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4 DE MAIO DE 2022

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PROJETO DE LEI N.º 36/XV/1.ª

PREVÊ O CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL, PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA SEXTA ALTERAÇÃO

AO CÓDIGO PENAL E À VIGÉSIMA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO

Exposição de motivos

A Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a

Violência Doméstica, adotada em Istambul, a 11 de maio de 2011, no seu artigo 40.º estabelece que «as

partes deverão adotar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que

qualquer tipo de comportamento indesejado de natureza sexual, sob forma verbal ou física, com o intuito ou

efeito de violar a dignidade de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidativo, hostil,

degradante, humilhante ou ofensivo, seja passível de sanções penais ou outras sanções legais».

O assédio sexual é um grave problema social que, para além de violar direitos fundamentais, constitui um

comportamento que produz elevados danos na vítima, nomeadamente psíquicos, económicos e sociais.

Estima-se que uma em cada três mulheres tenha sido ou é, presentemente, vítima de assédio sexual no

local de trabalho, sendo este um dos principais fatores que afetam a saúde de trabalhadores e trabalhadoras

em todo o mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Sendo uma das diversas formas de violência de género, que afeta sobretudo as mulheres, reveste

indubitavelmente contornos insidiosos, quer no espaço público, quer nos locais de trabalho, onde assistimos a

uma quase total impunidade por parte dos agressores e uma falta de proteção das vítimas.

Esta falta de proteção está muito enraizada naquela que tem sido uma verdadeira aceitação social do

assédio, uma vez que com a normalização deste tipo de comportamento as vítimas desenvolvem mecanismos

de internalização e uma autoculpabilização pelas ações de terceiros.

A ausência de condenações e de cumprimento de penas efetivas desvirtuam o objetivo das sanções

penais, nomeadamente a sua prevenção geral e especial e a sua capacidade para defesa de bens jurídicos

essenciais, demonstrando à sociedade uma desvalorização da violência sexual e do impacto desta na vida das

vítimas.

O mesmo acontece quando se transfere para qualquer comportamento da vítima a tentativa de justificação

que conduza à atenuação da culpa do agressor quanto a atos sexuais não consentidos, perpetuando a

existência de um sistema judicial misógino e que menoriza e desconsidera os crimes de natureza sexual, os

danos morais, físicos, emocionais e psicológicos provocados às vítimas.

O princípio da dignidade da pessoa humana e a superioridade inerente em relação ao património impõem

que os crimes contra a liberdade sexual das pessoas não possam ter penas efetivas semelhantes a crimes

patrimoniais pouco graves ou «bagatelas» penais.

As alterações legislativas efetuadas em 2015, que abrangeram os crimes de violação, coação sexual e

importunação sexual, pretenderam dar cumprimento ao disposto na Convenção do Conselho da Europa para a

Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica.

Porém, a figura da importunação sexual, revestida de conceitos amplos, indeterminados e de natureza e

gravidades diversas, é a norma jurídica que é quase sempre utilizada quando se fala de assédio sexual. No

nosso entendimento, tal não se afigura suficiente.

Se falamos de condutas e de um problema social que afeta mais de metade da população atual, a

criminalização destes comportamentos e a cabal proteção do bem jurídico em causa torna-se absolutamente

essencial.

A autonomização do crime de assédio sexual daria não só cumprimento à Convenção de Istambul, como

responderia aos anseios sociais prementes e da própria tendência do Direito Internacional que tem procurado

combater todas as formas de violência de género.

Ainda que se entenda que alguns comportamentos normalmente caracterizados e socialmente designados

como assédio sexual possam subsumir-se ao previsto para o crime de importunação sexual, o Código Penal é

tímido no que diz respeito à proteção do bem jurídico. A própria fraqueza do conceito de «importunação»

demonstra o intrínseco desdém de uma sociedade patriarcal.

Por outro lado, o Código do Trabalho prevê, no seu artigo 29.º, a proibição da prática de assédio,