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30 DE JUNHO DE 1988 635

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Eu não disse isso, mas sim que a pretensão do PSD, tal como eu a via, consistia em configurar a matriz ideológica implícita nesta Constituição como uma matriz de Estado liberal e não como uma matriz de Estado social de direito. Não deixo de reconhecer, porque é uma evidência, que ela absorve muito do legado positivo do Estado liberal. Mas essa é uma questão diferente.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Matriz ou não, o que estamos a fazer é a transferir o direito à propriedade privada para o elenco dos direitos, liberdades e garantias. Se isto é Estado liberal, se isto é liberalismo, fiquemos com o liberalismo. Mas julgo que não é isso. Aliás, o Estado social de direito não rejeita - bem pelo contrário - os direitos, liberdades e garantias. Primeira questão.

Por outro lado, a segunda questão já foi respondida pelo Sr. Presidente. Porém, gostaria apenas de acrescentar, se me permitem, que uma coisa é o direito de propriedade e os direitos reais menores contidos no Código Civil, outra é o direito de propriedade como direito fundamental. As disposições do Código Civil não são restrições, nos termos do artigo 18.°, ao direito de propriedade, uma vez que, neste caso, em termos constitucionais, quando desaparece um desses direitos menores, o direito real máximo alarga-se novamente. Consequentemente, não é propriamente, nem pode ser visto no mesmo campo, que é ou que podem ser vistas aquelas que se contêm no n.° 2 do artigo 62.° Aliás, hoje em dia discute-se até na doutrina se às servidões, não as de passagem ou outras constantes do Código Civil, mas por exemplo as servidões administrativas, também dão ou não direito a uma justa indemnização. Se formos por aí, estaremos inteiramente de acordo. Mas todo o debate em sede do direito de propriedade não pode ser visto nos mesmos parâmetros do direito de propriedade do Código Civil e muito menos - o que me parece absolutamente destituído de qualquer fundamento - dizer que, se consagrarmos o direito de propriedade como direito, liberdade e garantia por força do artigo 18.°, inconstitucionalizaríamos qualquer direito real menor, nomeadamente o usufruto, a superfície ou qualquer outro. Bem pelo contrário, as questões não estão no mesmo âmbito e não têm o mesmo denominador. Assim sendo, essa questão nunca se levantou nem se deve vir a levantar.

Quanto às situações previstas no n.° 2 do artigo 62.°, ou seja, a requisição e a expropriação por utilidade pública - há quem fale apenas em "expropriação" e não em "expropriação por utilidade pública", como acontece no projecto do PCP - levanta-se, por outro lado, a questão de saber se cabem nesta norma outras figuras para além das que estão expressamente previstas. Ainda está aqui prevista uma espécie de expropriação temporária. E o caso da requisição em que o titular fica expurgado do seu direito de propriedade, mas o qual, passado algum tempo e desde que o bem não seja necessário, pode voltar para a sua posse. Nestes casos, e só nestes, trata-se de saber se podem existir outras situações em que, dentro destes parâmetros e com este paralelismo, haja lugar ao pagamento de justa indemnização. Trata-se de um campo em que ninguém propôs qualquer alteração, mas julgo, em termos pessoais, que o debate poderia evoluir por aí.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço licença ao Sr. Presidente, muito rapidamente, não para discutir a questão de fundo, mas apenas para precisar o pensamento do Sr. Deputado José Luís Ramos. Entende, do seu ponto de vista, que "expropriação por utilidade pública" e "expropriação por interesse público" seriam expressões equivalentes? É esse concretamente o seu ponto de vista, ou não?

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Julgo que há muito a tentativa de fazer expressões sinónimas no português e depois dizer-se que juridicamente têm o mesmo significado. Todavia, creio que não serão expressões equivalentes por uma razão muito simples: a utilidade pública é um conceito que está bem trabalhado em termos jurídicos, enquanto com a expressão "interesse público" relativamente a esta matéria isso já não acontece. E então das duas uma: ou terá de coincidir com utilidade pública e aí não haverá qualquer diferença, ou não coincidirá, facto esse que, segundo julgo, não fará qualquer sentido. Pela minha parte, prefiro expropriação por utilidade pública.

Contudo, eu estava a insistir em discutir o regime de outras figuras, que não a requisição e a expropriação por utilidade pública, que possam também estar contidas neste n.° 2.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O seu esclarecimento ajudou-me muito a manter e a aprofundar as minhas razões de divergência com o seu pensamento.

O Sr. Presidente: - Talvez nós pudéssemos ver rapidamente o que falta ainda dizer sobre este artigo 62.°, para depois passarmos ao artigo 62.°-A.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu creio que nesta matéria, assim como nas outras e sobretudo como nos casamentos, falta o "sim" para se poder consumar a produção dos próprios preliminares!

O Sr. Presidente: - Estamos só no casamento rato! Ainda não estamos no casamento consumado!

Risos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu tenho grandes esperanças, Sr. Presidente, que seja mesmo um falhadíssimo casamento rato! Porque a não ser assim...

O Sr. António Vitorino (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu sei que o Sr. Deputado António Vitorino é mais sensível a outros direitos que não o canónico, mas neste caso concreto todos entendemos bem o alcance desta questão da "não consumação", sobretudo dados alguns preliminares, e muito especialmente dada a intangibilidade de uma das expressões utilizadas pelo Sr. Deputado Rui Machete. Porque a questão está realmente na medição e filtragem finais, ao crivo de critérios políticos, de algumas das razões e argumentos aqui esgrimidos.