58 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
pulares. É assim que, pelo codigo administrativo, junto aos governadores civis funccionam as commissões districtaes, como junto aos administradores funccionam as camaras municipaes.
Se se alarga a esphera deliberativa dos corpos administrativos, diz-se que o regimen é descentralisador; se as attribuições dos representantes populares são restringidas, o regimen é centralisador, visto como o poder central tem uma gerencia mais directa nos negocios da administração local.
Só cabe a de descentralisação a povos que tenham uma certa cultura e zêlo pelo bem commum.
Todos sabem isto. O sr. relator pareceu esquecer-se, e por isso permitta-me lembrar-lhe que tinha eu dito que da allegação do relatorio ao governo sobre a dificuldade de relações com on Açores, dificuldade que eu contesto, só se podia concluir ser necessario alargar as attribuições dos governadores civis açorianos.
Com effeito, nunca governo algum se lembrou de abandonar a si mesmos os povos que gere, por haver difficuldade de relações; o que se tem feito e deve fazer é dar mais poderes aos seus representantes. Mas dal-os aos corpos administrativos é reconhecer a impotencia governativa da metropole.
De resto, só porque os governadores civis açorianos tivessem mais attribuições do que os do continente, por isso não haveria menos liberdade para os açorianos, porque, como disse, o que caracterisa os regimens liberaes administrativos é a descentralisação, e para elles concorrem dois factores - a auctoridade do poder central e a dos corpos electivos.
Ora, a auctoridade do poder central não se modifica nos effeitos de restrição ás garantias populares, só porque, em vez de ser o ministro do reino que a exerce mais directamente, a delega com mais amplidão ao seu representante. O governador civil ou o ministro do reino que cumprissem o codigo administrativo, isso seria indifferente aos açorianos, salva a confiança pessoal, que não entra para a discussão.
Para administrar os povos, segundo uma dada lei, que importa, para a defeza das liberdades, que essa lei seja executada por um representante local do ministro do reino ou que seja o ministro do reino o directo executor, por meio postal ou telegraphico?
Um principio é isto, na pratica a preferencia está no primeiro da casos, se houver dificuldades de relações, o que só allega no relatorio do governo. Porque a administração publica deve ser prompta, eficaz e vigilante.
O sr. relator disse que não é novo o regimen do excepção na nossa legislação administrativa, e fallou, para o comprovar, nos concelhos autonomos.
Perfeitamente, é um regimen de excepção, mas como eu o comprehendo e justifico!
O codigo dictactorial de 1886 permittiu um regimen mais livre aos municipios de população superior a 40:000 habitantes com actividade industrial, isto é, com uma grande cultura, porque no nosso tempo a melhor medida da cultura dos povos é a sua intensidade industrial.
Mas quid inde? São os açorianos mais cultos que os povos da metropole? Só o são, é um triste reconhecimento este para um povo dominador.
Salvemos o decoro politico e administrativo. Eu não negaria aos açorianos regimen do excepção ou qualquer regimen livre, mas reivindical-o-ia tambem para os districtos da metropole.
E por ultimo o sr. relator pareceu estranhar, a proposito de uma minha referencia á Irlanda, que eu approximasse os regimens politicos dos administrativos. Ora essa! Quem ha que possa fazer uma tal distincção entre politica e administração, principalmente hoje que a evolução dos povos se opéra pela administração fiscal, industrial, moral e juridica, constituindo tudo isto a acção politica dos estados?
Não o disse, mas podia tel-o dito - que nós vamos crear uma especie de parlamentos nos Açores.
Por esta nova organisação os povos açorianos, alem de gosarem de todos os direitos que têem os do continente, em materia tributaria o administrativa, ficam com muito mais do que estes, ficam com corpos administrativos contenciosos e deliberativos, e, como se não fôra muito, ainda lhes assistem os chamados direitos politicos perante o parlamento nacional. Quer dizer, por este projecto um açoriano é chamado, como cidadão, a escolher representantes districtaes com largas funcções que não existem no continente.
É, pois, contra este regimen administrativo que se quer dar áquelles povos que eu protesto. São limitadas pela lei as attribuições deliberativas das juntas geraes açorianas? Pudéra! Tambem o são as attribuições deliberativas das côrtes ordinarias.
Fica por esta fórma esclarecida a idéa. Não haja confusão de termos.
Tenho dito.
O sr. Cunha e Silveira: - Pedi a palavra unicamente para, na minha qualidade de deputada pelos Açores, definir o meu voto sobre o projecto que se discute e não para ter ensejo do responder ao meu illustre collega o sr. Carneiro de Moura, visto que já o fez, e muito bem, o illustre relator do projecto, certamente melhor do que eu o poderia tentar.
Dou o meu voto ao projecto porque elle attende por completo aos pedidos e instantes aspirações do districto de Ponta Delgada, mas não porque traduza completamente os desejos dos outros districtos, pelo menos d'aquelle que eu tenho a honra de representar n'esta casa, o de Angra do Heroismo. Voto n'esse sentido para ir de accordo com o espirito de solidariedade que entendo deve existir entre todos os districtos açorianos.
Como disse, não é meu intuito responder ás considerações feitas pelo sr. Carneiro de Moura. Em todo o caso levantarei o reparo, on, por assim dizer, a queixa formulada por s. exa. de que o projecto vae dar aos Açores mais alguma cousa do que se tem dado ao continente. Se o resto do paiz não tem tudo isto que se dá aos povos açorianos é porque não quer ...
(Interrupção do sr. Carneiro de Moura.}
O sr. Presidente: - Peço que não interrompam o orador.
O Orador: - Nem mais nem menos. Os Açores ficam apenas em apparente desigualdade com o continente do reino.
Creio que no espirito da camara não ficará duvida de que as relações entre aquelles povos e a mãe patria se estreitarão mais por esta fórma, visto a annuencia d'ella, satisfazendo ás aspirações dos mesmos povos.
Repito, o meu voto em sentido favoravel ao projecto é simplesmente porque elle attende ás condições especiaes, aos desejos e instancias do districto de Ponta Delgada, e não porque satisfaça cabalmente ao districto de Angra. Eu não queria outro tanto. Ambiciono, porém, alguma cousa differente do que está.
Finalmente, dou ainda o meu voto ao projecto, por isso mesmo que elle torna dependente a applicação da organisação aduaneira que faz parte da presente lei, apenas do pedido dos povos. Se alguma vez o fizerem, estarei com elles.
Tenho dito.
O sr. Teixeira de Sousa (relator):- Impugna a affirmação do sr. Carneiro de Moura de que o governo deu e a camara vae votar um verdadeiro parlamento para os Açores, pois se as juntas geraes de districto são parlamentos, parlamento é tambem a junta de parochia da Al-