4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
miseranda de um povo que entrega o pensamento á guarda dos esbirros policiaes que o encarceram! (Muitos apoiados).
Tudo em vão! A ditadura queria soltar os primeiros rugidos. Era preciso, Sr. Presidente, arrancar ás Cortes uma lei de coacção, para que ella pudesse, esmagar o país sob a sua tyrannia, que tinha de afogar-se em sangue!
Com effeito, em 2 de abril ficava votada pelas Cortes a lei de imprensa. Em 11 desse mês o Parlamento era violentamente encerrado, e dois dias depois a lei estava sanccionada e assinada pelo Rei. Não tinha decorrido um mês, e, em 10 de maio, o golpe de Estado rompia a marcha desordenada dessa ditadura ignominiosa, cujo epilogo foi o encerro do cadaver do Rei assassinado e do saudosissimo Principe Real no Pantheon de S. Vicente dê Fora!
Quem, Sr. Presidente, olhar serenamente estes factos, para os julgar á luz de um imparcial criterio de observador reflectido, verá que relação intima, teve a actual lei de imprensa com a ditadura, tão feroz que para exercer-se mais desafogadamente teve de ir mais longe, e renegar em novas providencias liberticidas a sua obra monstruosa! (Apoiados).
Esta lei fora feita—dizia-o aquelle que nesse tempo occupava a cadeira da Presidencia do Conselho de Ministros — para se acabarem as apprehensões e haver a maior celeridade nos processos. Nesse ponto cumpriu-se honradamente a sua palavra: porque as apprehensões substituiram-se, com o decreto inquisitorial de 20 de junho, pela suppressao arbitraria dos jornaes que não convinham á autoridade, e a brevidade dos processos reduziu-se... a uma execução summaria! (Apoiados).
Seja-me licito a mim, Sr. Presidente, que fui o mais obscuro dos soldados dessa gloriosa legião que se bateu contra a ditadura, exaltar a nobreza e a coragem com que a imprensa, resgatando nessa campanha muitos dos seus erros, serviu a causa da liberdade, de tantos outros abandonada, por fraqueza ou por impotencia! (Apoiados).
A ditadura, Sr. Presidente, não encontrou, embora armada com os seus decretos de excepção e com a sua lei de ignominia, mais audaz adversario do que a imprensa! (Apoiados).
Quando- os partidos politicos se limitavam a mandar mensagens ao Paço das Necessidades, tão repetidas como desattendidas, quando o absolutismo caminhava a passos agigantados para a absorpção de todas as garantias individuaes, preparando essa ditadura que ficou conhecida como a dos adeantamentos, foi nos jornaes, seguindo-se, embora tactica e processos de resistencia differentes, que se concentrou o ataque, foram elles que se constituiram em inexpugnaveis baluartes onde se refugiou a liberdade. (Apoiados).
Invocando-se os successos de 18 de junho, alguns jornalistas foram, com outros homens publicos, envolvidos no processo- da sedição, até com infracção das immunidades parlamentares que a alguns d’elles cercavam e defendiam.
Corria então o mês de agosto, e estavam feitas as pronuncias, que o Governo julgava bastarem para espalhar o terror, quando se fez e assinou esse decreto funesto que liquidava em ditadura os adeantamentos illegaes á Casa Real e aumentava a lista civil!
Supprimido o direito de reunião, dispersas e desanimadas as hostes partidarias, esgotados os chamados meios constitucionaes de resistencia, foi ainda a imprensa que, arrostando com o decreto de 20 de junho, sujeitando-se a todas as consequencias, não recuando espavorida deante da ameaça imminente das suspensões de jornaes, levantou a opinião publica num movimento de repulsão intensissimo contra esse decreto que foi a causa determinante de tudo o que succedeu neste país durante os tenebrosos meses com que se fechou o anno de 1907!
Alguns homens, apenas, isolados nas suas redacções, por cujas portas entravam os esbirros policiaes, fortes na intemerata convicção de dever cumprido, defendidos por essa invulneravel couraça que dá a serenidade da consciencia, altivos na missão nacional que exerciam, fizeram o que os partidos, com todas as suas dependencias não conseguiram realizar!
Elles sós, os jornalistas, valeram por exercitos contra a ditadura! (Apoiados).
Suspensos os jornaes, reappareciam d’ahi a um mês com a mesma intensidade e vigor no ataque, sempre destemidos, sempre fortes na razão e na justiça! Ultrajados no seu brio profissional, Sr. Presidente, perseguidos nos seus interesses materiaes, e nos de centenares de familias que vivera das empresas jornalisticas, nada os venceu: nem os decretos de excepção como o de 20 de junho e o de 20 de novembro, nem os processos crimes odiosos como os da sedição, nem as prisões dos liberaes, que exerciam o dever de insurreição para se restaurar neste país o systema representativo!
O que dera a experiencia da lei de 13 de abril, pois como tal a votaram os progressistas, ao repudiarem a sua lei de 7 de julho de 1898, a do Sr. Veiga Beirão?
A resposta está escrita nos artigos brilhantissimos que ficaram, para sempre memoraveis, nas columnas do Correio da Noite, do mês de janeiro. (Apoiados).
A experiencia estava feita, desde que, pouco depois de promulgada a lei de 13 de abril, o Governo, que ainda então o partido progressista apoiava, entrava no caminho que o levaria ao decreto fatal de 31 de janeiro.
Foi no Correio da Noite que se escreveram os mais violentos artigos contra a ditadura e o Rei absoluto. A experiencia teve assim a sua melhor contraprova!
Especializo este facto, Sr. Presidente, porque para a revogação immediata da lei de imprensa, que vim pedir ao Parlamento, reclamo a cooperação do partido progressista, que não tomou esse compromisso, como os regeneradores, quando a lei se votou, porque ainda durava a sua alliança nupcial com o franquismo. O divorcio não se fez esperar! (Apoiados).
Relembrarei, Sr. Presidente, os compromissos partidarios tomados no anno passado, quando a lei foi submettida á sancção real. O illustre presidente da Associação dos Jornalistas, Sr. Consiglieri Pedroso, como delegado de toda a imprensa, pediu aos chefes dos partidos, e áquelles homens públicos que tinham pela sua categoria mais probabilidades de assumir o poder, que se compromettessem á revogação da lei pelos meios constitucionaes, logo que tivesse passado a tempestade do franquismo que então devastava o país.
O saudoso chefe do partido regenerador Sr. Hintze Ribeiro, que na Camara dos Dignos Pares atacara vigorosamente o projecto de lei (Muitos apoiados), não se recusou a tal compromisso, e, com a sua autorização, o illustre Deputado Sr. Conde de Paçô-Vieira, leader regenerador na ultima Camara, fez a declaração de que o partido regenerador promoveria a revogação da lei que se votava, e a sua substituição por outra mais racional e liberal, ouvidas as corporações interessadas.
O Conselheiro José Dias Ferreira e o Sr. Conselheiro José Maria de Alpoim tomaram identico compromisso. E as opiniões do Sr. Julio de Vilhena ficaram expressas nos notaveis discursos que pronunciou na Camara dos Pares, no primeiro dos quaes affirma, com razão, que da comparação entre a lei actual e a de 1850, a chamada lei das rolhas, e que provinha de um Ministerio fortemente conservador, resulta ser essa lei de 1800 muito mais liberal do que a que nasceu de uma ligação hybrida cujos productos apparecem a cada passo, sempre com o mesmo caracter de despostismo intoleravel.
Mas outra autoridade politica, Sr. Presidente, desejo eu