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592 II SÉRIE - NÚMERO 20-RC

for, longe de mim também estaria a ideia de que o conceito de pleno emprego fosse uma reserva socialista. Daqui á pouco teríamos o PSD a denunciar o Keynes como um perigoso marxista, e sabe-se lá que mais! Não apelando ao rigor dos princípios, tenha-se pelo menos respeito pelos mortos!

Porém, muito bom democrata-cristão defende políticas de pleno emprego. Em meu entender, o conceito de pleno emprego consagrado na Constituição não é um conceito ideologicamente apropriado. E é mau pensar que poderia ser ideologicamente apropriado porque estaremos todos de acordo em que o objectivo do Estado é criar cada vez mais emprego e que o desejável seria que todos tivessem emprego. Porque, como disse o meu colega Alberto Martins, para que a todos fosse garantido o direito ao trabalho, o direito ao trabalho carece, para concretização, da existência de um emprego para cada cidadão.

Também não partilho do optimismo do Sr. Deputado José Luís Ramos quando refere que o keynesianismo já está a ser afastado há muito tempo. Acho é que o PSD está a entrar em ruptura com o keynesianismo muito tarde: tão tarde que o está a abandonar no momento em que outros liberais europeus o começam a retomar, se bem que em novos moldes, claro. Nunca convém passar certidões de óbito a ideias, porque as ideias não morrem com essa facilidade. Nesse caso, dentro desta lógica, gostaria de perguntar em que medida é que a Constituição ganha por substituir esta norma de pleno emprego, que é uma norma que se compreende, como norma desejável e tendencial, mas não como valor absoluto nem valor concretizável a curto prazo, por uma norma na verdade mais enxuta mas muito menos expressiva e que, digamos assim, não tem força. Pretende-se criar emprego, naturalmente, mas não me parece que, sob o ponto de vista programático, seja uma norma muito relevante para a Constituição. Mas enfim, pela minha parte, não creio que seja matéria que me faça perder noites de sono.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - É evidente que não estamos perante uma daquelas questões pelas quais valha a pena terçar grandes armas.

Em primeiro lugar, damos por adquirido que a aspiração de plenitude de que releva a ideia de pleno emprego é uma aspiração em que todos estamos empenhados. Na execução das várias políticas, todos pensamos na ideia de pleno emprego, o que não quer dizer que, ao elaborarmos as normas jurídico-constitucionais relativas ao direito ao trabalho, a devamos estabelecer como meta, mais a mais reforçada com a garantia de o Estado ter de assegurar a execução do pleno emprego. É uma norma programática com especial força, com especiais exigências, tão fortes e tão consistentes que são quotidianamente violadas. Já foi dito que este tem sido um ideal incumprido mas a verdade é que, mais do que incumprido, é na prática incumprível. Em consequência, tudo está em saber se, por um lado, do ponto de vista da verdade jurídico-constitucional e, por outro, e sobretudo, do ponto de vista da real vinculação da actuação do Estado, se debilita ou, pelo contrário, se reforça o direito ao trabalho substituindo a expressão "políticas de pleno emprego" por "criação de emprego". Temos consciência de que com tal alteração se reforça a obrigação que impende sobre o Estado de aumentar ou criar emprego. De facto, quando se faz impender sobre o Estado uma, obrigação que à partida se define como incumprida e, mais do que isso, como incumprível, preferimos submeter o Estado a uma obrigação pelo menos cumprível e sindicável, que é a do aumento progressivo do emprego.

As críticas que foram feitas às propostas do PSD têm, do nosso ponto de vista, pertinência no sentido em que, por deficiente redacção e porventura - por que não admiti-lo? - por deficiente visão das coisas no momento da feitura da proposta, demos à redacção uma formulação de certa maneira um pouco estática. É que, no fundo, o Estado ficaria desincumbido da obrigação de criar um emprego se ao fim de um ano ou de uma legislatura criasse um emprego. Em vez da fórmula "criação de um emprego", deveríamos adoptar uma ideia com tendência expansiva, como "criação e aumento de emprego" ou "criação e aumento progressivo de emprego", ou seja, qualquer ideia que torne a obrigação que impende sobre o Estado numa obrigação exequível e controlável e retire ao Estado a incumbência do pleno emprego, que, por ser nobre e ter aspiração de plenitude, todos temos consciência de não se poder cumprir. O que não tem remédio remediado está. É uma ideia bonita, de plenitude, é uma norma programática, mas não vale a pena aspirarmos ao pleno emprego. Na verdade, o Estado nunca se pôs em situação de desobediência a esta norma - pelo menos nunca ninguém pôs em questão a sindicabilidade da actuação do Estado por força desta norma. Penso que seria mais facilmente posta em causa a condução de uma política de emprego se a norma estivesse desenhada como propomos, admitindo de boa mente que a criação de emprego deveria ser qualificada como a exigência não só de criar mas também de criar progressivamente e aumentar a tendência expansiva do emprego.

Penso que não deveremos perder muito tempo com esta questão. Entendemos que o direito ao emprego ganharia mais consistência com a nossa formulação do que com uma fórmula que é mais nobre, como aspiração de plenitude, mas que manifestamente não está ao nosso alcance. Creio que ninguém irá sindicar a actuação do Estado por em cada momento não ter pleno emprego - nunca ninguém o fez.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.

O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Quero apenas comentar duas afirmações feitas, uma delas quando se disse que não fazia sentido a alteração proposta pelo PSD à alínea a) do n.° 3 do artigo 59.°, porque o n.° 1 do mesmo artigo consagrava, e consagra, que todos têm direito ao trabalho e que, esta sim, era uma norma programática. Ora, não é assim. Esta é a consagração de uma norma positiva; aliás, seguindo de perto o ensinamento referido pela Constituição da República Anotada, por Gomes Canotilho e Vital Moreira, esta é, de facto, uma norma positiva e que tem um conteúdo diverso da que está expressa na alínea d) do n.° 3 deste mesmo artigo 59.° - que, esta sim, é uma norma programática. Senão, atentemos - e permito-me citar