n.º 931, de 2005, proferido pela Organização Mundial de

Saúde, quando as ações para o maneio das populações animais são controladas pelo sistema de participação

social, aumenta a consciência e o sentimento de guarda responsável na comunidade, o que contribui para a

construção de uma comunidade mais estruturada para prover cuidados de saúde aos animais e evitar o

abandono.

Ou seja, o reconhecimento jurídico do animal comunitário, obviamente sob requisitos legais adequados,

constitui uma resposta social complementar contra o abandono animal, promovendo igualmente a guarda

responsável dos animais, sob a ótica holística do bem-estar humano e animal e da qualidade de vida