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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
E note o illustre deputado que entre tarifa e disposição de applicação ha uma grande differença; a tarifa é uma taxa que se percebe; a disposição, por exemplo, que determina o direito que têem as mercadorias a permanecer na estação um certo espaço de tempo, é uma condição de applicação.
Asseverou o illustre deputado, que o sr. ministro das obras publicas é que tinha inventado a distincção entre condições de applicação e tarifas.
Esta distincção não a inventou s. ex.ª, existe em toda a parte, onde ha leis sobre caminhos de ferro.
C Sr. Luciano de Castro: — Referi-me á nossa legislação.
O sr. Ministro da Justiça: — Sempre tem havido essa distincção; nunca se disse de outra maneira senão condições de applicação e tarifas.
(Apartes.)
O. Orador: — Quando os illustres deputados tomarem a palavra na questão eu lhes responderei.
Agora digo lhes que sempre se disse assim, porque tarifa e condições de applicação são termos technicos que a cada passo se encontram nas leis que regem o assumpto (Apoiados.)
Disse tambem o illustre deputado interpellante, e este argumento fez uma certa impressão na camara, que não sabia explicar um facto dado a esta portaria.
O facto era este:
A portaria, estabelecendo as condições de applicação, diz que: «As mercadorias transportadas pela grande velocidade têem o direito de permanecer nas estações durante vinte e quatro horas sem pagamento de direitos, e as transportadas pela pequena velocidade têem o direito de permanecer nas estações durante quarenta e oito horas».
Fez notar o illustre deputado, que estas duas condições de que trata a portaria de 18 de junho já estavam annunciadas ao publico desde o dia 31 de maio, e quiz demonstrar com isto que havia uma falsificação na data da portaria.
O illustre deputado imaginou que o estabelecimento de uma condição de applicação dependia de um acto do governo, e não se lembrou de que era preciso para isto o accordo da companhia.
As condições de applicação a que se refere a portaria de 18 de junho, tinham sido previamente accordadas entre o sr. ministro e a companhia dos caminhos de ferro do norte e leste; por consequencia, não admira nada que antes da portaria ter sido publicada já a companhia soubesse quaes as condições de applicação determinadas na mesma portaria. (Apoiados.)
Pois se tinham sido resultado de um accordo entre o sr. ministro e a companhia, não havia a companhia de conhecê-las?! O estabelecimento de uma tarifa e de condições de applicação não é obra exclusiva do ministro, é resultado de uma convenção entre o ministro e a companhia, e quando o ministro publica a sua portaria já a companhia sabe as condições que lhe são impostas, porque já as acceitou (Muitos apoiados.)
Isto é claro e não tem refutação seria. (Apoiados.)
Disse tambem o illustre deputado interpellante, querendo mostrar a illegalidade da concessão feita pelo governo, que o sr. ministro dos obras publicas não tinha seguido o parecer do dignissimo engenheiro fiscal dos caminhos de ferro do norte e leste, que se tinha opposto á elevação das tarifas.
Mas o illustre deputado interpellante não leu de certo o officio do engenheiro fiscal dos caminhos de ferro do norte e leste. Elle não só se não oppõe, mas aconselha ao illustre ministro das obras publicas que se adopte a elevação das tarifas. Fazendo notar que o preço dos salarios, do carvão de pedra e do ferro tende a subir, julga natural que a companhia peça o augmento das tarifas, por isso mesmo que o capital da exploração deve ter augmentado tambem.
E depois de apresentar outras considerações essenciaes, diz que em vista d'estas circumstancias poder-se-ha approvar a nova tarifa de passageiros. Por conseguinte, o engenheiro fiscal não se oppõe tão abertamente, como diz o illustre deputado interpellante, á concessão feita á companhia. (Apoiados.)
Disse tambem o illustre deputado interpellante, que comparando-se a data da proposta feita pela companhia, que é de 3 de março, com a data do officio do director da companhia, de 9 de março, dá em resultado que o officio do ministro, que é de 6 de março, apparece antes do director da companhia ter mandado a sua proposta para o ministerio das obras publicas.
Creio que este facto se explica facilmente por um erro de data, por isso que o officio do ministro dizia ter a data de 16 de março. (Apoiados.)
(Interrupções.)
Sim, senhores, entre o admittir um erro de data e o duvidar da probidade e honradez de um cavalheiro que não tem assento n'esta casa, eu não hesito. (Apoiados.) Os illustres deputados podem faze-lo, eu é que o não faço nem o farei nunca.
Este erro de data não póde prejudicar ninguem, nem tem o menor alcance. (Apoiados.)
Creio que tenho tratado largamente da questão juridica, e passo agora á segunda parte da questão do illustre deputado interpellante, quero dizer, á questão economica.
S. ex.ª começou por comparar as novas tarifas com as antigas, e quiz provar que as novas tarifas eram em todas as suas disposições inteiramente prejudiciaes aos interesses do publico, demonstrando que a companhia só tinha querido locupletar-se á custa os interesses da nação.
Penso que o illustre deputado interpellante não andou de boa fé n'esta comparação.
As disposições da nova tarifa são em alguns pontos mais favoraveis que as disposições da antiga.
O illustre deputado interpellante sabe muito bem que pelas tarifas antigas os excessos de bagagens deviam ser pagos por fracções de 40 kilogrammas, e que pelas novas tarifas esses excessos são pagos por fracções de 10 kilogrammas, o que é de uma grande vantagem para o publico.
O proprio engenheiro fiscal dos caminhos de ferro declara que esta alteração é altamente vantajosa para o publico; e o illustre deputado, que acceita a opinião dos funccionarios que devem ser consultados n'estes assumptos, não sei porque não ha de acceita-la para todos os casos.
Qual a rasão por que a opinião d'esses funccionarios tem importancia e deve ser acolhida para uns certos pontos, e não ha de ter importancia nem deve ser acceite nos outros? (Apoiados.)
Ou têem ou não têem auctoridade n'estes assumptos os funccionarios que a lei chama a dar a sua opinião sobre elles; se têem, o illustre deputado deve reconhecê-la tambem, para confessar que as novas tarifas tem uma grande superioridade sobre as tarifas antigas no ponto a que me refiro, que é um dos pontos capitães. (Apoiados.)
Entendeu tambem o sr. Luciano de Castro, que as novas tarifas são onerosas para o estado, porque, segundo as tarifas antigas, os militares, viajando em corpo ou isoladamente, pagavam a quarta parte da tabella, e, segundo as novas tarifas, pagam metade do preço estabelecido; havendo disposição identica para os transportes do material de guerra.
O illustre deputado pretendia combater o sr. ministro das obras publicas com este argumento, mas s. ex.ª não advertiu que se pagavam menos antigamente e pagam mais agora os militares e o material de guerra, a culpa não é do sr. ministro das obras publicas, mas da lei de 5 de maio de 1860 que aprovou o contrato; esse contrato nos artigos 52.° e 54.° determina exactamente o que se se acha estabelecido na nova tarifa.