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3 DE SETEMBRO DE 1975 1153

para ordenar a sociedade humana e vivificar toda a actividade dos homens.
Quero também congratular-me com o facto, já aqui apontado, de não se entender a liberdade religiosa como o ditador Salazar e todos os outros ditadores, sejam eles quais forem, a entendem e como é, portanto, entendida em todos os Estados totalitários: a simples liberdade de culto ou de prática.
Com efeito, consagra-se, e bem, embora não com a redacção mais pormenorizada do projecto do meu partido, mas, como já foi dito pelo meu companheiro Leite de Castro, numa redacção que inclui a liberdade religiosa na sua plenitude, incluindo a liberdade de as confissões religiosas livremente se organizarem, ensinarem e disporem de meios de comunicação social.
Finalmente, penso que o reconhecimento da objecção de consciência é uma inovação relevantíssima e é mais um marco na construção de uma sociedade assente na pessoa humana, respeitadora da sua eminente dignidade, dos seus direitos e das suas liberdades fundamentais:
Tenho dito.

(O orador não reviu.)
Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Vamos passar então à apreciação do artigo seguinte, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 28.º

1 - É livre a criação intelectual, artística e científica.
2 - Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a protecção legal dos direitos de autor.

O Sr. Presidente: - Não temos propostas na Mesa relativas a este artigo, pelo que ponho em apreciação a texto proposto gela Comissão. Alguém deseja usar da palavra?
Tem a palavra a Deputada Sophia de Mello Breyner.

A Sr.ª Sophia de Mello Breyner (PS): - Peço a palavra para dar o meu apoio ao artigo 28.º e ao artigo 29.º.
Num país e num mundo onde há famílias sem casa e doentes sem tratamento e sem hospital a questão da liberdade de criação artística e intelectual pode parecer uma questão secundária.
Mas sabemos que a cultura influi radicalmente a estrutura social e a estrutura política.
E por isso a questão da liberdade da cultura é uma questão primordial.
E sabemos que toda a cultura real trabalha para a libertação do homem e que por isso toda a «cultura real é, na sua raiz, revolucionária.
E sabemos que não poderemos construir de facto o socialismo se não ultrapassarmos o uso burguês da cultura.
Pois a cultura não é um luxo de privilegiados, mas uma necessidade fundamental de todos os homens e de todas as comunidades.
A cultura não existe para enfeitar a vida, mas sim para a transformar - para que o homem possa construir e construir-se em consciência, em verdade e liberdade e em justiça. E, se o homem é capaz de criar a revolução, é exactamente porque é capaz de criar cultura.
Como disse Amílcar Cabral, na frase há dias citada por Manuel Alegre, «a revolução é um acto de cultura».
E é por isso que existe sempre uma profunda unidade entre a liberdade de um povo e a liberdade do intelectual e do artista.
Não é por acaso que o Chile é neste momento o país do Mundo onde há mais intelectuais presos.
No princípio da guerra de Espanha, na Universidade de Salamanca, o general Milan Astray gritou: «Morra a inteligência.» Este grito pertence à essência do fascismo.
Durante quarenta e oito anos a maioria dos escritores, artistas e intelectuais portugueses lutaram contra o fascismo. E ao lutar sabiam que não lutavam apenas pela sua liberdade, que não lutavam por uma «liberdade especializada», mas que lutavam pela libertação do povo a que pertencem e pela justiça e pela verdade da vida.
E a liberdade de expressão e de cultura, e nomeadamente a liberdade de crítica, é intrinsecamente necessária à busca e à construção da justiça. A justiça não se constrói com dogmatismos indiscutíveis, nem com maximalismos irreais, nem com demagogia, nem com cabotinismo cultural.
Precisamos de uma revolução culturalmente apta a fazer constantemente o seu exame de consciência. A verdadeira vigilância revolucionária é a lucidez revolucionária. Sem liberdade de crítica nunca se pode aprender verdadeiramente «a lição do errou. Sem liberdade crítica não há cultura verdadeiramente participante. A crítica é orgânica.
Somos um país que tem às costas séculos de inquisição e meio século de fascismo, com censura, prisões, escritores e pintores e intelectuais exilados, livros proibidos, exposições proibidas, projectos que nunca se ergueram.
E vivemos num tempo em que nos países totalitários do Leste e do Ocidente aqueles intelectuais que têm a coragem de falar têm expiado e expiam essa coragem nos campos de concentração, nas prisões, nos asilos psiquiátricos.
De tudo isto queremos emergir.
Queremos uma relação limpa e saudável entre a cultura e a política. Não queremos opressão cultural. Também não queremos dirigismo cultural. A política, sempre que quer dirigir a cultura, engana-se. Pois o dirigismo é uma forma de anticultura e toda a anticultura é reaccionária.

Vozes: - Muito bem!