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SEPARATA — NÚMERO 92

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PROJETO DE LEI N.º 873/XIII (3.ª)

ALTERA O DECRETO-LEI N.º 11/2008, DE 17 DE JANEIRO, QUE APROVA O REGIME DE EXECUÇÃO

DO ACOLHIMENTO FAMILIAR

Exposição de motivos

A possibilidade de atribuição da confiança da criança ou jovem a uma pessoa singular ou a uma família,

habilitadas para o efeito, visando a sua integração em meio familiar, bem como a prestação de cuidados

adequados às suas necessidades, bem-estar, educação e desenvolvimento integral consta da Lei de Proteção

de Crianças e Jovens em Perigo, a qual prevê, expressamente, no seu artigo 35.º, alínea e), a medida de

acolhimento familiar como uma das medidas de promoção e proteção das crianças e jovens em risco,

prevendo ainda a referida lei que legislação própria regulamentaria o regime de execução das medidas aí

previstas.

O Regime de Execução do Acolhimento Familiar viria assim a ser regulamentado através do Decreto-Lei n.º

11/2008, de 17 de janeiro. Aí se clarificaram regras várias, nomeadamente a de que o acolhimento familiar

«consiste na atribuição da criança ou jovem a uma pessoa singular ou a uma família, habilitadas para o efeito,

e visa a integração da criança ou do jovem em meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas

necessidades e bem-estar e a educação necessária ao seu desenvolvimento integral» (artigo 2.º), bem com a

de que tais pessoas ou famílias não poderão ter «qualquer relação de parentesco com a criança ou jovem»

(artigo 7.º).

Volvida uma década sobre a publicação do Decreto-Lei n.º 11/2008, todos os relatórios e análises que se

debruçaram sobre a sua aplicação convergem no reconhecimento de que o número de famílias de

acolhimento permaneceu sempre muito aquém das expectativas criadas com a consagração desta medida. Na

verdade, existirão, hoje, em todo o país, menos de 190 famílias a assegurar esta resposta social, tendo-se

assistido, inclusive, nos últimos anos, a uma redução progressiva desse número.

Constatando-se que o Regime de Execução do Acolhimento Familiar logrou densificar particularmente os

direitos e obrigações daqueles que se predispõem a exercer o acolhimento familiar «a titulo de atividade

profissional principal ou secundária» [artigo 14.º, 1, f)], aos quais confere, para além do mais, uma «retribuição

mensal pelos serviços prestados» bem como um «subsídio para a manutenção, por cada criança ou jovem»

[artigo 20.º, 3, d) e e)], exigindo, em contrapartida, para além do mais, «a inscrição do responsável pelo

acolhimento familiar na respetiva repartição de finanças como trabalhador independente» (artigo 21.º, 2), a

verdade é que a lei, apesar de prever que o serviço de acolhimento possa também ser prestado gratuitamente,

limitou-se, quanto a esta modalidade, a uma genérica previsão, fazendo aplicar a essas situações, no artigo

44.º, aqueloutro regime «com as alterações decorrentes da natureza não onerosa do contrato».

Residirá certamente, aqui, na completa ausência de previsão legal que atente devidamente à situação de

todos aqueles que estariam predispostos a acolher temporariamente crianças ou jovens em perigo, de modo

gratuito, uma das razões para o reduzido número de famílias que esta resposta social hoje experimenta.

Na verdade, não reconhecer — como a lei hoje não reconhece — àqueles que se predisponham a acolher

crianças ou jovens, sem nada receberem por isso, que as despesas por si suportadas com esse acolhimento

não possam ser, nomeadamente, fiscalmente dedutíveis, corresponde, na prática, a fazer tais pessoas ou

famílias pagarem para desempenhar um tão relevante papel social.

Do mesmo modo, dificilmente se compreenderá que aquele que tenha, temporariamente, a seu cargo uma

criança ou jovem em perigo, não possa, nomeadamente em caso de assistência hospitalar ou outra ao menor,

ver reconhecida em tal motivação — consubstanciando, tantas vezes, momentos de especial vulnerabilidade

do menor —, uma justificação de falta, com as legais consequências.

Não é, numa palavra, justo que quem se predisponha a exercer uma função social relevante de modo

gratuito, na prática, continue a ter apenas de suportar prejuízos para o poder fazer. Fácil será, aliás,

compreender porque, mau grado o altruísmo que tantas vezes é reconhecido à sociedade portuguesa e não

obstante o inegável relevo social do acompanhamento familiar, tão poucos se tenham predisposto, até hoje, a

fazê-lo.