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384-D DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

fez parte. E lamento-o e sinto-o tanto mais, por s. exa. estar ausente do paiz, como a camara sabe, por motivo de doença grave de pessoa de sua familia, que deve ferir a sua alma de pae extremoso, fazendo eu sinceros votos por que cesse tão doloroso motivo.

Nada direi na minha apreciação do seu governo e do seu discurso sobre este projecto, que possa maguar o menos ainda offender pessoalmente os bons creditos e a honra do homem digno, a quem me ligam cordiaes relações e que considero como um cidadão honesto, laborioso e respeitavel ; mas que, como estadista, como politico, como o apregoado e recommendado salvador da nação, me não merece o mesmo conceito, porque a sua mesquinha obra o não vale, nem lhe posso tributar a homenagem que se deve aos grandes homens, aos benemeritos patriotas e consummados estadistas que souberam prestar relevantes e inolvidaveis serviços ao seu paiz. Não me parece que s. exa tenha direito a ser considerado como tal, e tão pouco possa ter o de vir aqui fallar tão de alto e indignado, accusando todos e condemnando tudo, com manifesta injustiça e sem rasão, dizendo que todas as culpas são nossas, são do actual governo, que agora vae entregar o paiz algemado ao estrangeiro!

Assim, com tão extraordinaria e audaz attitude, pensa o sr. Dias Ferreira que faz esquecer as suas grandes responsabilidades e do seu governo, na triste situação que nos afflige, que são tão importantes, ou mais ainda, do que as dos ministros que lhe succederam ?

Pois engana-se!

Foi s. exa. quem deu o primeiro o mais fundo e perigoso golpe no nosso já abatido credito no estrangeiro, não sabendo negociar, nem tendo uma noção exacta do que pretendia, do que era preciso e conveniente! Foi s. exa. quem mais nos comprometteu e até vexou perante os credores externos, promettendo e faltando, avançando hoje para recuar ámanhã, expondo o bom nome do paiz ao que se soube e viu, augmentando com o seu procedimento incorrecto, o descalabro das nossas finanças!

Lá fóra, isto; cá dentro, a anarchia e a desordem em todos os ramos da administração publica. Uma tal embrulhada de leis, de decretos, de ordens, baralhando e confundindo tudo com notavel prejuizo dos serviços administrativos e judiciaes, (Apoiados.) sem orientação nem criterio, que assombraram os funccionarios e levantaram em toda a parte duvidas, queixas, reclamações, pelas flagrantes contradicções, pelo reconhecido desacerto! Era um cahos, uma barafunda inexplicavel! (Apoiados.)

E sobre tudo isto, a violenta imposição de um pesadissimo augmento de contribuições I Mais de 10:000 contos de réis! 10:000 contos de réis de impostos! Mas fizesse o paiz esse enorme sacrificio e estaria salvo por uma vez, dizia-se! Eram as promessas. Os calculos não falhariam.

Eram certos, exactos, verdadeiros! Não havia orçamentalogia. 10:000 contos de réis, as ultimas gotas de sangue dos arrasados contribuintes, mas já, e ninguem receasse! Ou isto, que era a salvação; ou a perda da nossa autonomia, a deshonra, a miseria, a vergonha, com todo o seu horroroso cortejo de desgraças! O paiz, este desventurado e honradissimo paiz, bem digno de melhor sorte, deu os 10:000 contos de réis. Deu mais, muito mais! Deu tudo ao novo Messias, ao decantado redemptor, e depois viu a maneira coma elle o salvou. Escuso de a relembrar! Os seus effeitos estão patentes. Tudo inutil, tudo perdido! (Apoiados.) O mal aggravado em tão pouco tempo e quasi sem remedio ! O salvador falhou por completo! Parece que agora ainda tenta nova salvação!... Os juros da divida interna foram reduzidos, os magros vencimentos dos empregados diminuidos. Começou a miséria e a fome para as familias e até para os estabelecimentos pios que se sustentam da caridade dos bemfeitores, ao passo que se pouparam ao sacrificio geral, classes poderosas e ricas!... Era a inflexibilidade da justiça. Entendeu-se que com as reducções á fome, dos pobres, dos acommodados, dos pequenos, se havia de equilibrar o orçamento do estado; e que, faltando-se aos compromissos solemnes que se haviam contraindo, lançando assim mais uma onda de suspeição sobre o credito nacional, difficultando as negociações que depois se haviam de fazer, por força de circumstancias, estava tudo feito, estava a patria salva!..

Perdida, completamente perdida e para sempre é que ella estaria, se o redemptor não tem sido posto fóra dos bancos do poder, para que não podesse completar a sua obra, de ruina e descredito, com assombro e admiração de nacionaes e estrangeiros! (Apoiado".)

Este illustre professor da universidade de Coimbra, este notável causidico, que como tal tem reputação de meritos reconhecidos, que diga-se a verdade, mais lhe tem nenhum para estadista, para chefe de governo. A sua obra foi mediocre, ficou muito áquem do que se esperava! Foi apenas o que já disse, e mais a celebre lei de 26 de fevereiro de 1892, contendo a doutrina do artigo 10.°, que o auctor agora renega! Não soube aproveitar as circumstancias favoraveis unicas, que se lhe depararam!

Como politico, como deputado eleito pelo favor de todos os governos, fazia o seu já conhecido decurso annual, na resposta á falla da corôa, na discussão do orçamento, ou nas medidas de fazenda, repetindo no parlamento as sediças e insulsas phrases do estylo, "os nossos amigos, os costumes da terra, o jubileu, as pratas da casa, e a cantata sobre a constituição de 30 e a liberdade", apregoando-se e inculcando-se sempre como o unico salvador possivel do paiz, pela sua independencia dos partidos militantes, pela ausencia de compromissos com correligionarios, pela isenção e firmeza com que saberia resistir a pedidos e empenhes de quem quer que fosse, de alto a baixo, com processos novos de economia e moralidade, com uma boa norma de administração dos dinheiros publicos norteada pela sua longa experiencia e abstenção do poder de mais de vinte annos, etc., etc.

Esquecido o já tão longe 19 de maio de 1870, de pouco gloriosa memoria, a ultima revolta militar, a que o apregoado salvador deveu uma pasta, que até 1892 nunca mais lográra, azou-se então occasião à opportuna para se experimentarem os seus offerecimentos e promessas, os meritos de que fazia gala. Foi chamado a organisar gabinete.

Teve o apoio leal dos partidos, e o favor da opinião publica esperançada, emquanto não chegou o triste desengano. Do que elle fez, da maneira como governou, como cortou a fundo nos abusos, como emendou os erros, como foi forte, intransigente, sabio e justo, pratico e habil, nos interesses do paiz, interna e externamente, resa a historia do seu triste consulado, que aggravou a má situação, que contribuiu poderosamente para o estado; em que nos encontrâmos ! (Apoiadas.) A lição não podia ser mais cruel!

O desengano mais completo! A carrapata do celebre convenio feito e desfeito, a falta de seriedade nas negociações com os credores externos, as arrogancias de um dia traduzidas em vergonhosa fraqueza e hesitações no outro, arrastaram lá fóra o nosso bom nome e o nosso credito, por tal fórma, que foi esse lamentavel desastre o começo, a causa principal, dos que se lhe seguiram e irremediavelmente nos vieram conduzindo á desgraçada situação financeira de hoje! (Apoiados.}

Ora, sr. presidente, é por isso, por estas rasões que venho expondo a v. exa. e á camara, e que a final ninguem ignora, que eu o outro dia muito estranhei, e ainda agora estranho e censuro, que o sr. Dias Ferreira, que tem o seu nome indissoluvelmente ligado á ameaçadora derrocada financeira que nos póde subverter, venha aqui accusar o governo, atacar e combater violentamente o projecto da conversão, sem apresentar alvitre melhor, e ouse fallar accusando, em culpas e responsabilidades, como se elle as