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2 | - Número: 001 | 18 de Setembro de 2010

PROVEDOR DE JUSTIÇA

Comunicação dirigida à Assembleia da República acerca da Recomendação n.º 9-A/2010 — Confisco de bens eclesiásticos — restituição da Igreja de Santo António de Campolide/Igreja do antigo Convento de Santa Joana

Muito me honra dirigir-me a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, ao ver-me inconformado com as explicações prestadas à chefe do meu Gabinete da parte do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças para não adoptar uma recomendação formulada, de resto, a S. Ex.ª o Ministro de Estado e das Finanças.
Sem prejuízo do mais aprofundado conhecimento das razões éticas e jurídicas, que V. Ex.ª e os Srs. Deputados poderão identificar nos elementos juntos (em anexo), seja-me permitido enunciar brevemente os antecedentes da situação tratada e que, no passado, fora objecto de uma recomendação do meu antecessor junto do anterior governo.
A proximidade das comemorações oficiais do Centenário da República parece-me motivo dirimente para não retardar a tomada de conhecimento pela Assembleia da República de uma medida que, a ser adoptada pelo Governo, e sem encargos especiais, permitiria reparar um dos excessos cometidos há precisamente 100 anos, com efeitos que se arrastaram até aos nossos dias.
Refiro-me à igreja que, em 8 de Outubro de 1910, integrando o antigo Colégio de Campolide, em Lisboa, e confiscada à Companhia de Jesus, veio a ser cedida — e apenas cedida em uso — à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e do Senhor Jesus dos Passos da Santa Via Sacra de Campolide, a título de compensação por ter sido privada da Igreja compreendida no denominado Convento de Santa Joana, à Rua de Santa Marta, também em Lisboa, e que o Estado recentemente alienou como património seu a terceiros.
Não se trata — note-se bem — da universalidade dos bens confiscados do antigo Colégio de Campolide, mas tão-só da Igreja adjacente afecta ao culto católico como Igreja paroquial e centro de actividades de solidariedade e assistência.
A verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que o imóvel confiscado encontra-se em notório estado de degradação com risco para a segurança e em manifesta incompatibilidade com o valor artístico que lhe reconheceu o Decreto n.º 45/93, de 30 de Novembro. Nunca o Estado, ao longo de 100 anos de confisco, providenciou pela conservação ou beneficiação da Igreja, mas recusa-se a abrir mão do imóvel sem uma contrapartida que, apesar de já revista no seu anterior cálculo (€1 260 000,00), continua a ser iníqua para os paroquianos de Santo António de Campolide — autores das centenas de queixas que recebi — e para a referida Irmandade.
Por razões de ordem estritamente formal, o Governo insiste em arrecadar €230 500,00 para restituir degradado o imóvel que subtraiu em bom estado há perto de um século. Furtando-se a examinar e acompanhar a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem — para casos semelhantes de confisco de bens eclesiásticos, na Turquia e em países da antiga órbita soviética — o Estado refugia-se na aplicação do princípio financeiro da onerosidade (Decreto-Lei n.º 280/2007, de 7 de Agosto) porque se abstém de considerar que se trata de um acto de reparação (e por factos bem anteriores), seja para adoptar uma providência legislativa singular seja para estipular um preço meramente simbólico e que cumpriria o citado regime normativo.
Exigir o preço de € 230 500,00 a uma comunidade que terá, em seguida, de obter fundos para dotar o imóvel das mínimas condições de segurança e funcionalidade, é a meu ver um encargo excessivo quanto a um bem que, segundo a Concordata, assinada em 18 de Maio de 2004, não pode ter outro destino, e que, para mais, o Estado classificou, por razões artísticas, como de interesse público. Pergunto-me que valor de mercado pode ter este imóvel? Vale a pena sublinhar que a referida Irmandade, a quem, por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Abril de 1927, foi reconhecido o direito à cedência do Convento de Santa Joana, jamais pôde reclamar a propriedade da Igreja de Santo António de Campolide, cujo uso lhe foi atribuído em substituição, dado que este imóvel — pertença, no seu passado, dos jesuítas — nunca foi incluído nas disposições concordatárias de 1940 nem de 2004.