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3 DE SETEMBRO DE 1975 1155

Para já não falar através de monopólios que dependam essencialmente de grupos culturais e sociais e até, evidentemente, de classes.
Eu queria, por exemplo, citar aqui um caso muito recente, em que a liberdade de aprender já está limitada no nosso país.
Essa liberdade por que nós lutámos cá dentro e lá fora.
O Ministério da Educação, da Investigação e da Cultura, creio que é assim que se chama agora, publicou recentemente um comunicado em que diz que não poderá dar o parecer favorável à frequência de cursos no estrangeiro, por certas razões, entre elas o facto de faltar ainda uma planificação das nossas necessidades. De tal modo que, alegando alguns candidatos a estudo no estrangeiro que não há cursos correspondentes em Portugal, o Ministério não é capaz de poder dar uma resposta, porque não sabe se, efectivamente, esses domínios interessam ou não ao povo português.
Mais. Alega-se que a saída para o estrangeiro acarreta um «prolongado afastamento das realidades sócio-políticas nacionais, o que representa uma importante lacuna para a posterior adaptação à nossa sociedade».
Srs. Deputados, Sr. Presidente: Que longe nós estamos de António Sérgio, que quando propunha uma Junta para promover os estudos no estrangeiro estava a permitir que se tivesse, talvez, evitado a implantação do fascismo no nosso país. Que longe estamos, efectivamente, dessa abertura ao mundo contemporâneo, em todos os aspectos em que hoje se está a verificar uma renovação no domínio científico, no domínio literário e no domínio artístico.
Posso dar um testemunho. Beneficiei indirectamente - foi o único benefício que tirei do meu exílio - do acesso a certos domínios que ainda hoje em Portugal, no plano, por exemplo, da linguística e da semiologia, não têm no nosso ensino um tratamento moderno, um tratamento aberto ao presente e ao futuro.
Por que é que se vem agora impedir, sob o pretexto de que ainda não há um planeamento, certos investigadores, certos dos nossos pintores, eventualmente certos dos nossos músicos, de irem ao estrangeiro buscar aquilo que nós, devido ao nosso subdesenvolvimento, ainda não lhes podemos dar?
Se nós não consagrarmos, ao lado da liberdade de aprender, o direito de aprender, que inclui, evidentemente, o direito de poder aprender em Portugal e no estrangeiro (porque a cultura não tem lugar, a cultura é universal), se nós não reconhecermos, de uma maneira clara, esse direito, estaremos a permitir, talvez, que um qualquer poder que se arrogue o monopólio da orientação, do dirigismo cultural no nosso país; venha a exercer a sua implacável lei sobre todos aqueles que aspiram à liberdade de aprender e, evidentemente, à liberdade de ensinar.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Moura.

O Sr. Manuel Moura (PS): - Sr. Presidente: Era só um pedido de esclarecimento ao orador. Eu queria perguntar ao Sr. Deputado José Seabra se entende que, portanto, esta liberdade que está aqui consagrada é para si o exercício de uma liberdade? Se isso não se pressupõe já, portanto, da liberdade de existir alguma coisa, que talvez um direito?

(O orador não reviu.)

O Sr. José Augusto Seabra: - Evidentemente! Mas eu quero ainda acrescentar um outro argumento. É que toda a gente sabe que em certos países, particularmente em países laicos, tem havido uma utilização da expressão «liberdade de ensinar» (por exemplo, o enseignement libre, em França) que tende a introduzir, efectivamente, uma defesa de privilégios por parte, até, de certas conversões religiosas, como poderá acontecer, também, no caso de certas opções ideológicas. Por isso, se nós, além do termo «liberdade de aprender e de ensinar», incluirmos o termo «direito», estamos, efectivamente, a defender também uma igualdade de todos os cidadãos no acesso ao ensino. Uma igualdade, pelo menos, potencial, porque, evidentemente, as condições económico-sociais que existem ainda não permitem essa igualdade, e ela não existe hoje, propriamente, em nenhum país, o que existe é uma tendência para essa igualdade. Portanto, nós teremos também que consagrar o direito, por exemplo, dos analfabetos a terem acesso à alfabetização, o direito dos trabalhadores a poderem ter acesso não só ao ensino primário e secundário, mas à Universidade. Teremos, portanto, através dessa formulação, não apenas um reconhecimento de uma liberdade, mas também um reconhecimento de um direito, que tenderá a concretizar-se cada vez mais.

O Si. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira pediu a palavra para esclarecimentos.

O Sr. Vital Moreira: - Dois pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Seabra. O primeiro é o seguinte:
O Sr. Deputado considera que um decreto do Governo que estabeleça normas gerais, estabelecendo condições para a concessão de bolsas de estudo, para estudos no estrangeiro, considera que isso seria inconstitucional à base deste artigo, se fosse aprovado?
Segunda pergunta:
Pareceu-me deduzir das palavras do Sr. Deputado, nomeadamente da proposta de alteração ou de substituição, que considera que não basta ter a liberdade para ter o direito. É isso que o Sr. Deputado pensa?

(O orador não reviu.)

O Sr. José Augusto Seabra: - Quanto à necessidade de um planeamento no que diz respeito ao ensino, no que diz respeito à investigação, eu reconheço-a efectivamente, e essa necessidade impõe-se num país que tem certas prioridades fundamentais. Mas o que eu quis acautelar, através do reconhecimento constitucional de um direito, foi a utilização dessa forma de planeamento para impedir quem quer que seja de se deslocar ao estrangeiro com meios