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O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da minha parte, continuava a assentar na ideia de que este artigo define a democracia e define-a enquanto República soberana, atribuindo-lhe uma dimensão finalista no sentido de regresso a uma concepção, aliás, clássica, em que a república é um regime democrático do bem-estar. E este regime democrático do bem-estar alicerça-se numa ideia de liberdade, de justiça e de solidariedade. E, por aí, creio que vale a pena identificar a ideia de liberdade como uma ideia autónoma, sendo de salientar que a liberdade é, sobretudo, a liberdade de escolher. Ora, a liberdade de escolher pode compaginar-se ou não com uma melhor ou adequada protecção da dignidade humana. Isto tem a ver com domínios, até relativamente recentes, em que a liberdade de escolher, sobretudo ao nível de certos domínios da investigação, pode não se compaginar com a ideia de dignidade humana. Refiro-me a todo o amplo catálogo, que conhecemos hoje, dos direitos que têm a ver com a bioética.
Portanto, a ideia de uma sociedade livre, enquanto liberdade de escolher e enquanto direitos cívicos, justa e solidária é uma ideia concretizável da velha ideia de república de bem-estar social e nenhuma das suas componentes pode ser desprezada, porque a liberdade, naturalmente assente no direito, é sobretudo a protecção do mais fraco face ao mais forte e é decisiva na realização do Estado de direito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a minha observação só terá, porventura, justificação no facto de, sendo este o primeiro artigo em que esta questão se está a equacionar, valer a pena, talvez, enunciar uma preocupação.
Em relação a este artigo 1.º, como a outros, estamos colocados perante uma situação que nos é a todos bastante familiar, ou seja, todos conhecemos a génese desta norma, os trabalhos da Assembleia Constituinte, as revisões constitucionais, a função do dispositivo, as suas redacções sucessivas e o seu papel, neste caso, como artigo primeiro dos princípios fundamentais.
Ora, porque estamos numa revisão constitucional, era aqui que gostaria de tecer uma consideração relâmpago. É que estando nós a fazer uma revisão constitucional e não, de facto, uma constituição ex novo, em que pudéssemos escrever num papel ou numa folha branca que a República portuguesa é uma república soberana, fundada na dignidade da pessoa humana, na vontade do povo português, na liberdade, na justiça e na solidariedade social, como diz o PP, ou, como diz o PSD, omitindo a alusão à liberdade por a mesma estar compreendida na dignidade da pessoa humana, mas, nesse caso, tudo estaria compreendido na dignidade da pessoa humana e, então, a Constituição reduzia-se a uma palavra, dignidade, o que é manifestamente um exagero, podemos desdensificar, desagregar e especificar um pouco.
Se estivéssemos a escrever numa folha branca tais palavras, porventura, a redacção não despertaria uma particular emoção e apenas teríamos a preocupação de aditar um elemento dinâmico que movesse todo esse corpo de regras num sentido positivo, num sentido de progresso. E nisso se distinguem também, tradicionalmente, as várias famílias políticas e correntes de pensamento, em conformação com o status quo e com a sociedade da desigualdade, da falta de liberdade, das várias iliberdades e antiliberdades que gravitam. Enfim, a ideia de que o devir social deva ter uma dinâmica que o aproxime de patamares superiores de realização.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Posso fazer-lhe uma pergunta?

O Sr. José Magalhães (PSD): - Sr. Deputado, permita-me que conclua porque serei brevíssimo.
Mas como estamos em revisão constitucional, temos de pensar em termos de valores acrescentados, aperfeiçoamento, densificações virtuosas, em acrónimo, VAADV, ou seja, onde é que está o valor acrescentado, a densificação virtuosa ou o aperfeiçoamento?
Em nada, ou seja, a única coisa que as propostas acarretariam era alguma incerteza hermenêutica sobre se o legislador teria querido alterar algumas das componentes da definição de República portuguesa e reduzir ou reinterpretar a definição constitucional tal qual resulta das suas redacções e, designadamente, do trabalho já elaborado no quadro das revisões.
Ora, nessa matéria, não vemos valor acrescentado, bem pelo contrário, e algumas redacções poderiam introduzir controvérsia, aí onde a doutrina estabeleceu, bastante razoável e cultamente, uma boa elaboração na base do texto vigente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Barbosa de Melo não pôde interromper, mas tem a palavra para interpelar.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, era só para ouvir o Sr. Deputado José Magalhães discretear tão sabiamente sobre esta questão e, porque a questão é a da liberdade, para perguntar o que é que diz de uma redacção nos termos seguintes: "Na dignidade da pessoa humana, na vontade popular, na liberdade, na solidariedade e na justiça social", sem que se refira aí "na construção", como se uma sociedade fosse um edifício a ser construído tijolo a tijolo. Isto é, o que é que diz a uma proposta de eliminar esta fórmula e ir para a outra?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, essa proposta teria de ser confrontada, precisamente - e foi essa a minha preocupação - com o critério que há pouco enunciei e que suponho ser um critério razoável, que é o do valor acrescentado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - É uma mudança de quadrante!

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma mudança virtuosa porque a mudança de quadrante..

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Tomo nota! É uma mudança de quadrante!

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu percebo, e essa mudança de quadrante e de filosofia relativizadora, desenformadora e incertificadora seria empobrecedora daquilo que a doutrina estabelece razoavelmente. E isso traz razões redobradas para a não aceitar!

Risos.