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SESSÃO N.° 10 DE 1 DE FEVEREIRO DE 1892 5

curas variadissimas que são apontadas a dedo por toda a gente.

Ha individuos que fazem parte dos quadros dos empregados do estado, muitos d'elles largamente remunerados, cujo unico trabalho, desde que se alistaram na fileira dos empregados publicos, é visar o recibo da mensalidade; eu conheço alguns que nunca tiveram repartição nem nunca funccionaram debaixo de ponto de vista algum; existem e continuam a existir.

Isto é publico e notorio, isto são sinecuras vexatorias, abusivas, escandalosas mesmo (não tenho duvida em empregar este termo) e é isto que eu peço aos nobres ministros da corôa que façam desapparecer immediatamente, porque n'este ponto sou interprete da maioria dos meus concidadãos.

Mais ainda, sr. presidente, e este assumpto a que me vou referir, embora em terceiro logar, é dos mais importantes.

Eu vejo nos jornaes e ouço fallar ha annos na vida nova, eu mesmo sou dos ingenuos que entendem que é possivel essa vida nova, mas, sr. presidente, para que comece, para que tenha rasão de ser, para que possa merecer tal denominação, é indispensavel que, uma vez por todas, sobretudo aquelles que têem direito a dar exemplo e lição, se convençam de que a devem respeitar porque, infelizmente, as cousas chegaram a este ponto que vou apresentar a v. exa. e á camara.

Quando um individuo tem uma pretensão qualquer do poder central e se dirige a um patrono, se este lhe diz que isso não póde ser porque não é de lei, tem como replica que, "quando se quer, tudo se faz s; e immediatamente apresenta exemplos: "tambem não era de lei que F... fosse nomeado para este ou aquelle cargo e no emtanto foi".

Note v. exa. e a camara que o proprio povo já cita estes factos, toma conta d'elles para seu governo e para se aproveitar quando lhe convem.

Sr. presidente, em 1891 foi apresentada ao parlamento, pelo governo que então presidia aos destinos da nação, uma lei de meios que, apreciada no seu texto, parecia ser um travão (empregando o termo já sanccionado no parlamento) a certa ordem de abusos e desregramentos e sabe v. exa. o que aconteceu? Aconteceu que o governo se esqueceu do que tinha legislado e calcou-a aos pés numas condições a que, emfim, não quero dar publicidade n'esta occasião.

Eu bem sei que isto é mal antigo em Portugal, mas por isso mesmo é que deve haver mais desejos de cortar as raizes a esta arvore nociva.

Em 1858, se a memoria me não falha, sanccionou-se o codigo administrativo, que estatuia que os administradores de concelho tivessem habilitações litterarias; o minimo dessas habilitações era, se me não engano, o curso dos lyceus, e eu lembro-me de como se illudiu esta disposição de lei; lembro-me de se disseminarem pelo paiz administradores substitutos, porque não havia um administrador com as habilitações que a lei exigia para ser effectivo, e que correspondesse ás necessidades politicas da occasião.

Assim se illudiu a lei, e quem a illudiu foram os proprios que a fizeram.

Eu bem sei que isto não é novo; mas por isso mesmo é que julgo absolutamente indispensavel que a chamada "vida nova", se é que começou ou póde começar, arvore bem alto este pendão do respeito constante, perseverante de todas as disposições da lei.

Se a lei não é boa, modifiquem-a; não ha ao nosso paiz difficuldade para modificar as leis. Mas emquanto a lei existe, respeitemol-a; e sobretudo, respeitem-a aquelles que, como eu disse, pela sua posição official têem por dever dar lição e exemplo a todos aquelles que se acham em posições inferiores. Isso é tambem indispensavel fazer-se.

Quando na sessão de 19 de março do anno passado esta camara foi convocada extraordinariamente para sanccionar o celebre emprestimo dos tabacos; quando com o coração oppresso e convicto de que davamos o primeiro passo para a nossa ruina, nós sanccionámos essa disposição de lei, porque se nos affirmou que era absolutamente indispensavel sanccionar-se; quando isto se fez, mal imaginava eu, que decorrido quasi um anno depois d'este sacrificio, que o foi para todos nós, encontrariamos a situação financeira do paiz, não mais desafogada nem melhorada, mas pelo contrario, mais aggravada ainda. Triste desengano, mas é a verdade.

Estavam então no poder uns cavalheiros a quem eu tributava e tributo toda a minha consideração e respeito. Desappareceram esses cavalheiros quando entenderam que tinham preenchido a sua principal e para elles unica missão, a liquidação da pendencia com a Inglaterra.

Foram substituidos por um outro ministerio, em que houve a intenção de reunir o que havia de mais distincto, mais completo e elevado entre os homens politicos portuguezes.

Desappareceu esse segundo ministerio em virtude de rasões hoje publicas e notorias. E infelizmente, decorrido um anno, como ha pouco referi, encontrámo-nos n'uma situação mais attribulada do que aquella em que nos achava-mos. E não obstante isto, eu creio e espero. Eu creio que podemos sair d'esta situação; eu espero que havemos de sair. E espero e creio isto porque hoje não é permittido a ninguem a menor illusão sobre a possibilidade de melhorar-se este estado embora com graves e enormes sacrificios para todos.

Actualmente acham-se á frente dos destinos do paiz cavalheiros que pela sua posição especial, me parece que comprehendem a missão que lhes cumpre desempenhar.

A situação é clara e nitida, sr. presidente, para s. exas. como para os seus collegas que os precederam, como para os que tiverem de lhes succeder. Na actual conjunctura: ou Cesar, ou João Fernandes. Ou os homens que compõem o ministerio procedem de fórma a desempenhar por completo a sua missão, e todos tem direito, rasão e dever de os cobrir de bençãos, ou então continuamos como até aqui, e a nação tem todo o direito de arraigar cada vez mais o seu descontentamento e o seu desanimo.

Eu creio e espero, sr. presidente, não porque admitia nos cavalheiros que compõem o actual ministerio, maior illustração administrativa do que nos cavalheiros que o precederam; não por que acredite que s. exas. se achem animados de maior patriotismo, de maior amor publico do que tinham seus antecessores, n'este ponto tambem não quero fazer confrontos, mas por que me parece, pelo conhecimento que tenho de s. exas., pelas condições em que receberam o poder e pelos actos que já praticaram no curto periodo da sua administração, que hão de corresponder cabalmente ás esperanças e confiança que nelles deposita a nação. Governem s. exas. e governem a valer, governem com a parte sã da nação, e seguindo este caminho, estou certo que hão de ter na tranquillidade da sua consciencia e no reconhecimento publico a compensação para as agruras e para os espinhos que se encontram na estreita, tortuosa e pouco trilhada vereda que ha a seguir para o desempenho de tão elevada missão.

(O orador não reviu.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Dias Ferreira): - Sem idéa de antecipar a discussão de projectos financeiros que o governo já apresentou na camara dos senhores deputados e que estão entregues á commissão de fazenda, não podia ficar comtudo silencioso diante da demonstração de confiança que acabava de manifestar ao governo o digno par e presidente da camara municipal do Porto, o sr. Oliveira Monteiro.