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10 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

sas que as anarchicas veleidades ministeriaes introduzem n'aquelle verdadeiro tonel das Danaidas. Assim, é materia corrente, ha bastantes annos, exceder a consignação legal, no caso sujeito, em 34:200$000 réis; e raro é quando os 36 contos de réis orçamentaes não são ainda excedidos.

No anno economico de 1905-1906, a somma consumida, com tão repugnante serviço, foi de 120 contos de réis!... Na gerencia franquista, tambem houve excesso na despesa. Agora ha a registar mais 25 contos de réis, o que produz, pelo menos, a elevada somma de 61 contos de réis para custeio do infecto serviço preventivo em 1907-1908!

É de mais, mesmo no periodo de decadencia accentuada que atravessamos. É de mais, perante o pavor official, que só encontra culto por parte de governos degenerados e de oligarchias, cuja insufficiencia, nos seus praticantes, esteja autenticada. É, por ultimo, de mais, até como estigma e ferrete, para marcar um periodo em que um povo estrebuche na agoniamais dolorosa.

Dispendem-se estas avultadas quantias para remunerar a policia preventiva, ignara e pestilenta, que cultiva impune e preferentemente o atropelo, o vexame e a perseguição dos individuos melhor reputados!...

Entre muitos factos comprovativos d'esta minha asserção, destacarei um, concernente ao prestante cidadão Francisco Grandella, que, ao que parece, não tem direito, politicamente, a pensar como lhe dicta a sua consciencia, sendo alvo de impertinencias e perseguições improprias de um Governo que fosse medianamente orientado. N'estas condições, lembrarei que Aquilino Gomes Ribeiro fugiu da esquadra do Caminho Novo, onde estava detido, na noite de 11 para 12 de janeiro de 1908. Em 16 do mesmo mês, doze agentes da policia preventiva passavam busca á differentes casas, na Foz do Arelho, onde Francisco Grandella tem residencia, e com o unico fim de o vexar. Aquilino Gomes, é claro, não appareceu, e continua fora do alcance policial.

Em 16 de abril de 1908, ás oito horas da manhã, foi dada busca ás dependencias do Theatro da Rua dos Condes, onde está estabelecida a sede da folgazã Associação dos Makavencos; e este vexame praticou-se, sob o imbecil pretexto de ali haver jogo prohibido.

Eu nunca fiz parte d'aquella associação, e a minha idade - com magua o recordo - impede-me de makavencar alegremente, na actualidade.

D'isso tenho pena, insisto, permitta-se-me a expansão. Mas é fora de duvida que a Associação dos Makavencos, a que são completamente estranhas a politica e a politiquice, é composta de cavalheiros conhecidos, cuja respeitabilidade não admitte contestação - convem proclamá lo bem alto.

As duas caracteristicas occorrencias que ficam esboçadas, ha a accrescentar outra, cuja sumula é esta:

No domingo, 3 do corrente, na quinta da residencia de Francisco Grandella, cerca do apeadeiro de S. Domingos de Bemfica, foi encontrado ás oito horas da noite um desconhecido que se tornou suspeito.

Foi entregue á policia pelo caseiro da quinta, que, receando qualquer cilada, passava sequentemente revista á propriedade, encontrando um barril com alcool, que era immediatamente entregue á guarda fiscal. Esta entendeu dever, mesmo de noite, devassar a propriedade, passando lhe busca minuciosa; e, se a prepotencia não chegou tambem a tornar-se effectiva, dentro da fabrica ali installada, foi porque a isso se oppuseram os respectivos operarios.

Do que deixo exposto, resalta a circunstancia vexatoria de que Francisco Grandella, um cidadão honesto, um cavalheiro e um industrial respeitavel, não está isento das malversações officiaes, nem mesmo quando apella para a policia e guarda fiscal, para lhe protegerem a propriedade, limpando a de intrusos, de origem mais que suspeita.

É toleravel que se pratiquem vexa mês d'estes, na quadra que atravessamos, e que se arroga de acalmação e de legalidade?

Mas o que quer a Camara que succeda, quando continua vigorando o infame decreto policial de 19 de setembro de 1902, aggravado pelo não menos execravel decreto de 23 de abril de 1908, em que, a titulo de se proceder á organização de cadastros, se constituiu a suspeição, a delação e a espionagem, em preferente norma governativa?

Bastava este acto do Sr. Presidente do Conselho, com a colaboração immediata do Sr. Ministro da Fazenda, e á cooperação mediata dos outros membros do Gabinete, para este governo passar á posteridade como ultra-reaccionario e perseguidor, violento1 e autocratico. Para engendrar semelhante aborto, foi necessario calcar as garantias mais elementares, constantes da Carta Constitucional, e esquecer os preceitos imprescindiveis do pudor e do decoro, em assumptos de administração. De resto, enxertando-se este decreto, no que tem o n.° 3, e é datado de 24 de dezembro de 1901, eu tenciono provar a seu tempo, o que facil me será, que elle é irrito e nullo, representando um abuso sobre outro abuso. É duplamente abusivo, repito, o que se me afigura demasiado, mesmo para quem cultiva o legalismo e o acalmamento pelo modo original como o faz o actual Governo, isto é, ao invés.

Os excessos, cuja impunidade é proverbial, resultantes da vigencia de tão gafados diplomas, hão de produzir as mais funestas complicações para com os cidadãos honrados, que sejam simultaneamente accommodaveis.

Pela parte que me respeita, faço prompta justiça por meu livre alvedrio, por minhas mãos, quando sou colhido pelos aggravos dimanantes do arbitrio da autoridade. Peço estreitas contas, não aos executores de baixa esfera, mas aos mais qualificados, aos Ministros, que me hão de dar as devidas satisfações officiaes, ou a competente reparação no campo das armas.

Não ha outro caminho a trilhar, que não seja este, da regressão aos tempos primitivos, porque só ella nos pode proporcionar o desforço a que tem jus quem é official e traiçoeiramente vilipendiado.

Nessa conformidade, procedi já, por mais de uma vez, para com administrações transactas. Por este sadio e inflexivel programma me amoldarei sempre que seja preciso e se torne mister. Vem a proposito recordá-lo.

N'isto, como em tudo mais, a acção official está essencialmente pervertida. O Supremo Tribunal de Justiça foi um, dos collaboradores mais accommodaticios da ditadura, e, portanto, um dos factores que mais concorreram para o desfecho sinistro de 1 de fevereiro.

O actual Sr. Ministro da Justiça, cujas ideias reaccionarias são geralmente conhecidas, leu pela mesma cartilha do Supremo Tribunal, interpretando errada e erroneamente os §§ 33.° e 34.° do artigo 145.° da Carta Constitucional, que só nos casos de rebellião, ou invasão de inimigos, dispensa as formalidades constitucionaes temporariamente.

O seu despacho de 12 de dezembro de 1907, como juiz de uma das varas civeis de Lisboa, é, por mais de um titulo, para consignar, tal é o espirito e a letra subservientes que d'elle tresanda. E, todavia, houve magistrados, considerados mui dignamente suspeitos, e tambem um ou outro, altivamente reclamante, contra tão putridos expedientes de interpretação das leis fundamentaes existentes.

Como suspeitos, foram dados os tribunaes de segunda instancia; e, em taes condições, esbulhados da sua jurisdição, em determinadas causas. A par d'isso, o juiz Sr. Abel de Mattos Abreu, de uma das varas commerciaes de Lisboa, protestou ruidosa e adequadamente contra a espoliadora ousadia do Executivo, proferindo, n'essa ordem de ideias, uma serie de sentenças, cuja inicial, de 4 de julho de 1907, é modelar, pela proficiencia e hombridade affirmadas pelo seu autor. Alguns outros magistrados lhe seguiram o exem-