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580 II SÉRIE - NÚMERO 20-RC

desencadeada sob a inspiração de um partido comunista. Estou à vontade porque estou a falar de questões de família e tentando pôr tudo em claro.

Relativamente à questão da greve política, Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer que esta é legítima. Acabei de o dizer: "A greve política é legítima!" E, se o não fosse, a União Geral de Trabalhadores em Espanha não convocaria, infelizmente, com tanta frequência greves políticas de protesto em Espanha, o que, infelizmente, acontece a todo o momento, pois há terrorismo em Espanha. Acontecem formas de protesto através da greve, expressas com objectivos e finalidades exclusivamente políticas, e quero ver quem é que se atreve a contestar a legitimidade de uma greve política deste jaez! Assim, a minha posição é clara, não é saudosista, e penso não ser também incoerente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Ultrapassado este período de perguntas, gostaria de fazer alguns comentários sobre a primeira intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, feita sob a forma de pergunta, e felicitar-me por essa intervenção, porque o seu conteúdo quase poderia servir de considerando às razões pelas quais o PSD propõe esta alteração do texto da Constituição.

Chamo a atenção para o facto de que, numa democracia política - e isto tem algo a ver com o que foi dito pelo Sr. Deputado António Vitorino -, aquilo que tem sido referido como democracia laborai é subordinado àquela. Ou seja, a qualidade de cidadão sobrepõe-se à qualidade de trabalhador e, consequentemente, a definição do tipo de intervenção e de acção política que pode ser tida na sociedade num dado momento resulta, por um lado, dos princípios e dos direitos fundamentais e, por outro, das formas que a conflitualidade política, na sua produção legislativa, tem a cada momento na sociedade. E é por isso que não se pode tomar, à partida, uma posição contra as greves políticas.

É preciso é ter em conta que a justificação para a politização do movimento grevista advém apenas da falência de outro tipo de instrumentos de intervenção na sociedade. É por isso que a comparação entre o que se passa na Polónia de Jaruzelski e na Inglaterra da Sra. Thatcher é completamente desprovida de fundamento quando colocada nesses termos, pois na Polónia não existem os direitos políticos fundamentais, sendo, portanto, legítimo aos cidadãos exercerem o seu direito de resistência e de acção política e utilizando todos os meios ao seu alcance, inclusivamente as greves, greves essas que ganham conteúdo político exactamente por não existir um processo pelo qual as reivindicações de tipo político possam traduzir-se na conflitualidade social e política. Em Inglaterra a situação é completamente distinta. A discussão relativa ao âmbito da acção sindical e sobre o papel dos sindicatos na intervenção social e política, no seu sentido mais lato, é directamente derivada da conflitualidade política, que se traduz através do sistema partidário e do funcionamento das instituições governativas. E a greve dos mineiros ingleses não se tornou política, no fim, devido à intervenção da Sra. Thatcher. Era política desde o início e o que se passou foi que o núcleo duro da greve se revelou à medida que a perda de popularidade da acção grevista se foi verificando. Não foi por acaso que falámos do Burundi, porque o Burundi, do ponto de vista da nossa discussão, é uma não entidade e um não país e, portanto, pode ser sempre utilizado como exemplo. Não foi por acaso, também, que o segundo exemplo dado é o de um país inexistente - o Rococó -, pois, como é óbvio, sem desprimor para o Burundi nem para o Rococó, com os quais não quero provocar nenhum conflito diplomático, do ponto de vista da discussão esses países não têm qualquer sentido, quando é certo que temos de discutir a questão em função de realidades políticas.

No que diz respeito às greves e ao âmbito dos interesses a defender através delas surpreendeu-me também que o Sr. Deputado José Magalhães tivesse esquecido alguns dos exemplos que traduziam bem a perversão dos interesses a defender, um dos quais, aliás, foi levantado pelo Sr. Deputado Rui Machete, nomeadamente o da utilização do direito à greve para sabotar o funcionamento de uma empresa concorrente. É que o próprio PCP sempre considerou que existiriam greves reaccionárias, contra as quais, aliás, lutou entre 1974 e 1975, exprimindo, portanto, um juízo político sobre os objectivos da greve. E certamente não estará de acordo com que possam ser considerados interesses dos trabalhadores a defender algumas das realidades concretas do movimento grevista que se têm verificado um pouco por toda a parte em países mais significativos que o Burundi.

Em relação ao âmbito da greve, penso que a questão da greve política e da greve não política ou a definição das finalidades e dos objectivos da greve não podem ser, evidentemente, diferenciados de uma análise sobre o conjunto do sistema político-partidário constitucional e que só na base de uma análise desse sistema é que se poderá concluir sobre as finalidades permissíveis a cumprir pela mesma greve.

Gostaria ainda de chamar a atenção para o facto de, embora nos processos de revisão constitucional anteriores possa ter sido intenção dos legisladores entender o n.° 2 do artigo 58.° como uma forma de estabelecer que a possibilidade de convocação de greves cabia a instâncias que não o conjunto dos trabalhadores, a prática do movimento sindical revelar que não foi essa parte do artigo 58.° que levou o movimento sindical a realizar amplas consultas para a condução dos movimentos grevistas. Conta-se pelos dedos da mão, como todos sabemos, o número de vezes em que os trabalhadores foram consultados de forma directa para a realização de movimentos grevistas. E o melhor exemplo disso é exactamente a última greve geral, em relação à qual foram poucas as consultas que ultrapassaram as estruturas sindicais, consultas essas que nalguns casos resultaram em pronunciamentos contra a greve que não foram seguidos por essas estruturas sindicais, o que se passou, por exemplo, num dos sindicatos da UGT. Efectivamente, o n.° 2 do artigo 58.° não impede que as organizações sindicais decidam a realização de greves nem o âmbito dos interesses a defender através das mesmas, sem que a consulta aos trabalhadores tenha qualquer significado.

São estes alguns dos considerandos que não queria deixar de referir sobre as razões pelas quais o PSD propõe a eliminação do n.° 2 do artigo 58.°