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29 DE JUNHO DE 1988 587

Em primeiro lugar, e não esquecendo aquilo que o Sr. Deputado Pacheco Ferreira há pouco referiu quando, ainda que de modo menos analítico, procedeu a uma distinção entre o modus da greve e a sua vocação, entendo que a greve tem uma vocação particular, de classe, que obviamente não é o mesmo que uma vocação política geral. Isto porque, a atendermos à ideia de que a greve tem esse tipo de vocação, insistimos na descrença dos modos legítimos de contestação política em democracia e que são variados, como é do conhecimento comum.

Sr. Deputado Alberto Martins, relativamente à sua preocupação com a questão da democracia política, e pondo já de parte o problema do abuso de direito e indo ainda de encontro ao que afirmou há pouco o Sr. Deputado José Magalhães, creio que o problema que aqui se refere é o da diferença entre o modus e a vocação da greve, e o que aqui está em evidência é o problema da vocação do direito de greve e da degenerescência eventual dessa vocação. Ora, o que gostaria de lhe perguntar é o seguinte: V. Exa. entende ou não que o n.° 2 do artigo 58.°, ao preocupar-se com problemas de democracia política, o está a fazer a partir de uma dissociação entre trabalhadores e lei ou, mais concretamente, entre trabalhadores e poder legislativo? E isso não é, de certo modo, sonegar a ideia clara de que o poder legislativo consagra já, em si, a intervenção dos trabalhadores por via do esquema representativo?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Alberto Martins, a minha pergunta situa-se numa outra esfera, uma vez que, pela minha parte, dou de barato e, provavelmente, também V. Exa., algumas das apontadas características da Constituição.

De facto, a Constituição é pletórica, pois ama todos os modos e não descrê da democracia que, de resto, vem no plural, ou seja, é política, social, cultural e laborai. Além disso, articula e conjuga harmoniosamente estas pluralidades. Entrosa-as e, portanto, rejeita concepções empobrecidas de democracia.

Ora, a minha preocupação não é essa, mas, sim, outra, qual seja a de saber quais são os limites da posição do PS nesta matéria. E formulo esta questão porque, colocado no terreno da concreta interpelação, o PS diz uma evidência, isto é, que a greve não é um direito absoluto. É, de facto, um dado conhecido, mas o problema é que, como se sabe, têm feito circulação entre nós certas ideias restritivas e, designadamente, uma que nos parece extremamente perigosa, qual seja a de que esse direito poderia ser limitado em função de um interesse geral da comunidade como realidade difusa e tida como absoluta. E também se sabe que alguns elementos na doutrina, ao reflectirem sobre a licitude dos objectivos da greve, têm preconizado um entendimento fortemente restritivo, mesmo quanto ao alcance a dar directamente ao n.° 2 do artigo 58.° da Constituição.

Perante isso e face às últimas evoluções da posição do PSD que resulta corrigida pelas declarações sucessivas, embora contraditórias - umas mais analíticas, outras mais confusas -, de alguns dos Srs. Deputados, perguntaria: qual é a posição do PS? Está disponível

para encarar versões que majorem a margem de actuação do legislador ordinário? E formulo estas questões porque tudo aquilo que o Sr. Deputado Alberto Martins disse situa-se dentro das possibilidades actuais do legislador ordinário. Não é preciso acrescentar uma vírgula, um ponto final ou um erro ortográfico para que isso seja possível, ainda que as concepções deformadas tenham também curso livre mesmo neste enquadramento.

Não lhe parece que a alteração da Constituição neste ponto poderia impulsionar num sentido perverso outras interpretações aleijadas e aleijantes como aquelas que o Govêrno tem feito quanto ao conceito de greve, designadamente através do abuso da requisição civil?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, remetia a resposta a estas questões formuladas por V. Exa. para a intervenção que sobre a mesma matéria vai fazer o Sr. Deputado António Vitorino.

Quanto à questão colocada pela Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves, que não sei se entendi com toda a precisão, não obstante a elegância da formulação literária, devo dizer que tenho pelo menos o entendimento de que o regime jurídico constitucional é uma democracia constitucional. E, nesse sentido, ele é articulável entre um sistema representativo, que nunca o entendi como um sistema de pendor exclusivamente republicano, e um sistema de democracia participativa. Este é um afloramento da democracia participativa ou, pelo menos, de participação política mais lata do que aquela que é concebida tout court nos limites da democracia representativa.

Por isso, em termos do adquirido não faria muito sentido que aquilo que está adquirido por certos segmentos sociais possa ser perdido na remissão para um hipotético, hábil e harmonioso legislador ordinário. Não se vai naturalmente abrir mão de um direito de participação, que está adquirido, para um legislador ordinário cuja harmonia e rigor de soluções, pela experiência recente, nem sempre têm sido os melhores. E o caso da requisição civil, que está conexa com esta matéria, é suficientemente expressivo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, perante estas duas OPCs (ofertas públicas de conúbio), ou seja, a primeira vinda do Sr. Deputado Carlos Encarnação e a segunda do Sr. Deputado José Magalhães, penso que seria deselegante deixar que essa questão ficasse pendente, constituindo para um e para outro angústia para o almoço.

Quero, então dizer somente o seguinte: colocando-me no plano da razoabilidade, a que, aliás, se fez apelo, a proposta de eliminação do n.° 2 do artigo 58.° é irrazoável. E sobre propostas alternativas o PSD vai ter primeiro que se decidir sobre qual a via que vai querer escolher para abordar este problema, na medida em que oscilou neste debate entre as duas posições que foram expostas. De facto, o PSD oscilou entre a propositura de algumas limitações adicionais com os limi-