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II SÉRIE-C — NÚMERO 31

entendimento que considero institucional e à margem das polémicas partidárias.

Considero de importância fundamental a existência de serviços de informações na defesa de um Estado de direito e democrático, o que implica uma adequada fiscalização, de

modo a estarem ao serviço e na defesa dos direitos e liberdades dos cidadãos.

Desde o início das suas funções que este Conselho tem chamado a atenção quer ao Governo, quer à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para os poderes de fiscalização dos serviços de informações, que, na interpretação restrita da lei, seriam insuficientes.

No entanto, com o Governo a aceitar uma interpretação mais ampla da lei e com a prática que o Conselho vinha seguindo, foram sendo criadas expectativas que apontavam para uma alteração da lei, no sentido do reforço dos poderes de fiscalização.

Foi essa a interpretação que demos quando o Governo, por intermédio do Ministro da Administração Interna, e a propósito do inquérito que fizemos aos Serviços de Informações de Segurança — Delegação da Madeira —, referiu que seriam dados todos os meios ao Conselho para o cumprimento integral da sua missão de fiscalização.

Este aspecto foi referido no texto do comunicado deste Conselho de 4 de Maio de 1994 que se transcreve: «[...] o Governo, através do Ministério da Administração Interna, solicitou deste Conselho um rigoroso inquérito, o que é significativo do reconhecimento implícito na lei de funções deste Conselho que de futuro importará explicitar.»

No entanto, e contra todas as expectativas, a Assembleia da República aprovou, no final da sessão legislativa, as alterações à Lei n.° 30/84 — Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa—, em que, não só não clarifica as competências do Conselho de Fiscalização, reforçando-o com mais meios, como as alterações podem ser interpretadas como sendo mais restritivas, face àquilo que vinha sendo a prática ao longo destes anos.

Neste sentido, e considerando que não estão reunidas as melhores condições para o desempenho das minhas funções, ao abrigo do n.° 2 do artigo 9." da Lei n.° 30784, de 5 de Setembro, apresento a V. Ex." a renúncia ao cargo de membro do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações para que fui eleito em 6 de Dezembro de 1990.

Lisboa, 19 de Julho de 1994. — António Alves Marques Júnior.

Ex.™ Sr. Presidente da Assembleia da República:

Tendo tomado conhecimento, por leal e prévia comunicação dos próprios, do pedido de renúncia dos Ex.™" Srs. Dr. Anselmo Rodrigues e Deputado Marques Júnior do cargo de membros do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, e depois da indispensável ponderação, não me resta outra solução que não seja a de também apresentar a V. Ex.° o meu pedido de renúncia ao cargo de membro desse órgão.

Não o faço por qualquer razão de ordem política.

Tratando-se de um órgão constituído por três cidadãos, mal se compreenderia que, saindo dois, eu nele continuasse soiu\ho, totÃLmstvte inoperacional.

Sendo ainda certo que, com este meu pedido, posso, por qualquer forma, contribuir para a solução do problema que foi criado.

Não quero, no entanto, Sr. Presidente, concluir por aqui esta minha carta de renúncia.

Sei que o sistema de fiscalização dos serviços de informação não é perfeito.

Mas, considerando a especificidade dos serviços, o seu carácter sigiloso, a sua democrática função de defesa da segurança do Estado, pergunto-me a mim próprio se algum dia poderá ser melhor do que é.

Para mim, é muito difícil traçar a fronteira entre o âmbito da fiscalização e o reduto dos serviços.

Por isso, entendi sempre que a função do Conselho é,

fundamentalmente, a de averiguar se os serviços de informações atropelam ou não, por qualquer forma, os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

A fiscalização existe, num Estado de direito e democrático, para contribuir para que os serviços de informações se não transformem em polícias políticas, com tudo quanto de mau estas têm.

E existe ainda para que esses serviços se não intrometam na vida privada dos cidadãos, de molde a não lhes afectarem esses direitos e a garantirem-lhes uma vida livre num país livre.

Ao longo de quási oito anos, tantos quantos servi no Conselho, nunca vi qualquer atropelo desses direitos, com excepção do chamado «problema do SIS Madeira», sobre o qual o Conselho actuou com rapidez e eficiência, sem que nada nem ninguém o tivesse impedido disso.

Nunca ao Conselho chegou uma só queixa de qualquer cidadão contra a actuação dos serviços de informações.

As queixas que, aqui ou ali, eram imputadas aos serviços em órgãos de comunicação social foram sempre, pelo Conselho, objecto de averiguação, como pode ver-se dos pareceres anuais apresentados à Assembleia da República, onde tudo se explicava e justificava.

Posto isto,

Os meus colegas resolveram renunciar aos seus cargos, e quem sou eu para criticar as suas atitudes.

Mas não posso calar que essas renúncias vieram criar um facto político que considero grave e, por aquilo que oiço e leio, de difícil solução.

Acredito sinceramente que não fosse isso o que os meus colegas quiseram com a sua renúncia, mas isso é aquilo de que outros se aproveitam com objectivos que não quero apontar.

Como já disse, a fiscalização não é perfeita e creio que nunca o será, mas o certo é que serviu ao Conselho durante quási oito anos.

Que me recorde, não conheci, ao longo destes anos, qualquer iniciativa legislativa para o modificar.

Quero aqui realçar que nunca o Governo, através dos Srs. Ministros das tutelas, recusaram ao Conselho fosse o que fosse de quanto este lhes tivesse solicitado, nunca proibiram o acesso a qualquer objectivo pelo Conselho indicado, de igual modo tendo procedido os serviços.

A tudo, absolutamente tudo, quanto o Conselho pediu para ver, ouvir, inquirir, fiscalizar, foi sempre dado, sem qualquer reserva, total deferimento.

Se nada nos foi recusado, se vimos tudo quanto quisemos, então, se insuficiência houve de fiscalização, a culpa será, exclusivamente, do Conselho, embora todos tenhamos a consciência de que sempre fizemos o nosso melhor.

O argumento da letra da nova lei impressiona-me relativamente pouco. Sempre quis saber mais do seu espírito e da vontade do legislador.

Não sou de parecer, por isso, que o sistema fiscalizador impeça uma fiscalização séria e eficiente.

Para esta, bastará a vontade de quem fiscaliza e a de quem é fiscalizado, vontades estas que sempre existiram.