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1152 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 41

correspondência com o respeito devido pelo Estado a esta dimensão essencial da pessoa humana. O n.º 1 deste preceito declara a inviolabilidade da consciência,, da religião e culto em cada uma das pessoas, individualmente consideradas, incluindo obviamente o direito à liberdade de não professar qualquer religião e de manifestar isso mesmo.
O n.º 2 e o n.º 3 reconhecem às igrejas, comunidades e confissões religiosas em geral, em pé de igualdade, a liberdade de acção e de organização perante o Estado para o culto, para a formação dos respectivos ministros, para o ensino e para a difusão, por meios de comunicação social próprios, das respectivas doutrinas. Reafirma-se assim claramente o princípio da separação de poderes entre o Estado e as confissões religiosas, assegurando uma forma institucional que a experiência mostra ser o meio adequado para se evitarem as influências nefastas do poder civil sobre as igrejas e as influências nefastas das igrejas sobre o poder civil.
Dizemos no n.º 5 do artigo 20.º do nosso projecto de Constituição que «são reconhecidos especificamente às confissões religiosas, em condições de igualdade:
a) O direito de constituição e manutenção de estabelecimentos de educação e de utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas finalidades;
b) O direito de dar assistência aos seus fiéis, incluindo os que se encontrem em estabelecimentos hospitalares e penais ou em serviço nas forças armadas, e de lhes dar enterramento nos cemitérios públicos;
c) O direito de comunicar livremente com as autoridades religiosas de dentro ou fora do País.»
Ora, o texto aprovado, nas suas fórmulas sintéticas, inclui todos estes direitos que nós tínhamos especificado - e aliás não só esses -, pelo que satisfaz as exigências que reputamos essenciais para uma correcta organização da comunidade política portuguesa.
Não quereria deixar também de declarar que votámos a particular especificação do direito à objecção de consciência prevista no n.º 4 deste artigo na certeza de que tal especificação em nada prejudica o princípio geral consagrado no n.º 1 deste artigo, que garante a todos a inviolabilidade de consciência. A chamada especial feita quanto ao problema do serviço militar explica-se par razões históricas conhecidas e pela circunstância de ser um caso exemplar de garantia da inviolabilidade de consciência.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora a título exclusivamente pessoal, não posso, em consciência, deixar de fazer a seguinte declaração de voto sobre o conjunto dos números deste artigo.
A aprovação deste artigo marca mais um importante ponto de viragem na vida da comunidade portuguesa,
ao estabelecer uma independência real e recíproca entre o Estado e as igrejas.
Há muitos séculos que era tradição portuguesa tristíssima tradição, aliás - a intervenção constante do poder político na vida das comunidades religiosas e a inexistência de liberdade religiosa. Sem falar já das outras comunidades religiosas, a própria igreja católica foi utilizada através dos tempos pelos detentores do poder para atingir os seus objectivos - e quase todos eles pretendendo que as intervenções abusivas praticadas tinham em vista a defesa da mesma igreja.
Este regalismo começou na monarquia absoluta, na época da centralização do poder real, e manteve-se ou até mesmo se agravou na monarquia constitucional, em que a intervenção estatal na vida da igreja católica foi ao ponto de transformar praticamente os membros do clero em funcionários públicos e de proibir a circulação de documentos pastorais sem o beneplácito do Governo.
Embora a I República tivesse posto termo a esta situação, não se coibiu, no entanto, de limitar por outras formas alguns direitos da Igreja: lembremos apenas a expulsão das ordens e congregações religiosas e a intromissão abusiva na própria organização eclesial, nomeadamente através da imposição e regulamentação das chamadas associações de culto.
Da ditadura salazarista nem vale a pena falar: a Igreja foi instrumentalizada, numa primeira fase do regime; não se negue que, nesta fase, houve ligação recíproca entre a Igreja e o regime, mas não se esqueça que outras forças conhecidas também a mantiveram e vieram a prolongar a sobrevivência do regime opressor até muito mais tarde.
Através da Concordata, o Estado estabeleceu uma situação que, à primeira vista, seria de privilégio para a Igreja mas que, na prática, impedia a sua liberdade critica e criadora.
Assim, o Estado intervinha na nomeação dos bispos residenciais e coadjutores, e verificavam-se diversas outras intervenções que ficaram claramente demonstradas ao longo do tempo.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a partir da aprovação deste artigo marca-se um ponto de viragem fundamental: a Constituição vai consagrar uma nova era de real independência recíproca entre o Estado e as igrejas, nomeadamente a igreja católica. Resulta do texto aprovado que nunca mais será lícito ao Estado impor aos cidadãos por força, medo, ou qualquer outro meio, a profissão ou rejeição de determinada religião nem recorrer por qualquer modo à força para destruir ou dificultar a religião, mesmo que só em determinada região ou a grupo determinado da sua população.
Nunca mais impedirá quaisquer comunidades religiosas de se regerem segundo as suas próprias normas; não evitará a escolha, formação, nomeação e transferência dos próprios ministros; não impedirá a comunicação com as autoridades e comunidades religiosas de outras partes do mundo; não impedirá a construção de edifícios religiosos ou outros e a aquisição dos bens julgados convenientes; não impedirá o ensino e o testemunho público por palavra e por escrito da sua fé e certamente que também não virá a impedir a explicitação da eficácia especial das suas doutrinas