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29 DE JUNHO DE 1988 583

determinado momento, emitiu juízos críticos em relação a determinadas greves. Aí pensou e falou em termos históricos. Se quer obrigar-me a fazer uma prospectiva até ao 3.° milénio, vamos a isso. A questão é que, ao imputar aos outros a emissão de juízos críticos sobre determinadas greves, fugiu a precisar o seu pensamento quanto àquilo que entende como abusos. O que é que V. Exa. entende por abusos? Estes casos todos que citei - intermitência, rotatividade, greves não clássicas - são abusos, na sua concepção? Isto é fundamental para medirmos qual o grau de alteração que o PSD pretende introduzir na ordem jurídica portuguesa. Porque, se V. Exa. suprime a cláusula do n.° 2 e, simultaneamente, tem uma concepção da qual flui que tudo isto são abusos, então ficamos conversadíssimos sobre o que é o uso: é um espaço restrito, carcerário quase, em que, esmagados por uma concepção, ainda por cima, funcionalizante, os trabalhadores ficariam obrigados a apenas fazer greve para efeitos estritamente profissionais, entendidos na acepção mais descarnada que é possível imaginar e, ainda por cima, sujeitos a um diktat político, nos termos do qual seriam invocados elementos de cidadania para lhes castrar a expressão em termos de exercício de direitos laborais. Sr. Deputado Pacheco Pereira, se é essa a sua concepção, é extremamente reveladora, mas seria bom que não ficasse nenhuma dúvida.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Vou ter muita dificuldade em responder à sua pergunta...

O Sr. José Magalhães (PCP): - São cinco perguntas!

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - São cinco? Confesso que não tomei nota de tantas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Desdobradas em quinze!

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Não, o que V. Exa. fez foi uma intervenção, formulando a teoria que está subjacente à pergunta, formulando as respostas e as opções dessa teoria. Evidentemente que não vou discutir, pelo menos agora, matérias que não sejam aquelas que digam directamente respeito à minha intervenção; não vou discutir processos de intenção sobre questões de que não falei.

O Sr. José Magalhães (PCP): - V. Exa. quer que eu sumarize as perguntas, formal e sucintamente?

O Sr. Presidente: - Penso que isso não será necessário.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Não preciso que sumarize as perguntas. Vou ater-me às questões de carácter político, deixando-lhe depois a incumbência, que com certeza assumirá com gosto, de retirar as conclusões técnico-jurídicas das afirmações políticas que irei fazer.

Chamo a atenção de V. Exa. para o facto de não me ter pronunciado sobre o n.° 1 do artigo 58.°; pronunciei-me sobre o n.° 2, mas grande parte dos considerandos das perguntas que o Sr. Deputado me fez respeita ao n.° 1 do artigo 58.° e não ao n.° 2. Para não perdermos muito tempo com matérias que não foram levantadas, pronunciar-me-ei apenas sobre o n.° 2 e sobre o conteúdo político da minha intervenção no sentido de satisfazer a curiosidade de V. Exa. Evidentemente, percebo muito bem qual a intenção que está subjacente aos desenvolvimentos que V. Exa. já fez, pronunciando-se, antes da minha resposta, sobre o conteúdo das minhas afirmações. O que me limito a dizer é muito simples: numa democracia política como a portuguesa, com o ordenamento constitucional que tem e com as possibilidades de alteração subjacentes ao processo de revisão constitucional que estamos a trabalhar - não nos podemos esquecer de que estamos num processo de discussão e de alteração da Constituição actualmente vigente, pelo que não servem como argumentos de autoridade as fórmulas anteriores -, temos disponibilidade, se chegarmos a um acordo de dois terços, para as alterar. Limitei-me a dizer isto, que é muito simples. E V. Exa. sabe muito bem - é a resposta às suas cinco perguntas - que, numa democracia política, quanto à subordinação de qualquer interesse sectorial ou de uma eventual democracia laborai, naquilo que não diz respeito aos direitos fundamentais (que ninguém pôs em causa), entre os quais o direito à greve, o que se passa é que não podem ser utilizados instrumentos que não aqueles constitucionalmente previstos para intervir no domínio político. No domínio político, existem instrumentos políticos definidos - o voto, os partidos, a acção política tal como ela é regulamentada na Constituição - e não é legítimo circuitar ou fazer intervenções utilizando outro tipo de instrumentos para directamente substituir os meios políticos que estão à nossa disposição. A democracia ou aquilo que V. Exa. referiu como democracia laboral, naquilo que não é directamente derivado do direito à greve ou dos direitos fundamentais, não pode ser considerada igual ou superior ou competitiva ou conflitual com as formas de democracia política. Esses são os fundamentos da vida política em qualquer democracia ocidental, dos quais, como V. Exa. sabe, derivam limitações quanto à utilização do direito à greve com objectivos que directamente colidem com as formas de intervenção política típicas de uma democracia ocidental.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, isso ilegaliza o 28 de Março, se bem estou a perceber.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Não, não ilegaliza o 28 de Março, nem fiz qualquer declaração que o levasse a tirar essa conclusão.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Fico mais descansado, mas isso quer dizer, Sr. Presidente, que ficaram em aberto as observações em relação aos exemplos de abusos.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Ficaram, exactamente porque dizem respeito às formas de utilização do direito à greve e não à substância dessa utilização, ou seja, ao conteúdo material das greves. Estou a pronunciar-me sobre o primeiro e não sobre o segundo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Registo, Sr. Presidente.